15/04/2009 - 7:00
Barthelemy, hoje e no Vietnã: a guerra agora é na licitação para fornecer scanners para a Receita (acima à dir.)
A história do belga Jacques Barthelemy nada tem a ver com o estereótipo de um homem de negócios. Em sua juventude, em 1971, Barthelemy foi fotógrafo durante a Guerra do Vietnã. Depois, em parceria com um amigo, escreveu e fez as fotos de um livro, publicado em 1975, sobre os plantadores de ópio das montanhas do Vietnã e as precárias condições em que viviam. No mesmo ano, saiu de Saigon, então a capital do Vietnã do Sul, em direção ao Vietnã do Norte. Pouco depois de chegar a Hanói, porém, foi preso, acusado de espionagem. A pena: morte por decapitação. Graças à intervenção da embaixada belga, livrou o pescoço e a vida. “Um dia, me tiraram da cela e me colocaram num táxi que me levou até Bangcoc (Tailândia), a mais de mil quilômetros de onde eu estava”, lembra.
Mas nenhuma dessas aventuras parece páreo para a dificuldade que Barthelemy, hoje radicado no Brasil, enfrenta numa concorrência da Receita Federal para fornecimento de 37 equipamentos de scanners para portos brasileiros, um contrato estimado em R$ 300 milhões. Dono da EBCO Systems, fundada em 1982 e maior fornecedora de sistemas de segurança do País, o belga domina 90% do mercado brasileiro. “Somos muito atacados pelos concorrentes. Hoje passo mais tempo com advogados do que com meus engenheiros. É tudo muito difícil”, diz, irritado com as dificuldades na concorrência. Atualmente, a EBCO tem mais de US$ 200 milhões em equipamentos instalados no País, fruto de investimentos anuais de cerca de US$ 4 milhões. Embora a EBCO tenha sido considerada, segundo ele, a única com capacidade para atender às exigências do edital, a Justiça bloqueou a concorrência a pedido da MRA, que alega falta de tempo para se preparar. Sediada em Jardinópolis (SP), a empresa nunca atuou na área de segurança, diz o belga. Com capital declarado de apenas R$ 20 mil, abaixo do mínimo estipulado pelo edital, diz Barthelemy, ela vende eletrodomésticos.
A MRA, porém, alega que o edital não exige capital social mínimo e, sim, um valor mínimo (cerca de R$ 30 milhões) de patrimônio líquido, o que poderia ser atingido com uma associação com a American Science, uma das principais fabricantes de scanners dos EUA. O curto prazo estabelecido pelo edital também teria impedido que a MRA conseguisse todos os documentos solicitados e fechasse a parceria com a americana, diz o advogado da MRA, Daniel Degenszajn. Para ele, o prazo estreito seria indício de que a licitação estava direcionada para a EBCO. Assim, a MRA pediu a impugnação da licitação por 60 dias. “não há nenhuma medida judicial impedindo a Receita de realizar a concorrência. O que existe é uma ordem da Justiça para que o edital seja publicado novamente, com prazos mais razoáveis “, diz o advogado. DinHEiRO tentou falar diretamente com a empresa em Jardinópolis. no número de telefone obtido, as ligações caíam em uma secretária eletrônica com gravação em espanhol. Degenszajn se recusou a confirmar o telefone, alegando que fala em nome da MRA.
Assim que desatar esse nó o belga Barthelemy retomará suas aventuras. Depois de se livrar da morte no Vietnã em 1976, desembarcou em Salvador, na Bahia, onde abriu um restaurante. Ocasionalmente, seguia os ditames de seu espírito aventureiro. À época, EUA e Europa investiam no iraque de Saddam Hussein, considerado um aliado contra a União Soviética. “no iraque fui chefe de projetos em instalações militares”, conta. Em 1982, aproveitando os contatos na área de segurança feitos no iraque, fechou o restaurante e abriu a EBCO. Pouco depois, venceu seu primeiro grande contrato: fornecer os equipamentos de raios x para o Aeroporto de Guarulhos, então em construção. nunca abandonou as aventuras. Com seu veleiro, já navegou pela Antártida e pela Polinésia. E pretende voltar para um desses lugares remotos, assim que superar sua mais recente aventura, a licitação de equipamentos para a Receita Federal.