Ações de sustentabilidade corporativa estão sofrendo cortes expressivos em seus orçamentos, afinal as empresas precisam reduzir gastos de todos os lados, certo? Errado! A crise do novo coronavírus (COVID-19) vem colocando em xeque a ideia de que a questão ambiental não é urgente e pode ser deixada para mais tarde. Cada vez mais, rankings que avaliam como as empresas tratam de questões ambientais, sociais e de governança (critérios ESG, na sigla em inglês) estão influenciando grandes investidores sobre em quais empresas devem investir. Logo, se não por consciência frente às gerações futuras, o mundo corporativo terá de abraçar de vez a agenda ambiental pela própria sobrevivência, continuidade e crescimento dos negócios.

Longe de querermos “romantizar” qualquer aspecto da pandemia, o que se observa durante a crise atual é que iniciativas de sustentabilidade e mudança climática, em vez de serem colocadas em segundo plano, ganharam projeção nas estratégias corporativas. Algumas empresas que nem tinham orçamento para sustentabilidade, até pouco tempo, decidiram criá-lo. Outras não tinham orçamento específico para realizar uma determinada tarefa, mas foi priorizada a pedido da alta gestão e de seus conselhos. É o caso, por exemplo, de diversas empresas privadas no Brasil que intensificaram os esforços de compensação de suas emissões de gases de efeito estufa e o uso de energia renovável em suas operações.

“Tudo fica mais transparente em momentos de crise.” A frase foi dita por Carlos Takahashi, CEO no Brasil da BlackRock, maior gestora de investimentos do mundo. Para ele, a pandemia trouxe à tona, para stakeholders e para a sociedade como um todo, fragilidades socioambientais que por uma série de razões vinham sendo negligenciadas antes dessa crise sem precedentes estourar. Com isso, de acordo com o executivo, a preocupação com sustentabilidade tem levado os investidores a reverem seus critérios de precificação e aquisição de ativos.

Dessa forma, estabelecer ou revisar uma estratégia consistente de sustentabilidade, promover a eficiência das práticas ambientais, sociais e de governança, dando transparência a elas, serão fatores cruciais para as empresas no pós-crise, quando passar a fase aguda da pandemia.

A crescente importância dada à sustentabilidade e evidenciada na pandemia não é por acaso. Certamente, aquelas organizações que puderem explicar e comprovar como o enfrentamento de desafios socioambientais se conectam com a gestão do negócio terão maior credibilidade e valorização junto aos investidores. Ou seja, prestar contas quanto ao desempenho da gestão de informações não-financeiras, como o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE B3) e o Dow Jones Sustainability Index (DJSI), terá cada vez mais ligação com a boa performance econômico-financeira das companhias.

Enfrentar com urgência a nova pandemia do coronavírus e adotar medidas imediatas que visem à sustentabilidade significa também nos proteger de ameaças globais futuras. Isso vai requerer ações práticas como o gerenciamento correto de resíduos, a gestão da biodiversidade, o comprometimento com a reconstrução da sociedade, a criação de empregos “verdes” e a intensificação do processo de transição para uma economia neutra em carbono. A humanidade depende de ação agora para um futuro resiliente e sustentável, conforme salientou o PNUMA, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

Alguns pontos fundamentais devem ser observados na jornada corporativa pela sustentabilidade:

  • Engajamento da Liderança: considerando-se a importância crescente dada por investidores no mercado quanto aos critérios ESG e o diferencial atrelado à transparência por meio de relatos como CDP, ISE, DJSI e GRI, é fundamental que os principais executivos da companhia se envolvam e incorporem o tema da sustentabilidade à sua agenda. Isso deve ser um mindset top down, incorporado ao dia a dia de líderes, diretores, gestores e colaboradores em geral. Semana passada, um CEO de uma grande empresa me disse: “O avanço da agenda ESG está sendo impressionante, algo como avançar 10 anos em 90 dias. Agora todos os investidores me pressionam querendo saber o que estamos fazendo quanto à sustentabilidade.”
  • Integração e Responsabilização das Áreas: somente com o contato estreito entre profissionais de diferentes departamentos é possível coletar, metrificar e consolidar os dados relacionados à sustentabilidade da forma mais precisa possível, além de assegurar o comprometimento com melhorias para os ciclos posteriores. É preciso definir metas de sustentabilidade e essas metas devem ser baseadas no que o mundo precisa e não apenas olhando para dentro das organizações. Muitas empresas inclusive estão avançando em Metas de redução de emissão baseadas na Ciência (SBT – Science Based Targets).
  • Eficiência na Gestão ESG (ambiental, social e de governança): ao engajar lideranças, integrar e responsabilizar áreas, identificando lacunas e propondo planos de ação, busca-se tornar mais eficaz não só o processo de resposta aos desafios ambientais, mas a gestão dos temas de sustentabilidade como um todo. E, para isso, o caminho é a integração da gestão ESG nas empresas por meio do uso de tecnologia. Dezenas de grandes empresas no Brasil já estão integrando softwares de gestão de indicadores e relatos de sustentabilidade aos seus já tradicionais sistemas de gestão. Afinal, busca-se aumentar a eficiência para direcionar as ações de maneira coordenada e visando ao maior impacto positivo.

Lidar com a pauta ambiental e de sustentabilidade é algo que definitivamente está deixando de ser só discurso para se incorporar às ações práticas desenvolvidas no âmbito das estratégias corporativas. Não se trata apenas de engajamento ecológico, mas também de pensamento de longo prazo, visando melhorias contínuas, pois novos desafios surgirão. A crise do coronavírus trouxe ainda mais a agenda da sustentabilidade para o centro de mesa de negócios, fazendo com que o mundo empresarial perceba que estamos saindo da era da performance para entrar na era da resiliência, na qual indicadores éticos são tão importantes quanto os econômicos.

Lembrem-se, o Coronavirus é um problema ambiental global. Mas temos outros problemas ambientais globais, até bem mais difíceis de serem resolvidos e com maiores impactos econômicos, sociais e ambientais, como, por exemplo, a mudança do clima. A hora de agir e se preparar para a nova realidade de mercado é agora! Os líderes que não aprenderem essa lição dificilmente terão espaço nessa nova sociedade que se apresenta.

*Por Felipe Bittencourt, sócio-diretor na WayCarbon, empresa brasileira especializada em serviços e produtos focados na transição para a economia de baixa carbono