Se a Ambev, quarta maior cervejaria do mundo, queria um verão agitado, ela terá. A companhia, dona de um faturamento superior a R$ 16 bilhões, está mergulhada em uma disputa pesada com os distribuidores da marca Antarctica que, em breve, poderá chegar aos tribunais. Nos últimos meses, o confronto gerou os elementos típicos dessa situação: boletins de ocorrência, ações judiciais, inquéritos civis e até audiência pública no Senado. O mais recente lance ocorreu na semana passada, quando quatro senadores enviaram um requerimento ao ministro da Fazenda, Pedro Malan, solicitando a abertura de processo na Secretaria de Acompanhamento Econômico para ?investigar as práticas concorrenciais desenvolvidas pela Companhia de Bebidas das Américas?.

A briga teve início, pois os distribuidores alegam que ?vêm sendo massacrados por condutas espúrias e de infração da ordem econômica? por parte da Ambev, segundo Cláudio Athayde Bringhs Bueno, presidente da Associação Regional das Distribuidoras Antarctica ? Região XII, que representa 38 revendas Antarctica do interior de São Paulo e sul de Minas. Eles acusam a Ambev de passar por cima de compromissos assumidos por ocasião do processo de fusão da Brahma e da Antarctica: independência das três redes de distribuição (as duas mais a da Skol), tratamento igualitário e não imposição de preços e formas de pagamento ?draconianas?, como diz Ricardo Sayeg, advogado dos distribuidores. Em resumo: a gigante do setor de bebidas é acusada de abuso do poder econômico. Procurado por Sayeg, o procurador da República Osvaldo Capelari Júnior abriu inquérito civil para apurar a ?infração à ordem econômica? da Ambev. Um dos depoimentos foi dado por Edson Rando, dono da Reberan, de Americana, SP. Segundo ele, a Ambev o impede de praticar ?livremente o preço de revenda? e ?o ameaça de penalização caso este não seja observado?. Mais: a empresa, diz, o trata de forma discriminatória.

A origem desta última queixa está na política da Ambev de permitir que diversos distribuidores entreguem produtos de mais de uma marca. ?Isso só acontece na atividade de entrega. As revendas têm equipes de venda distintas para cada marca, que competem entre si?, diz Carla Coelho, gerente de comunicação da empresa. Os representantes da Antarctica alegam que eles levaram desvantagem no troca-troca de produtos. Os caminhões da Skol e da Brahma podem entregar o guaraná Antarctica. Já os entregadores Antarctica podem vender Sukita, chá gelado Lipton e o isotônico Marathon. ?Essas marcas não valem 10% do guaraná Antarctica?, diz Willis Rolim Filho, dono da Soangra. ?Não podemos vender as cervejas Skol e Brahma, campeãs de vendas.?

Dinheiro vivo. Há divergências também quanto à forma de pagamento. Por conta disso, Renato Artero, da Distribuidora Gaivota, de Caraguatatuba, SP, foi parar na delegacia. Segundo ele, na terça-feira, 11, a Ambev impediu que seu caminhão saísse da fábrica de Jaguariúna, SP. A empresa não aceitou o pagamento da carga feito momentos antes via DOC, meio utilizado há anos para esse fim. ?Eles só liberariam o carregamento se o depósito fosse feito com dinheiro vivo?, conta ele. ?O contrato reza pagamento à vista na hora da retirada da mercadoria e não antes disso,como a Ambev exigia com o DOC e, agora, com depósito em dinheiro vivo.? A empresa admite que realmente mudou a forma de cobrança, pois, segundo sua assessoria de imprensa, ?alguns revendedores cancelavam o DOC depois de retirar as bebidas?. A empresa informa que é possível pagar no dia seguinte à retirada. ?Para isso, eles exigem a assinatura de nota promissória em branco?, diz Artero.Seu caminhão foi liberado sem a carga. Mas o assunto parece distante de uma solução. Mesmo porque o requerimento dos senadores afirma que ?os representantes da empresa e dos órgãos federais da Defesa da Concorrência foram incapazes de responder às denúncias dos distribuidores.?