Mais de 200 militares na Bolívia foram feitos reféns após três quartéis serem invadidos. Em greve de fome, ex-presidente propõe dialogar com o governo. Atual mandatário, Luis Arce, acusa “crime de traição à pátria”.Apoiadores do ex-presidente da Bolívia Evo Morales fizeram mais de 200 soldados reféns neste sábado (03/11) após invadirem quartéis das Forças Armadas, em meio à onda de distúrbios iniciada há três semanas após a abertura um inquérito contra o ex-líder.

O Ministério das Relações Exteriores da Bolívia afirmou em nota que, na sexta-feira, “três unidades militares foram atacadas por grupos irregulares na região de Chapare, tomando como reféns mais de duzentos efetivos militares” e acusou os invasores de roubar armas e munições. A pasta não identificou os grupos e tampouco explicou como os soldados foram feitos reféns.

O governo enviou as Forças Armadas para a região para apoiar a polícia local a remover bloqueios nas estradas colocados pelos apoiadores de Morales.

O presidente boliviano, Luis Arce, caracterizou a tomada dos três quartéis em uma área de cultivo de coca no centro da Bolívia como “um ato criminoso absolutamente repreensível que está longe de qualquer reivindicação social legítima do movimento camponês indígena.”

Arce, que foi ministro da Economia no governo de Morales (2006-2019), disse que a tomada de uma instalação militar “em qualquer lugar do mundo é um crime de traição à pátria.”

Acusação da abuso sexual

O conflito começou há três semanas quando promotores bolivianos iniciaram uma investigação sobre acusações de que Morales teria sido pai de uma criança com uma jovem de 15 anos em 2015, classificando seu relacionamento como um estupro estatutário. Morales se recusou a testemunhar no tribunal.

O ex-presidente está foragido na área rural de Chapare, na região de Cochabamba, no centro do país, desde que surgiram relatos sobre um possível mandado de prisão contra ele.

Produtores de coca leais a Morales agiram para impedir sua prisão. Seus apoiadores ameaçaram tomar quartéis policiais e militares, exigindo o encerramento dos processos judiciais contra o ex-presidente.

Os seguidores de Moraes afirmam que as ações judiciais são parte de uma “perseguição judicial e política” do governo de Arce contra o líder indígena.

Greve de fome

Como forma de aumentar a pressão sobre o governo, Morales iniciou nesta sexta-feira uma greve de fome, que pretende manter até que sejam liberados todos os seus apoiadores detidos pela polícia nos últimos dias.

Somente nesta sexta, 66 pessoas foram presas, se somando a dezenas de outras que estão detidas desde o inicio dos protestos, em 14 de outubro. Há poucos dias, Morales disse ter sido alvo de um atentado a tiros.

Na semana passada, 30 policiais ficaram feridos e mais de 50 manifestantes foram presos após um confronto entre forças de segurança e apoiadores de Morales.

Ao dar início à greve de fome, Morales propôs dialogar com o governo nas mesas de negociações sobre temas econômicos e políticos. A ministra da Presidência da Bolívia, María Nela Prada, afirmou em nota neste sábado que a Procuradoria-Geral do país acenou com a possibilidade de um diálogo, mas apenas para tratar de “temas que se atenham ao Executivo, e não a outros órgãos de Estado”.

Prada disse que em outras tentativas de diálogo, Morales condicionou sua participação ao tema de sua candidatura às eleições presidenciais de 2025. Em dezembro do ano passado, a Justiça boliviana decidiu que ele não poderia se candidatar por já ter sido reeleito uma vez, como previsto na Constituição.

Disputa pelo controle do partido

O Ministério das Relações Exteriores afirmou que o governo está aberto ao diálogo com “todos os setores sociais do país”, mas alertou que esse processo “não pode ser estabelecido enquanto o povo boliviano continuar sendo vítima de abusos por esses grupos que não estão interessados na economia nacional e popular, e que buscam apenas materializar os interesses pessoais e eleitorais de um ex-presidente.”

Arce e Morales disputam o controle do partido governista, o Movimento ao Socialismo (MAS), que continua dividido entre seus apoiadores antes das eleições de 2025.

rc (AFP, AP)