Após forte instabilidade e troca de sinais pela manhã, o dólar à vista se firmou em terreno negativo ao longo da tarde, em sintonia com o sinal predominante de baixa da moeda americana no exterior, e fechou em queda de 0,45%, a R$ 5,7092. Apesar do refresco hoje, a divisa encerra a semana com valorização de 0,91% no mercado doméstico.

A formação da taxa de câmbio esteve hoje atrelada a um realinhamento global de preços de ativos deflagrado pelo aumento da possibilidade de recessão nos EUA, após relatório de emprego (payroll) de julho, divulgado no início da manhã, revelar geração de vagas bem abaixo do esperado e avanço da taxa de desemprego.

Em um primeiro momento, o aumento da aversão ao risco no exterior provocou depreciação aguda do real. O novo rali do iene, tradicional refúgio de investidores, detonou um desmonte de operações de carry trade com a moeda brasileira. Foi quando o dólar atingiu máxima a R$ 5,7936, maior valor intradia desde 30 de março de 2021.

Já no fim da manhã, a moeda americana diminuía os ganhos por aqui e operava ao redor da estabilidade, com uma realização parcial de lucros típica após movimentos bruscos. Além disso, o dólar também se firmou em baixa na comparação com a maioria das divisas emergentes e de exportadores de commodities, embora se tenha se mantido em alta de mais de 1% em relação aos pesos mexicano e colombiano.

Operadores ressaltam que a moeda brasileira foi muito mais castigada nas últimas semanas, com perdas bem maiores que seus pares latino-americanos, em razão do rali do iene e do aumento da aversão ao risco. Era natural que em algum momento houvesse uma recuperação, com investidores partindo para desmonte posições em outras moedas de países de juros altos.

O gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, afirma que a valorização do iene nos últimos dias levou a um amplo desmonte de operações de carry trade com moedas latinas e o mercado ainda tenta buscar um reequilíbrio técnico, o que deixa a formação da taxa de câmbio bem mais volátil.

“O dólar foi muito pressionado na abertura dos negócios com o mau humor externo. Era busca por proteção com esse risco de recessão dos EUA e a questão geopolítica. Mas depois o mercado buscou uma acomodação, com uma realização de lucros”, afirma Galhardo, ressaltando que, a despeito da baixa hoje, a taxa de câmbio se encontra em um nível elevado. “E vejo o real ainda pressionado. A aversão ao risco no exterior é grande e ainda temos os problemas fiscais domésticos. O dólar sobe na semana em uma alta que parece mais estrutural, e não especulativa.”

Termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY caiu mais de 1%, para a casa dos 103,300 pontos, com perdas de cerca de 1,80% do dólar em relação ao iene. As taxas dos Treasuries recuaram em bloco, em especial a taxa da T-note de 2 anos, mais ligada às apostas para os próximos passos do Federal Reserve. O retorno do papei recuou mais de 6%, rompeu o piso de 4% e operava na casa de 3,88 no fim do dia.

Monitoramento do CME Group mostra que o quadro mais provável para a redução total dos juros pelo Fed neste ano passou de 75 pontos-base ontem para 125 pontos-base hoje. As chances de um corte de 50 pontos-base no encontro de política monetária do Fed em setembro passaram a ser majoritárias, com mais de 70%.

O economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira, observa que o resultado de hoje do payroll ganhou ainda mais relevância após dados fracos do setor industrial divulgados ontem, o que indica que a desaceleração da atividade nos EUA se acentuou no início do segundo semestre. “Os preços dos ativos reagem aos dados sugerindo risco de recessão. O impacto no Brasil e em outros emergentes é de aumento do risco país”, diz Oliveira, ressaltando que o real, apesar da recuperação hoje, apresenta depreciação na semana.

Para o economista André Perfeito, a perspectiva de juros mais baixo nos EUA levou a um forte movimento de compra de títulos públicos americanos, o que faz o preço dos papéis subirem e, por tabela, a taxas caírem de forma abrupta. Ele julga tal processo “exagerado”, com provável “stop loss” de posições de investidores que “não acreditavam em cortes de juros em setembro”.

“Uma vez ajustada as novas expectativas, o jogo volta a ser a taxa de juros e seu diferencial entre as demais moedas. Se esta hipótese se confirmar devemos ver um enfraquecimento do dólar”, afirma Perfeito.