Especialistas apontam que a nova lei do Imposto de Renda (IR), sancionada nesta quarta-feira, 26, trará impactos relevantes para o setor privado. Para além do fim da isenção dos dividendos a partir do próximo ano, que já tem movimentado tomadas de decisões, o texto impõe um prazo para deliberação dos lucros que não é compatível com a realidade contábil das empresas.

A lei que zera o Imposto de Renda às pessoas que ganham até R$ 5 mil e beneficia quem recebe até R$ 7.350, sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta terça, retoma a tributação de dividendos após 30 anos de isenção. O texto estabelece que a partir de janeiro de 2026 o pagamento, entrega ou creditamento de lucros e dividendos de uma pessoa jurídica à pessoa física superior a R$ 50 mil estará sujeito a uma retenção de 10% de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF).

Como foi confirmado pelo secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, a lei foi sancionada na íntegra por Lula, seguindo o que foi aprovado pela Câmara e pelo Senado.

O projeto garante a isenção de Imposto de Renda sobre os lucros e dividendos apurados em 2025, mas apenas se a distribuição tenha sido aprovada até 31 de dezembro – o que preocupa as empresas, uma vez que os lucros apenas são de fato reconhecidos após a virada do ano. A lei diz que o pagamento desses dividendos deve ocorrer entre 2026 e 2028.

Impactos da tributação

Logo após aprovado pelo Congresso Nacional, o texto já começou a fazer com que as empresas corressem contra o tempo para deliberar e pagar os dividendos, aproveitando a isenção antes do fim do ano. O impacto disso, segundo especialistas, é a reestruturação de capital das empresas para ter caixa e efetuar o pagamento.

“Embora muitas empresas já tenham iniciado as discussões sobre a deliberação de dividendos, com a aprovação da Lei esse movimento se intensificará, levando as empresas a discutirem com seus acionistas eventual política de remuneração dos sócios”, afirma Carlos Eduardo Orsolon, sócio do Demarest Advogados.

Para Mauricio Braga Chapinoti, sócio de Gasparini Barbosa e Freire Advogados, “as empresas terão que reestruturar seu capital, provavelmente migrando para instrumentos de dívida, para reduzir o impacto e atrair capital”.

Para os especialistas, a nova regra pode incentivar um endividamento das empresas, uma vez que a tributação sobre os juros poderá ser inferior em relação aos dividendos. Diante disso, segundo fontes ouvidas pela reportagem, bancos já estão propondo empréstimos para as empresas aumentarem o caixa e conseguirem aproveitar ainda mais os últimos dias da isenção.

Prazo para a deliberação gera preocupação

A pressa para o pagamento decorre da previsão de isenção apenas se a distribuição for aprovada até 31 de dezembro de 2025. No entanto, o trecho é um dos principais pontos vistos com preocupação pelos tributaristas, uma vez que muitas empresas acabam fechando sua contabilidade no ano seguinte à apuração dos lucros, fazendo com que o valor total só seja definitivamente conhecido depois da virada do ano.

Os tributaristas avaliam que as empresas podem, em dezembro, arriscar na deliberação de seus lucros acumulados até então. O valor, no entanto, pode acabar se mostrando maior após o balanço contábil no ano seguinte.

Para Carlos Henrique de Oliveira, ex-presidente do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e sócio do Mannrich Vasconcelos Advogados, “é uma preocupação”. Segundo ele, se não houvesse a necessidade de determinar a deliberação dos lucros apurados em 2025 até o último dia do mesmo ano, as empresas teriam o prazo legal até abril de 2026 para apurá-los. Isso geraria maior segurança sobre os valores realmente apurados.

Incompatibilidade

Outro impacto apontado por especialistas é a parte do texto que determina que após deliberados dentro do prazo, o pagamento desses dividendos deve ocorrer entre 2026 e 2028. Isso porque o trecho entra em conflito com o que diz a Lei das Sociedades Anônimas, que obriga a S.A a pagar os dividendos no mesmo exercício em que foram declarados.