O ritual foi adequado à semana anterior ao Natal. Gorro e uniforme vermelhos, trenó e, principalmente, um saco repleto de presentes. Tudo preparado, na quarta-feira 19, Ben Bernanke, presidente do Fed, e Janet Yellen, segunda em comando e sucessora de Bernanke a partir de janeiro, espalharam felicidade por todo o mercado. No comunicado divulgado após a última reunião do Comitê de Mercado Aberto de 2013, eles informaram que, no primeiro mês de 2014, o programa de ajuda econômica que vem injetando mensalmente US$ 85 bilhões na economia, por meio da compra de títulos públicos e papéis lastreados em hipotecas, vai reduzir esse valor para US$ 75 bilhões mensais, para acabar de vez no segundo semestre do ano que vem.

 

64.jpg

 

A princípio, a notícia de que um banqueiro central vai tirar dinheiro da economia é tudo que um investidor não quer ouvir, especialmente quando se trata de um programa que injetou US$ 1 trilhão no mercado ao longo de 2013. No entanto, a retirada do Fed foi mais do que compensada por dois sinais positivos. O primeiro foi um forte compromisso, expresso por Bernanke em uma entrevista coletiva após a reunião, de que as taxas de juros referenciais dos Estados Unidos vão continuar perto de zero. A segunda foi a interpretação de que o Fed avalia que o pior da crise já passou. 

 

Segundo Jan Hatzius e Alec Phillips, analistas do banco Goldman Sachs em Nova York, a nota mostra que o mercado de trabalho melhorou, com o nível de desemprego atualmente em 6,5% e caminhando para 6%, sem, no entanto, levantar temores de uma aceleração da inflação. As projeções médias do mercado são de um crescimento da economia de 2,2% a 3,2% no ano que vem e de 3,0% a 3,4% em 2015. Em 2016 a estimativa é de um crescimento entre 2,5% e 3,2%, números considerados bastante positivos e, principalmente, sustentáveis. Em Brasília, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, comemorou a decisão de Bernanke. ?A redução dos estímulos é muito positiva, porque ela é gradual e vai afetar menos a volatilidade do câmbio?, disse Mantega na quinta-feira. ?É bom para o Brasil e é bom para o mundo.? 

 

65.jpg

Janet Yellen, Federal Reserve: “o Fed vem notando sinais de melhora no mercado de trabalho que,

no entanto, não vêm acompanhados de um aumento do risco de inflação”

 

A reação dos mercados foi boa. A decisão anunciada no início da tarde em Washington fez o índice Standard & Poor?s de 500 ações encerrar a sessão com uma alta de 1,7%. A divulgação ocorreu no momento em que os negócios na Bolsa brasileira estavam caminhando para o fim, mas, mesmo assim, ela fez o Índice Bovespa fechar em alta de 0,9% na quarta-feira 18 e de 2,1% na quinta-feira 19. No pregão da quinta, quase todas as ações do Índice Bovespa fecharam em alta, com exceção de seis papéis. O dólar subiu, registrando uma alta modesta de 0,2% na quarta-feira e de 1,1% na quinta, quando fechou a R$ 2,3528. No entanto, a alta na taxa de câmbio deveu-se menos ao comunicado do Fed e mais ao anúncio do Banco Central do Brasil (BC), na quinta 19, de que continuará a irrigar o mercado de dólares com a venda de swaps cambiais até julho do ano que vem. 


Mas a fatia diária vai encolher dos atuais US$ 500 milhões por dia para US$ 200 milhões. O que tudo isso significa para os investidores daqui? Em um primeiro momento, a injeção menor de dinheiro pode representar menos dólares em busca das ações e dos títulos de renda fixa brasileiros. No entanto, a melhora da economia americana e, principalmente, a manutenção dos juros perto de zero, deverão manter o interesse dos investidores de lá pelos bons retornos proporcionados por aqui. Há outro sinal positivo. A decisão do Fed é o primeiro sinal de desaceleração em uma trajetória de crescimento ininterrupto da dívida pública americana. 

 

O total a pagar vem sendo inflado pelos crescentes gastos militares e pela maciça injeção de recursos na economia realizada não só por Bernanke como, principalmente, por seu antecessor, Alan Greenspan. Nos últimos 30 anos, a solução para qualquer turbulência no mercado financeiro, da crise do petróleo nos anos 70 ao estouro da bolha da internet em 2001, foi abrir as torneiras. Com isso, o governo americano iniciou os anos 1980 devendo pouco mais de um terço do Produto Interno Bruto (PIB) e, atualmente, deve mais do que o total do PIB (veja quadro abaixo). Ao procurar estabilizar esse desequilíbrio, o Fed torna a economia americana mais previsível ? e todos ganham.

 

66.jpg

 

> Siga a DINHEIRO no Twitter 

> Curta a DINHEIRO no Facebook