04/04/2022 - 8:00
Sim é a resposta para a pergunta do título. A questão é que muitas lideranças à frente de companhias dos mais diferentes segmentos de atuação e tamanhos (de receitas, mercado potencial, funcionários…) não conseguem espaço na própria agenda e nas estratégias para transformar um pedaço de suas operações em companhias de Serviços. Sabe o mantra de que toda empresa se tornou uma empesa de tecnologia? Ele mudou. O mantra agora é outro: toda empresa deve ser uma empresa de Serviços.
O melhor exemplo veio da Apple – mesmo a companhia tendo no portfólio produtos icônicos, admirados, desejados e vendedores. Nos três últimos anos fiscais da empresa (2019, 2020, 2021, sempre encerrados em setembro), a margem bruta de Serviços foi respectivamente de US$ 29,5 bilhões, US$ 35,5 bilhões e US$ 47,7 bilhões. Mais que o salto de 62%, a Apple festeja o fato de que a margem bruta porcentual nessa vertical ser muito superior à margem bruta porcentual na linha Produtos. Com a receita vinda de iPhones, Macs, iPads, wearables, a companhia fez margens brutas entre 31,5% e 35,3% no último triênio. Já com o dinheiro vindo de soluções em nuvem, Apple Store e outros, as margens mais que dobram e variaram entre 63,7% e 69,7%. Como todo empresário sabe, melhorar a margem é a estrada para um caixa saudável.
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Pode ser, é fato, que a vertical Serviços nunca ultrapasse as receitas de criações tão marcantes como os objetos de desejo da Apple. Do total de dinheiro que entrou globalmente na companhia no ano fiscal de 2021 (US$ 365,8 bilhões), Serviços responderam por menos de 20% (US$ 68,4 bilhões). Ainda assim, se o time comandado por Tim Cook não estivesse atento a esse fluxo de grana que é recorrente, acima de tudo, a empresa jamais teria valor de mercado na casa dos US$ 2,8 trilhões atuais.
E aí vem o segundo braço desse mundo lastreado em Serviços. Os apps. Aplicativos baixados em lojas como Apple Store e Google Play. De acordo com o serviço de inteligência e análises Business of Apps, as receitas globais apenas das duas maiores lojas somaram US$ 133 bilhões em 2021, alta de 19,8% sobre o volume de 2020. Nos cinco anos cheios entre 2016 e 2020 elas avançaram no mínimo 22% por temporada. Mesmo com o market share global de usuários que utilizam sistema operacional iOS ser de 15% – os demais 85% têm sistema Android –, a receita com aplicativos na Apple Store é de 64% do total (US$ 85 bilhões). A explicação seria porque usuários de iPhones costumam ser majoritários em mercados mais fortes e gastadores, como Estados Unidos e Japão.
Do total de US$ 133 bilhões arrecadados nas duas grandes lojas de apps, dinheiro que chega por meio de aplicativos pagos, assinaturas e publicidade, por exemplo, 67% (US$ 89 bilhões) vieram de games. E aqui a Apple manda e nada forte à frente. Os números não são abertos, mas estima-se que em 2019 a companhia tenha lucrado US$ 8,5 bilhões apenas com o segmento de jogos. É mais que a soma (US$ 6,5 bilhões) de Microsoft, Nintendo, Sony (PlayStation) e Activision Blizzard (comprada em janeiro pela Microsoft por 68,7 US$ bilhões), tradicionais players do mundo gamer. Dados tirados de documentos legais e divulgados pelo site Visual Capitalist indicam que em 2020 do total de receita da Apple Store dois terços foram de games. A Apple, vale lembrar, não produz um só jogo ou console.
Sem dúvida não é toda empresa que vai atuar com apps, ou particularmente no universo gamer. Mas o mundo dos jogos é, por definição, o mundo do conteúdo (dentro de aplicativos ou não). Mais que isso, um mercado cujo público é transversal a dados demográficos. A imagem do jovem trancado por horas num quarto escuro e fones de ouvido, uma fotografia preconceituosa, aliás, é apenas uma parte desse público. Hoje, jogos como os de palavras-cruzadas ou desafios mentais são fenômenos globais – The New York Times comprou no fim de janeiro o game de sucesso Wordle (jogo de palavras), para alavancar sua base de assinantes. O que a Apple e outras organizações ensinam é que qualquer companhia pode ser proprietária de uma linha de Serviços, vinculada a seu universo de público e portfólio, que se transforme numa nova vertical de sucesso. Em resumo, toda empresa é uma empresa de Serviços. Esse é o mantra.