09/01/2023 - 14:37
O rastro de destruição deixado neste domingo (08/01) por bolsonaristas nas edificações que abrangem a Praça dos Três Poderes – Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal (STF) – foi além dos móveis e vidraças. Os extremistas destruíram ou danificaram também uma série de obras de arte e monumentos brasileiros.
A pintura “As Mulatas”, do pintor Di Cavalcanti, um dos maiores expoentes do movimento modernista da década de 1920, foi rasgada e furada em vários lugares. A obra, de 1962, decora um dos salões do Palácio do Planalto e tem valor estimado em R$ 8 milhões.
Também no Planalto, a escultura em bronze “O Flautista”, de Bruno Giorgi, avaliada em R$ 250 mil, foi completamente destruída, com diversos pedaços espalhados pelo chão.
Já uma escultura em madeira do artista Frans Krajcberg, que nasceu na Polônia e depois naturalizou-se brasileiro, também foi danificada. A obra é avaliada em R$ 300 mil.
Na Câmara dos Deputados, o vitral “Araguaia”, de Marianne Peretti, produzido em 1977, também foi danificado. Essa obra decora o Salão Verde. É uma maquete tátil da artista franco-brasileira – a única mulher a integrar a equipe do arquiteto Oscar Niemeyer – que simula o movimento de figuras geométricas sobre um vidro, o que remete ao curso de um rio.
Peretti, que também desenvolveu os vitrais da catedral de Brasília, utilizou vidro temperado e jatos de areia para fazer a obra.
No STF, a escultura “A Justiça”, do mineiro Alfredo Ceschiatti, tampouco escapou. A obra, que fica na parte externa do prédio, foi depredada e pichada.
Ela foi inaugurada em 1961 e retrata uma Têmis sentada, sem a tradicional balança, e com a espada sobre o colo – na mitologia grega, a Têmis era a personificação da Justiça. Feita em granito, a escultura mede 3,30 metros de altura por 1,48 metro de largura.
No plenário, o brasão da república foi arrancado, e os bustos de Rui Barbosa – responsável pela criação da Corte no atual modelo, em 1890 – e do abolicionista Joaquim Nabuco também foram atingidos pelos golpistas.
Outros artefatos danificados
Além dessas obras, funcionários da Câmara dos Deputados afirmaram que estavam à procura da escultura Bailarina, do italiano Victor Brecheret. Segundo o site da Câmara, a obra é uma das mais importantes do autor e retrata a fase em que ele morou em Paris, nos anos 1920.
Nascido na Itália em 1894, Brecheret foi para São Paulo em 1904. Durante o período em que morou na França, visitou o Brasil em diversas ocasiões.
Ainda no STF, a cadeira da presidente da Corte, Rosa Weber, desenvolvida pelo designer Jorge Zalszupin, foi arrancada. E um tapete que pertenceu à princesa Isabel, filha do imperador Dom Pedro 2º e responsável pela Lei Áurea, que aboliu a escravidão, também foi danificado.
Nesta segunda-feira, o governo divulgou que a obra “Bandeira do Brasil”, uma pintura de Jorge Eduardo, de 1995, que reproduz a bandeira nacional hasteada em frente ao Palácio do Planalto, foi encontrada boiando na água que inundou o prédio após os golpistas acionarem o sistema.
Também há relatos de diversos vidros quebrados, cadeiras e bancos arrancados e jogados para longe, tapetes molhados e câmeras de vigilância destruídas. A galeria de ex-presidentes, com fotos de todos os mandatários brasileiros, foi totalmente destruída.
O primeiro prédio a ser atacado neste domingo foi o do Congresso Nacional. Depois, o grupo de golpistas se dirigiu ao Palácio do Planalto e, por fim, ao STF, por volta das 15h30 (hora local). O controle só foi retomado pela tropa de choque por volta de uma hora e meia depois.
Três Poderes é patrimônio tombado
Os prédios da Praça dos Três Poderes foram tombados em 2007 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Planejada na década de 1950 pelo urbanista Lucio Costa e pelo arquiteto Oscar Niemeyer, a cidade de Brasília integra desde 1987 a lista do Patrimônio Mundial da Unesco.
Após os ataques, autoridades e instituições se manifestaram. O Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU) conceituou o episódio como um atentado grave contra “o primeiro conjunto urbano do século 20 reconhecido como Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas”.
O ex-presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) entre 2009 e 2013, José Nascimento, afirmou que o Iphan deve avaliar todo o prejuízo causado pela invasão.
gb (ots)