18/06/2003 - 7:00
Demorou, mas a novela da
Arapuã chegou ao fim. O último capítulo de uma das concordatas mais polêmicas da história do varejo brasileiro foi escrito na quarta-feira 11, quando o Tribunal de Justiça de São Paulo autorizou, por unanimidade, o início do plano de reestruturação da rede, que prevê a troca da dívida por debêntures de longo prazo. A decisão coloca um ponto final numa discussão que vem se arrastando há cinco anos, desde que a Evadin entrou com um pedido de falência contra a Arapuã. A Evadin, de Leo Cryss, é uma das principais credoras da rede de varejo e foi a única da massa falida que não aderiu ao acordo para tirar a corda do pescoço dos Simeira Jacob, donos da Arapuã. Os débitos da Evadin correspondem a 10% do total da dívida, que hoje está em torno de R$ 1 bilhão. Os demais credores (86 ao todo), liderados pelo empresário Isaac Isvern ? amigo pessoal de Jorge Simeira Jacob e dono da CCE ? , permaneceram firmes na tentativa de recuperação.
A vitória da Arapuã contraria a Lei de Falência em vigor. De acordo com ela, bastaria apenas um credor para decretar a falência de uma empresa. O Tribunal, portanto, entendeu que era preciso preservar os empregos e permitir que a companhia colocasse em prática o plano que havia sido apresentado aos credores ainda em 1999 e que inclui a criação de uma subsidiária, a Arapuã 2.
A decisão da Justiça devolve à rede a chance de voltar a respirar. O problema é que o mundo que a Arapuã vai encontrar aqui fora está completamente hostil. O período de reclusão impediu que a empresa pudesse inovar. ?Eles vão ter de se reciclar porque o varejo está muito mudado e a Arapuã parou nos anos 80, quando bastava ter tino comercial e boa logística para ter sucesso?, explica Ulísses Reis, professor de varejo da Fundação Getúlio Vargas.
Mais enxuta. A rede de varejo viu seu império desmoronar. O faturamento, que em 1997 era de R$ 1,6 bilhão, caiu para R$ 300 milhões. A empresa foi obrigada a cortar mais de 3 mil funcionários e a fechar mais de 150 lojas nesses anos. ?Nos últimos cinco anos aprendemos a viver de nossas próprias margens. A gente soube se adaptar e hoje temos uma estrutura muito leve?, afirma Fábio Marcondes, diretor-financeiro da Arapuã. ?Ganhamos uma batalha, mas a guerra só termina com a dívida paga. O importante é que voltamos a competir de igual para igual com nossos concorrentes.?
O desafio é enorme. Na avaliação de Reis, sobrevive hoje nesse setor quem oferece preço baixo, crédito facilitado ou um conceito moderno de lojas. Os executivos estão conscientes disso. ?Nosso perfil é popular e por isso as lojas modernas estão descartadas. A experiência também nos mostrou que oferecer crédito não dá certo?, avalia Marcondes. Sem uma coisa nem outra, a Arapuã quer ser conhecida agora como uma rede forte na linha de móveis, sobretudo no Nordeste. A justificativa é que não existe nenhum peso pesado naquela região. ?Descobrimos que a nossa marca tem uma boa penetração no Nordeste, mesmo com a concordata.? Os consultores consideram a experiência arriscada. Afinal misturar móveis e eletroeletrônicos não funcionou em empresas como Mappin, Mesbla e Lojas Americanas.
A opção de investir na linha de móveis também tem se mostrado viável para a rede. O segmento, depois de seguidos aumentos nas vendas, representa hoje 35% da receita do grupo. O objetivo é que ele tenha um peso de 50%. Os consultores concordam que a margem de lucro seja atraente, mas não significa que este seja um caminho seguro. ?É uma opção interessante, mas é preciso entender que eles nunca foram fortes em móveis. A Casas Bahia só lucra tanto porque optou pela fabricação própria. A Arapuã não tem condições de fazer isso agora?, argumenta Nicolau Cury, consultor de varejo.
O fardo é pesado e ninguém duvida disso. A missão de carregá-lo foi dada há cinco anos ao filho do fundador da rede, Renato Simeira Jacob. Aos 41 anos, é conhecido por ser menos intuitivo e mais estrategista que o pai, Jorge Jacob. As mudanças que ele vai
fazer daqui para frente virão devagar, até porque é preciso muito capital para isso. E dinheiro, segundo o próprio diretor-financeiro, a família não tem mesmo. Mas eles se gabam de ter persistência e seriedade. Essa não é a primeira falência do clã Jacob. Em 1950, quando era ainda bem jovem, Jorge herdou do pai uma empresa em crise, com credores batendo à porta, e conseguiu contornar a situação. O outro atributo um executivo se encarrega de explicar. ?Os Simeira Jacob são gente honrada. Ninguém aqui foi para a Inglaterra jogar pólo?, ironiza Marcondes.