12/05/2020 - 11:35
A Alemanha preparou todo seu arsenal para apoiar seus pesos pesados industriais na crise do coronavírus, mas a insatisfação com a principal economia europeia está crescendo entre seus parceiros da União Europeia, que temem distorções da concorrência no bloco.
“No momento, metade do auxílio estatal concedido às empresas foi concedido pela Alemanha. Quem pode dar, está dando”, afirmou o chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, em um recente encontro com jornalistas, incluindo os da AFP.
Para o ex-chanceler espanhol, se um país pode dar mais do que outro, isso distorce a concorrência.
“No mercado único, afetará bastante a maneira como os auxílios estatais serão concedidos” e “a entrada no capital das empresas”, afirmou.
Embora seja improvável que a Alemanha subsidie suas empresas, diferentemente de outros países como a França, o relaxamento das regras europeias sobre auxílios estatais, durante a atual crise oferece uma vantagem.
Dos quase 1,9 trilhão de euros em auxílios estatais validados pela Comissão Europeia, 52% foram adotados pela Alemanha, seguida de longe pela França (17%) e pela Itália (14%). A ajuda adotada pela Espanha seria inferior a 2% do total dos 27 países da UE.
Se a Alemanha injeta 100 bilhões de euros em suas empresas, e a França, apenas 20 bilhões, “existe o risco de criar divergências no mercado interno”, alertou o comissário da Indústria, o francês Thierry Breton, ao jornal “Handelsblatt”.
“Queremos que a estrutura seja aplicada de maneira uniforme, ou seja, para garantir condições equitativas no mercado interno quando [a Comissão Europeia] autorizar operações”, disse uma fonte francesa à AFP.
Uma autoridade do governo espanhol foi além. Na sua opinião, a Alemanha “tem bolsos profundos” para financiar suas empresas com grandes necessidades, por isso apela à “solidariedade” de Berlim com seus parceiros, como a Espanha, com menos liquidez.
– Locomotiva –
Questionada na semana passada por um eurodeputado italiano sobre os gastos da Alemanha, a vice-presidente da Comissão responsável pela Política de Concorrência, a dinamarquesa Margrethe Vestager, defendeu o governo de Angela Merkel.
“É importante que a Alemanha faça isso, porque, de alguma forma, funcionará como uma locomotiva para a Europa”, disse Vestager, defendendo “a busca de soluções” para a situação “triste de que nem todos têm a mesma margem de manobra”.
O Executivo da comunidade adotou na sexta-feira condições estritas para os Estados que desejam recapitalizar suas empresas, como a proibição de pagar dividendos, ou bônus, a seus diretores.
Bruxelas também não permitirá que as empresas adquiram mais de 10% das ações de seus concorrentes, fornecedores, ou clientes, enquanto o Estado detiver pelo menos 75% das ações adquiridas em resposta à crise do coronavírus.
“O objetivo é que essa recapitalização seja a solução de último recurso”, disse Eric Paroche, advogado especializado em casos de concorrência no gabinete Hogan Lovells.
Qualquer crise pode ser uma vantagem para as empresas mais resistentes, pois elas podem comprar suas rivais a baixo custo, levando a uma reorganização do tabuleiro.
“Mas, com esta cláusula, a empresa recapitalizada é impedida de desempenhar um papel na consolidação”, acrescenta Paroche.
Essas novas regras surgem quando o primeiro grupo de transporte aéreo da Europa, a alemã Lufthansa, negocia com Berlim uma nacionalização parcial e ajuda de 9 bilhões de euros para evitar a falência.
Na mesa do governo alemão, há também a recapitalização de vários bilhões de euros do grupo ferroviário alemão Deutsche Bahn.