14/06/2023 - 10:17
Quando uma empresa vem de uma crise profunda e prolongada, tudo que o mercado espera é uma boa notícia. Nesse sentido, a CVC aparentemente conseguiu atender as expectativas com a nomeação do novo CEO, bem como o anúncio de uma oferta subsequente de ações, ou follow on. Nos últimos 30 dias, a ação ordinária da companhia subiu mais de 30% até esta terça-feira, 13, dia em que o papel caiu 6%.
No entanto, segundo informações obtidas com analistas e acionistas, fica claro que ainda há mais dúvidas que certezas sobre o futuro da CVC. Principalmente por conta da participação da família Paulus na nova oferta de ações, que pretende captar pelo menos R$ 200 milhões.
+ CVC: prejuízo líquido é de R$ 128 mi no 1º trimestre
A volta do fundador Guilherme Paulus, que se compromete a fazer um aporte de R$ 75 milhões na empresa, representa uma tentativa de retomada da antiga imagem da CVC, algo visto com preocupação especialmente pelos acionistas minoritários.
Paulus enfrentou investigações pela Polícia Federal e fechou uma delação premiada sobre pagamento de propina para cancelar uma autuação da Receita. Em meio a esse episódio, se desfez da participação que tinha na CVC, em 2018.
A companhia anunciou, no último dia 2, seu novo CEO. Fabio Godinho é um nome ligado à família Paulus, tendo comandado a GJP Hotels & Resorts. A companhia já havia anunciado Carlos Wollenweber como diretor financeiro, e nesta terça-feira, anunciou o nome de Paulo Palaia como diretor operacional. O último já havia atuado na operadora de turismo entre 2000 e 2006.
Expectativa do mercado
A nomeação desta nova diretoria tem levantado questionamentos entre os acionistas sobre os níveis de governança corporativa da CVC. A nova equipe que vai tocar a administração da companhia conta inclusive com a participação de Luiz Eduardo Falco, ex-CEO que saiu do cargo acusado de cometer erros contábeis.
A percepção do mercado é de que esta volta da família Paulus e de executivos que já passaram pela empresa significa mais uma tentativa de salvação dos próprios fundadores, independente das consequências para a companhia.
Rumores indicam que uma das estratégias seria encerrar disputas que estão abertas na Justiça, com o objetivo de aliviar a pressão sobre Paulus. Esta abordagem preocupa os acionistas minoritários, principalmente em relação à saúde financeira da CVC.
Analistas também apontaram estas preocupações após os resultados do primeiro trimestre de 2023, quando a empresa registrou prejuízo de R$ 128 milhões.
No final de maio, o Bank of America resolveu rebaixar a recomendação para a ação da CVC, de Neutra para Underperform (desempenho abaixo da média de mercado), que na prática, significa que o banco recomenda aos investidores a venda da ação.
Além dos números, o Bank of America indica que a saída do ex-CEO, Leonel Andrade, e do ex-diretor Financeiro, Marcelo Kopel, trouxe muitas incertezas sobre o futuro da CVC.
Os analistas do banco apontam ainda um ambiente macroeconômico ainda muito desafiador. O mês de junho, que tipicamente é positivo para o turismo, não deve ter o mesmo efeito neste ano no caixa da CVC, diz o BofA. Isso por conta das altas taxas de juros no Brasil.
Mas não são só os nomes e os números que preocupam os acionistas minoritários da CVC. A gestão da empresa neste momento de crise desperta muitas desconfianças. Mesmo em um período prolongado de prejuízos, a companhia distribuiu R$ 45 milhões em bônus para seus funcionários.
Na última semana, a CVC realizou uma grande convenção para os franqueados. Mais de R$ 10 milhões foram gastos em um evento luxuoso, inclusive com shows.
Segundo uma fonte de Dinheiro, essa forma de gestão aumenta a urgência por um follow-on, mas ao mesmo tempo, levanta questionamentos sobre a destinação dos recursos e a continuidade da operação da CVC.
A mesma fonte afirma que a oferta de ações tem 60 dias para ser efetivada, prazo que vence no final de julho. Outros personagens próximos à empresa dizem que a família Paulus já considera a possibilidade de cancelar o compromisso de aporte caso a situação seja pior que o estimado inicialmente.
Enquanto isso, os minoritários aguardam um desfecho. Eduardo Silva, presidente do Instituto Empresa, entidade que atua na defesa de direitos de pequenos acionistas, afirma que, de certa forma, a CVC foi até beneficiada pela pandemia de Covid-19, que provocou uma crise no setor de turismo.
“Serviu como uma cortina de fumaça, pois em março de 2020, no começo das restrições de circulação no Brasil, a companhia anunciou o rombo contábil”, lembra Silva.
Ele ressalta que antes mesmo da pandemia, em 2019, a empresa já vinha submetendo os detentores de debêntures a atrasos nos pagamentos de juros e até mesmo desconto nos valores devidos.
“O follow-on anunciado agora não pode ser lido longe desse contexto. Trata-se de uma empresa muito endividada, com eventos reconhecidos de corrupção corporativa. Os minoritários já perderam patrimônio. Com a oferta, serão ainda mais diluídos dentro do capital da CVC, perdendo até poder de voto”, diz Silva.
O advogado afirma que a CVC tem cerca de 160 mil pessoas físicas como investidores. “Eles têm um enorme poder, mas estão dispersos e desarticulados. Nosso papel é reuni-los e representá-los em assembleias, reuniões e em eventuais litígios”, diz Silva.
Procurada, a CVC preferiu não se manifestar sobre o assunto.