03/01/2020 - 17:38
A promessa do Irã de vingar a morte do general Qasem Soleimani em um ataque realizado pelos Estados Unidos pode levar o país a mobilizar seus aliados no Iraque, a realizar ações no Golfo de Ormuz ou fazer um ataque cibernético, entre outras possíveis represálias, segundo analistas.
Após vários incidentes entre os Estados Unidos e o Irã e a aceleração da crise, os especialistas não imaginam que a morte do poderoso general, um homem-chave do regime de Teerã, fique sem resposta.
“Há um amplo espectro de respostas possíveis, e nem todas envolvem ação militar ou violenta”, diz Heiko Wimmen, chefe da organização do Grupo de Crise para Síria, Líbano e Irã.
“Nenhum dos dois lados quer a guerra, nenhum dos dois tem nada a ganhar. O perigo é que estejam numa colisão frontal, esperando que o outro recue. Se nenhum dos dois fizer isso, pode terminar em desastre”, afirmou à AFP.
– A eclosão do teatro iraquiano –
O Iraque, onde a República Islâmica conta com um grande apoio, deve estar no centro das primeiras respostas de Teerã, mesmo que seja através de suas milícias, aliados e outros apoiadores.
“O Iraque agora se tornará o primeiro campo de batalha”, disse Alex Vatanka, especialista iraniano no Instituto do Oriente Médio em Washington.
“Haverá muita pressão sobre a presença militar no Iraque”, afirma Vatanka, lembrando que os americanos perderiam muito estrategicamente se abandonarem o país.
Em Bagdá, os comandantes das facções pró-Irã já chamaram seus combatentes “para estarem preparados”. O líder xiita Moqtada Sadr reativou o Exército Mehdi, sua milícia dissolvida há uma década.
Ações contra os americanos também são possíveis no Líbano, possivelmente no Iêmen ou na Síria, onde o Irã é ativo com seus aliados, como os huthis iemenitas ou o Hezbollah libanês.
– O petróleo do estreito de Ormuz
O Irã foi acusado muitas vezes em 2019 de atacar navios petroleiros na costa da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos e de confiscar embarcações marítimas perto do Estreito de Ormuz. Também se suspeita que esteja por trás de um ataque espetacular contra duas instalações de petróleo sauditas, que tiveram um enorme impacto.
“O Irã mostrou que pode atacar instalações, bloquear navios. É possível um bloqueio?”, pergunta Jean-Charles Brisard, presidente do Centro de Análise de Terrorismo (CAT) em Paris.
Os países ocidentais anunciaram várias operações para garantir o transporte nesta região ultramilitarizada.
– A opção pelo ciberataque –
“O Irã tenta buscar uma capacidade cibernética ofensiva que permita ataques contra infraestrutura crítica dos Estados Unidos e de seus aliados”, declarou perante o Senado americano em 2019 Dan Coats, diretor da National Intelligence, responsável pelos serviços de inteligência americanos.
Especialistas consideram o Irã como um dos principais atores no cenário cibernético global.
“Os iranianos formaram um ‘exército cibernético’, um grupo que jurou lealdade ao guia supremo sem ser uma estrutura social”, disse à AFP Loic Guézo, secretário-geral da Clusif, um grupo de profissionais franceses especializados em segurança e informação.
“Seus meios de ação são mais sobre infraestrutura do tipo industrial; é aí que eles são bastante assustadores: uma intrusão nos sistemas de produção de energia americanos”, destacou.
– O assunto nuclear –
Desde maio passado, o Irã violou vários compromissos do acordo de 2015 que garantiam a natureza pacífica de seu programa nuclear, em resposta à decisão de abandonar o acordo dos EUA em 2018 e ao restabelecimento das sanções dos americanos que sufocam a economia iraniana.
Espera-se para a próxima segunda-feira um anúncio do Irã de novas decisões sobre o acordo que está morrendo, como a reativação de instalações proibidas ou a superação de novos limites de enriquecimento de urânio.
A França pediu nesta sexta-feira a Teerã que evite o risco de uma “grave crise de proliferação nuclear”.
– Ninguém quer uma guerra –
Segundo Vatanka, Soleimani era uma figura importante e será necessário “um discurso de vingança em” do regime iraniano. Mas nem Washington nem Teerã querem ir para um confronto maior, convencional e brutal.
Outras figuras da revolução foram abatidas e “nunca foram verdadeiramente vingadas”, disse o pesquisador.
O regime iraniano, já em grande dificuldade no nível interno, não tem chance de vencer uma guerra dessa magnitude. “Não é um regime suicida”, insiste Vatanka.