No terceiro e último dia do evento Safra Trends, o objetivo do Banco Safra foi mostrar a opinião dos especialistas sobre o que esperar para 2023 e os melhores portfólios para o período. No primeiro bloco, Mauricio Hazan, head de Alocação do Safra, conversou com Luis Stuhlberger, diretor da Verde Asset, para trazer um panorama geral do mercado de fundos de investimento para o ano.

 

Stuhlberger lembrou que o ano de 2022 foi um dois mais difíceis para os ativos financeiros dos últimos 50 anos. “Em três anos, passamos por três ‘black swans’ (eventos totalmente imprevisíveis, mas que possuem alto impacto no universo das finanças), como a surpresa inflacionária – que não foi transitória -, a guerra na Rússia e o lockdown na China. É raríssimo isso ocorrer em um período tão curto de tempo”.

 

Uma das grandes atenções do mundo, segundo o gestor, é a possibilidade de recessão nos EUA. “O mercado americano está tão apertado, o mercado de trabalho com pleno emprego e a inflação saindo do controle. O mood preocupação foi trocado pelo pânico. O nível de juros atual dos EUA vai provocar essa recessão e os mercados já estão sentindo isso parcialmente. A elevação dos Fed Funds de 0% a 4,5% em um ano é algo nunca visto. Até agora, as consequências estão sendo brandas”.

 

O gestor aponta que a outra grande preocupação do mercado financeiro global atualmente é a China. “Os EUA e a Europa querem depender cada vez menos da China, mas é algo que não ocorre do dia para a noite, já que a atividade industrial do país é gigante. Por outro lado, a questão demográfica – por conta das políticas restritivas – vai bater na porta e causar um grande problema, já que a China tem o maior mercado imobiliário do mundo. O governo chinês fornece fortes incentivos para o setor, mas essa capacidade de socorro pode estar chegando perto do seu limite”.

 

Para Stuhlberger, o momento agora é de cautela. “Minha recomendação é ou ficar em caixa, esperar o mercado cair ou comprar bonds de curta duração, aguardando o melhor momento para entrar no universo da renda variável”.

 

No fundo Verde, gerido pela asset, Luis tem carregado posições de ouro. “Eu acredito no ouro como uma nova reserva de valor relevante, principalmente pela questão geopolítica, pois ele pode ser transportado fisicamente e isso deve acontecer quando os juros americanos começarem a cair”.

 

Em relação à distribuição da carteira do fundo, 15% estão alocados em ativos de renda variável – anteriormente, chegou a ter um porcentual entre 20% e 25%. No entanto, ele acredita que em algum momento o investimento estrangeiro volte a ficar mais forte na Bolsa em 2023. “Os investidores estrangeiros estão esperando virar o ano e ver como vai ficar o novo governo. A questão fiscal, com um valor fora do teto de gastos em torno de R$ 350 bilhões – somando o montante do governo Bolsonaro e, agora, do Lula – aumenta a preocupação deles”.

 

O restante de ativos do fundo está exposto em ativos atrelados ao CDI – mais de 80% – e ao petróleo. Luis contou que faz operações de hedge no mercado de juros no Brasil e no exterior, ficando comprado na inflação brasileira até 2035 e vendido em dólar, e mantém exposição em petróleo. “O consumo de petróleo na China caiu e os EUA venderam 40% de seu estoque, o que gerou um Zell-off e trouxe boas oportunidades”.

 

Bolsa: segmentos promissores

No painel seguinte, Louise Baresi, sócia-fundadora da AGF, além dos analistas de Research do Banco Safra, Cauê Pinheiro, Luana Nunes, Ricardo Boate e Vitor Pini, apontaram para os participantes quais são os setores promissores na Bolsa para receber novos investimentos.

 

Adepta de uma estratégia voltada para o pagamento de dividendos, Louise disse que agora o momento é de “guardar a lupa e olhar o mercado de renda variável com binóculo”, ou seja, de olho no médio e longo prazos. “Ainda há muita incerteza no ar em relação ao próximo governo, por isso é importante escolher empresas para investir que tenham um caixa robusto e previsibilidade de resultados para passar pelas turbulências”.

 

A projeção dos analistas do Safra é que o Ibovespa trabalhe no patamar de 130 mil pontos em 2023. “Mesmo assim, a Bolsa está 30% mais barata, o que é um bom ponto de entrada”, afirmou Pinheiro, que destacou os setores de utilities e seguradoras como boas alternativas. “As empresas de energia elétrica e saneamento têm previsibilidade e pagam bons dividendos. Já as seguradoras têm tido resultados robustos, se beneficiam dos juros altos e têm os prêmios investidos em CDI”.

 

No varejo, as apostas do Safra se voltam para os mercados farma e alimentício. “São setores mais protegidos da inflação e de juros altos. Com a população envelhecendo, o aumento do consumo de medicamentos também sobe, independentemente se a inflação sobe ou não”, afirmou Pini, que elencou boas teses de empresas como Raia Drogasil – apesar de estar sendo negociada a múltiplos elevados – e Panvel.

 

Ainda em saúde, Boati disse que o cenário é desafiador para empresas como as operadoras de saúde, cujo reflexo da pandemia ainda não foi regularizado. Entretanto, destacou que tem simpatia pelos fundamentos da Rede D’Or. “É uma empresa que tem um histórico de execução consistente, mantém o crescimento médio em qualquer cenário e tem certo poder de mercado pela escala e qualidade de seus ativos, o que dá uma certa tranquilidade”.

 

Também pelo Fleury. “Tem uma tese menos alavancada no macro, com múltiplos bem menos esticados do que a Rede D’Or, mas está apostando em crescimento agressivo e tem bom histórico de M&A”.

 

No varejo alimentício, Pini destacou a capacidade dessas empresas repassarem a inflação rapidamente para os seus produtos, o que ajuda a manter a margem. Nesse sentido, o atacarejo se destaca. “Esse segmento está evoluindo a experiência para o consumidor, além de ter uma cesta média 15% mais barata em relação aos supermercados convencionais”.

 

Luana complementou que  as empresas com receita dolarizada também podem ser boas apostas para 2023. Pegando carona nessa linha, Pini comentou sobre os frigoríficos como a JBS, que possui grande parte da sua receita atrelada ao mercado americano. “As margens operacionais das operações de bovinos nos EUA bateram recordes históricos e foram caindo, porque estavam em um ponto fora da curva. A JBS está sendo negociada com um desconto significativo em relação à média histórica. Além disso, é uma excelente geradora de caixa e tem diversificação global”.

 

Na construção civil, Peçanha enfatizou o quanto o setor está sofrendo com a alta de juros, sendo o mercado de média e alta renda o mais prejudicado. “Atualmente, preferimos ficar posicionados em empresas focadas em empreendimentos de baixa renda, que recebem incentivos do governo”.

 

Como vencer as adversidades?

O dia foi concluído com o painel “Como investir em 2023: estratégias para vencer o mercado”, que contou com a presença de executivos do Banco Safra como Jorge Sá, estrategista-chefe, Ana Paula de Almeida, estrategista da Asset, Cauê Pinheiro, analista de Research e Pedro de Alvarenga, head de Research.

 

Sá comentou que a primeira coisa que o investidor deve fazer antes de dar qualquer tipo de passo é definir o seu perfil. “É preciso fazer uma reflexão sobre onde se quer chegar, quais riscos está disposto a correr, objetivos e capacidade de aguentar turbulências”, complementou Alvarenga. “Quando é feito qualquer tipo de investimento, o investidor tem que abrir mão de um desses três riscos – volatilidade, liquidez e crédito – para buscar maior rentabilidade”.

 

Nesse sentido, Ana Paula enfatizou o papel dos fundos multimercados, que possibilitam a diversificação dos ativos. “As relações econômicas são complexas, à medida que você está exposto a um conjunto de vetores de forma diluída. Isso forma uma carteira de investimentos sujeita a ciclos bons e ruins”.

 

Para 2023, o cenário será desafiador. “Temos problemas demográficos na China e EUA, inflação global, que está sendo combatida com alta de juros. É nesse tipo de adversidade que os fundos multimercados são fundamentais para ter na carteira”, enfatizou.

 

Alvarenga apontou os bons retornos obtidos com ativos de renda fixa de crédito privado. “Eles têm pagado, em média, 130% do CDI”. As famílias dos fundos de debêntures incentivadas também são boas pedidas no momento de inflação alta, de acordo com Ana Paula. “Apresentam risco menor e benefícios tributários. Isso é importante no cenário de IPCA elevado”.

 

Pinheiro abordou o mercado de renda variável e apontou que a carteira Top 10 ações do Safra bateu a performance do Ibovespa neste ano. “Os ventos não estão favoráveis, mas escolhendo os ativos com muito critério, conseguimos bons resultados”.

 

As operações estruturadas também foram uma das indicações feitas por Alvarenga durante a conversa. “Esse ativo tem a previsibilidade como um de seus principais pontos fortes. É um produto subjugado pelo que ele entrega. Se o investidor opta por um título pós-fixado na Selic atual, de 13,75% ao ano, consegue travar esse rendimento para os próximos dois ou três anos, mesmo que a taxa volte a cair”.

 

Outro mercado que também apresenta oportunidades, segundo Pinheiro, é o de fundos de investimentos imobiliários (FIIs), que foi severamente “castigado” pela pandemia, com destaque para os segmentos de shopping centers e lajes corporativas. Hoje é possível encontrar boas rentabilidades nesses dois ambientes. “Hoje é possível encontrar fundos de tijolo com 25% no valor patrimonial. Se a gente tiver uma perspectiva de crescimento com juros menores, o fundo está operando com valor de cota abaixo do custo de reposição. Para subir um galpão, a empresa vai ter que comprar tijolo e cimento com preços que já sofreram o efeito da inflação”.

 

Ambos os setores também já estão retornando à normalidade, com os shoppings centers com resultados 40% maiores se comparado ao período pré-pandemia e o nível de vacância dos escritórios diminuiu com a volta ao trabalho dos colaboradores nos escritórios.

 

Na classe de FIIs de papéis – que trabalha com Certificados de Recebíveis Imobiliário (CRIs) –, o fato de eles estarem indexados a indexadores como IGP-M, IPCA e CDI, que atualmente estão elevados, contribui para a distribuição de bons dividendos. “Hoje é possível comprar carteiras de CRIs com 8% de desconto. Se a curva de juros fechar, haverá uma reavaliação do valor patrimonial para cima”, concluiu.