Antes da rusga diplomática recente com o governo Lula, governo israelense também protagonizou conflitos com a África do Sul, Austrália, França, Espanha, Irlanda e Noruega por causa da sua conduta em Gaza.O Ministério do Exterior de Israel anunciou na segunda-feira (25/08) que estava rebaixando os laços diplomáticos do país com o Brasil, após o governo Lula se recusar a aprovar o enviado do governo de Benjamin Netanyahu para a embaixada israelense em Brasília.

Segundo reportagem do jornal Times of Israel, o pedido de credenciamento do diplomata Gali Dagan “foi inexplicavelmente ignorado” pelo Itamaraty.

Dagan nunca chegou a ser formalmente rejeitado, mas também não recebeu o sinal verde do Itamaraty – o que, na linguagem diplomática, equivale a uma recusa.

Ao fim, Israel acabou anunciando a retirada da indicação e o “rebaixamento” das relações com o Brasil, que passarão a ser conduzidas “em um patamar inferior”.

Isso já ocorre, por exemplo, no caso dos Estados Unidos, que está sem embaixador no Brasil desde o início do ano, por decisão do governo Donald Trump.

Segundo o assessor do Planalto e ex-chanceler Celso Amorim, a ação contra Dagan foi uma resposta ao tratamento dispensado ao embaixador brasileiro Frederico Meyer, convocado no ano passado a se explicar perante autoridades israelenses após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparar a guerra em Gaza ao Holocausto – fala que lhe rendeu o título de “persona non grata”.

A convocação de Meyer foi considerada humilhante pela diplomacia brasileira, que o chamou de volta e manteve o cargo vago desde então.

“Eles humilharam nosso embaixador lá, uma humilhação pública. Depois daquilo, o que eles queriam?”, justificou Amorim.

De lá para cá, a relação bilateral se deteriorou: o Brasil abandonou a Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA) e prometeu juntar-se à África do Sul na ação em que o país acusa Israel de genocídio perante a Corte Internacional de Justiça (CIJ).

“Nós queremos ter uma boa relação com Israel. Mas não podemos aceitar um genocídio, que é o que está acontecendo. É uma barbaridade. Nós não somos contra Israel. Somos contra o que o governo Netanyahu está fazendo”, afirma Amorim.

Não é a primeira vez que a diplomacia israelense se desentende com outros países por causa da guerra na Faixa de Gaza.

O conflito foi deflagrado em 7 de outubro de 2023, após um atentado terrorista liderado pelo grupo palestino Hamas deixar cerca de 1,2 mil mortos em Israel.

O próprio Dagan, que deveria assumir a embaixada israelense no Brasil, deixou em 2024 o posto de embaixador na Colômbia após atritos com o presidente Gustavo Petro, crítico da ofensiva israelense.

Veja, abaixo, outros países que têm relações estremecidas com Israel.

África do Sul

Em maio de 2018, a África do Sul tirou seu embaixador de Israel após um confronto violento com forças de segurança israelenses deixar dezenas de palestinos mortos. Desde então, o posto segue vago, e a embaixada foi fechada em novembro de 2023, semanas após o início da guerra em Gaza.

Em 2017, parlamentares governistas já haviam adotado uma resolução que pedia o rebaixamento da embaixada em protesto contra a política de assentamentos israelenses no território palestino da Cisjordânia.

O país tem uma tradição histórica de simpatia com a causa palestina, já que, no passado, muitos viram o governo israelense como apoiador do apartheid.

Há anos, o governo sul-africano tem comparado as políticas israelenses em Gaza e na Cisjordânia com o antigo regime de segregação do apartheid na África do Sul. Israel rejeita essas alegações.

Austrália e França

Recentemente, Netanyahu acusou a Austrália de “trair Israel” e “abandonar” a comunidade judaica local após o governo de Anthony Albanese barrar a entrada de um político extremista do gabinete israelense.

“A história vai lembrar Albanese pelo que ele é: um político fraco que traiu Israel e abandonou os judeus da Austrália”, disse o premiê israelense.

Em retaliação, Israel revogou os vistos de representantes da Austrália que atuavam junto à Autoridade Palestina.

O ministro australiano da Imigração, Tony Burke, viu na ação israelense uma resposta à movimentação de seu país para reconhecer um Estado palestino durante a 80ª reunião da Assembleia Geral das Nações Unidas, em setembro.

“A força não é medida por quantas pessoas você pode explodir ou deixar famintas”, disse Burke em 20 de agosto.

O governo de Netanyahu está igualmente incomodado com a sinalização da França de que também deve reconhecer um Estado palestino em setembro.

Os líderes de governo de França e Austrália receberam cartas inflamadas de Netanyahu, que os acusa de “jogar gasolina na fogueira antissemita” ao apoiar o pleito dos palestinos, “premiar o terror do Hamas” e atrapalhar os esforços pela soltura dos reféns ainda mantidos em Gaza pelo grupo.

Colômbia e Bolívia

Em maio de 2024, a Colômbia anunciou o rompimento das relações bilaterais com Israel por causa da guerra em Gaza.

O presidente Gustavo Petro acusou Israel de promover um “genocídio” contra o povo palestino, e tem sido desde então um dos mais vocais críticos do governo Netanyahu na América Latina.

Em julho de 2025, o país sediou uma cúpula internacional ao lado de Bolívia, Cuba, Honduras, Senegal, África do Sul, Malásia e Namíbia para coordenar ações concretas contra a ofensiva israelense na Faixa de Gaza.

Já a Bolívia cortou em 2003 relações diplomáticas com Israel por causa da guerra em Gaza, argumentando que Israel estava cometendo crimes contra a humanidade em Gaza.

Espanha, Irlanda e Noruega

Em 2024, a Espanha, a Irlanda e a Noruega reconheceram a Palestina. À época, Israel reagiu convocando de volta seus embaixadores.

No caso da Espanha, o país é um dos membros da União Europeia mais contundentes em suas críticas à ofensiva israelense na Faixa de Gaza, e tem acusado o governo Netanyahu de promover um “genocídio” no território palestino. O país acabou aderindo à ação que a África do Sul move contra Israel no CIJ.

Em maio deste ano, a Espanha pediu a suspensão da venda de armas ao governo israelense, e tem pressionado a União Europeia por medidas retaliatórias mais duras contra Tel Aviv.

Já a Irlanda, que aderiu em dezembro de 2024 à ação por genocídio na CIJ, foi retaliada com o fechamento permanente da embaixada em Dublin.

A decisão foi criticada à época pelo diplomata israelense Jeremy Issacharoff, que serviu como embaixador em Berlim de 2017 a 2022. “Eu teria encontrado um equilíbrio entre sinalizar a nossa insatisfação e manter o diálogo”, disse ele à DW. “Há uma comunidade judaica na Irlanda, há israelenses que vivem ali e trabalham no setor de alta tecnologia, há comércio entre os dois países, a Irlanda também é membro da UE”, citou.

ra (ots)