“Hoje, estamos reinventando o telefone.” Foram com essas palavras que Steve Jobs (1955-2011), cofundador da Apple, iniciou o seu discurso de apresentação do primeiro iPhone, durante a Macworld, tradicional evento da companhia para anunciar suas novidades, no Moscone Center, em São Francisco, em janeiro de 2007. Cincos meses depois, em 29 de junho do mesmo ano, o iPhone chegou às lojas, com um gigantesco frenesi dos consumidores, que fizeram filas gigantescas em frente as lojas da Apple, nos Estados Unidos, para comprar o aparelho.

A profecia de Jobs realmente se realizou. O iPhone mudou o telefone. Fez, na verdade, muito mais do que isso. O smartphone da Apple provocou abalos sísmicos no mundo da telefonia. A finlandesa Nokia, líder mundial do mercado de celulares, foi varrida do mapa. A canadense Research In Motion (RIM), que produzia o Blackberry, também perdeu relevância. Em comum, ambas não conseguiram se adaptar às telas sensíveis aos toques, a grande inovação do iPhone. Além disso, a Apple integrou seu produto a uma loja de aplicativos, reforçando um modelo que já tinha dado muito certo com seu tocador digital de música, o iPod. É uma história de retumbante sucesso que mudou também a Apple. Hoje, o iPhone representa aproximadamente dois terços de sua receita de US$ 215 bilhões em seu exercício fiscal de 2016.

Dez anos depois de seu lançamento, no entanto, o iPhone já dá evidentes sinais de que parou no tempo. As suas vendas, por exemplo, tiveram a primeira queda desde o seu lançamento no exercício fiscal de 2016, que terminou em outubro. Na ocasião, foram vendidos 211,9 milhões de aparelhos, um recuo de 8,3%. “A Apple se tornou apenas mais um competidor e precisa pensar em coisas novas se quiser voltar a ser a protagonista”, diz Ivair Rodrigues, diretor de pesquisas da consultoria paulistana IT Data.

Falar que a Apple e o iPhone não estão bem exige uma enorme relativização. A empresa da maçã ainda é a maior do mundo em valor de mercado, com incríveis US$ 750 bilhões. O lucro líquido, apesar da queda de 8,5%, chegou a US$ 45,7 bilhões. Ela tem ainda US$ 250 bilhões em caixa. Suas ações, neste ano, estão subindo 23,5%. Em smartphones, a Apple está atrás apenas da Samsung. No primeiro trimestre deste ano, as vendas do iPhone perderam quase um ponto percentual, atingindo uma fatia de 13,7%. A fabricante coreana do rival Galaxy lidera com 20,7%.

O que pesa contra a Apple é o fato de que a companhia está deixando de lado um dos traços característicos de seu DNA: a inovação. O seu popular smartphone já não traz nenhuma novidade, geração após geração, há algum tempo. “Até 2013, o iPhone sempre trouxe algo sempre inovador. E então parou”, afirma Leonardo Munin, analista de mercado de celular da América Latina da IDC. “A partir desse ponto, as novidades do mercado não passaram a ser tanto em hardware, mas em software e na experiência do usuário com o celular.” Recentemente, o vice-presidente executivo da americana fabricante de chips Qualcomm, Don Rosenberg, declarou que “a Apple raramente é a primeira a introduzir novas tecnologias no mercado”.

É fácil de lembrar alguns exemplos. A proteção contra água, que só chegou ao iPhone no ano passado, já estava sendo usada de forma eficiente em telefones considerados topo de linha desde 2013, com o Xperia Z, da Sony. As baterias e telas dos principais rivais melhoraram de forma substancial ao longo dos anos, aumentando sua capacidade e substituindo materiais antigos por componentes mais modernos. A câmera frontal, que parecia tão inovadora no iPhone 4, lançado em 2010, já havia sido usada em celulares ainda em 2003, com os jurássicos Sony Ericsson Z1010 e Motorola A835. Até mesmo seu sistema operacional, o iOS, foi copiado pelo Android, do Google, com tremendo sucesso. Tanto que a plataforma do robô verde está instalada em oito de cada dez smartphones vendidos no mundo.

A esperança da Apple de mudar esse cenário reside na próxima geração do iPhone, que será lançada neste ano. Espera-se que ele melhore os recursos de inteligência artificial, como a assistente virtual Siri. “Os usuários do futuro vão querer interagir com seus produtos da forma mais natural possível e as assistentes pessoais precisam ser inteligentes para isso”, afirma Tuong Nguyen, analista da empresa de pesquisa americana Gartner. Mas não é só em smartphones que a Apple patina. Seus rivais avançam em áreas como inteligência artificial e carros autônomos. A empresa, sob o comando de Tim Cook, pouco inova ainda nesses setores. Há dez anos, Apple reinventou o celular. Hoje, ela precisa se reinventar para que os próximos dez anos sejam tão brilhantes quanto os últimos dez .