10/09/2003 - 7:00
DINHEIRO ? Quando o emprego está em baixa, o headhunter
pode tirar férias?
ROBERT WONG ? Ao contrário, tem de trabalhar mais. Nossos
clientes são basicamente executivos ? e eles estão muito
assustados. Quem está procurando uma colocação vive momentos
de abatimento e depressão. Mesmo quem está bem empregado enfrenta, atualmente, questionamento e insegurança. O papel do headhunter, nessa hora, é prestar orientação. Temos de ajudar os profissionais a buscarem equilíbrio.
DINHEIRO ? Qual é o melhor momento para se procurar
um novo emprego?
WONG ? É quando você está bem empregado. A sua condição negocial fica muito melhor. Quando você está desempregado, tem de aceitar o que o mercado oferece. Mas infelizmente a pessoa só começa a se movimentar quando está na pior condição.
DINHEIRO ? Quem está bem empregado e procura mudar não fere uma relação ética com o seu empregador?
WONG ? A vida útil de um executivo não é eterna. Quando se está no auge e aparecem convites, eles têm de ser analisados com frieza. Sempre digo, porém, que o primeiro fator a considerar é a sua própria situação no emprego atual. Se você está realmente feliz, fique! Porém, se o novo emprego for mais desafiante e com mais possibilidades de ascensão, esse já é um bom motivo para a mudança. O segundo aspecto a considerar é a empresa que está fazendo o convite. Quais são seus valores, seus compromissos com o crescimento, sua solidez e até sua localização? O executivo
brasileiro não é muito móvel, ao contrário do americano. Lá, para aceitar um convite, eles perguntam apenas ?how much??. Aqui, vão perguntar para a esposa etc. O terceiro elemento desta equação
é a compensação em salários, benefícios e bônus. Pesados esses fatores, mudar de emprego não fere nenhuma ética. É apenas um evento na vida.
DINHEIRO ? O que está acontecendo com os salários?
WONG ? A remuneração dos executivos está sendo triturada. A cinco ou seis anos atrás era muito comum a gente fechar posições de
US$ 300 mil ou US$ 400 mil anuais. Participei de um caso de US$ 1 milhão de salário anual. Hoje em dia, quando pegamos um executivo de topo para ganhar US$ 150 mil ou US$ 200 mil, festejamos. Houve uma relação direta na redução dos salários com a desvalorização da nossa moeda. Os benefícios também ficaram muito mais modestos. Eles passaram a se restringir apenas ao topo da pirâmide.
DINHEIRO ? Como saber se o salário recebido é bom?
WONG ? Uma das coisas que mais nos cutucam é a pressão dos nossos pares. Da infância à adolescência tem sempre alguém do lado fazendo as mesmas coisas que a gente. Na vida profissional é igual. O executivo deve comparar o seu salário ao de outros profissionais em cargos equivalentes. Quem está muito defasado deve começar a se movimentar o quanto antes. O salário não deve ser medido pelo padrão de vida do profissional ou o atendimento de suas necessidades básicas. Precisa-se de pouco para viver com dignidade, mas isso não tem a ver com remuneração justa.
DINHEIRO ? Qual sua dica para
crescer na carreira escolhida dentro
de uma empresa?
WONG ? De cara é preciso saber que tudo tem seu preço. Avançar quase sempre custa tempo da vida particular. Convivência com a família, estabilidade no casamento e atenção com a saúde podem estar envolvidos numa trajetória de sucesso profissional. Não basta dizer: quero ser presidente como Bill Gates. É preciso estar disposto a pagar o preço para chegar lá. Não quero ser preconceituoso, mas os homens costumam enfrentar melhor essa realidade. Mulheres sabem preservar bastante bem sua felicidade pessoal. A ascensão profissional, assim, muitas vezes não é questão de competência versus incompetência, mas de quem está disposto a pagar o preço de saber a hora de entrada e não a da saída, estar disponível para viagens que podem ser longas e trabalhar nos finais de semana.
DINHEIRO ? Como um profissional de meia idade pode se
relançar no mercado?
WONG ? Uma coisa que tem de ficar claro para quem está buscando uma nova colocação é que todos na vida, uma dia ou outro, passam pela perda de emprego. Isso é fatal. O que há para fazer é tirar o máximo de lições possíveis desse evento. Por que aconteceu?
Muita gente se coloca como vítima. Foi culpa do chefe, do governo, do mercado ou da conjuntura econômica mundial. Poucos se perguntam de verdade ?o que eu fiz ou deixei de fazer para isso?? Esse é o começo.
DINHEIRO ? Qual é o passo seguinte?
WONG ? É ou não verdade que 99% dos empregos que cada um de nós conseguiu na vida profissional foram obtidos de forma reativa? Ou foi por anúncio de jornal, indicação de amigo ou chamada de headhunter. Em outras palavras, as oportunidades se colocaram na nossa frente e só o que tivemos de fazer foi reagir perante o estímulo externo. Raramente uma pessoa procura um emprego de forma pró-ativa. Poucos dizem: eu quero trabalhar na Microsoft ou na Vale do Rio Doce. Os executivos costumam ter a postura daquela moça que fica no salão de baile esperando alguém tirá-la para dançar. Umas das obrigações do meu trabalho é estimular a atacar o mercado. E isso serve para gente de todas as idades.
DINHEIRO ? Quais os predicados que é preciso ter na hora de avançar sobre o alvo escolhido?
WONG ? A característica essencial é a auto-confiança. Com isso, qualquer um pode ser um sucesso profissional, social, pessoal, acadêmico, atlético ou sexual. É preciso ter competência e atitude certa, mas sem auto-confiança é melhor que você nem comece a tentar ter sucesso. Não vai dar certo.
DINHEIRO ? Só isso?
WONG ? Não. Para ter auto-confiança é preciso ter auto-conhecimento. Se você se conhece bem, sabe se está bem numa empresa ou se está na hora de mudar e para onde. Mas se não se conhece, mal sabe o que quer. Noto que principalmente os estudantes se guiam pelo modismo na hora de escolher uma carreira. Quando comecei, nos anos 70, todos queriam ser engenheiros civis, foi um boom. Depois veio a onda da cibernética. Hoje em dia é hotelaria, turismo, comunicação. Essas ondas acontecem porque as pessoas não se conhecem e se deixam levar por pressões externas de pais, professores, namoradas ou colegas. As respostas certas estão dentro de nós mesmos.
DINHEIRO ? O que as empresas estão procurando, ou melhor, elas estão procurando?
WONG ? Sem dúvida a demanda diminuiu. Nós estamos vendo no mercado uma oferta muito grande de profissionais disponíveis e pedidos em número bem menor. Ao mesmo tempo, as exigências das empresas são maiores. Hoje em dia um executivo tem de fazer o trabalho de dois ou talvez de três. Não basta mais ser bilíngue ou trilíngue, tem de ser bicultural ou tricultural. E essa diferença é
brutal. Isso quer dizer que quem conhece normas sociais de outros países, os costumes e os códigos, esse profissional leva imensa vantagem sobre o outro.
DINHEIRO ? O que mais é exigido?
WONG ? Capacidade de adaptação aos novos tempos conta muito. Vale dizer que as empresas, com a diminuição das margens de lucro, muitas estão medindo seus gastos em centavos. Tempos atrás, algumas chegaram a ganhar tanto dinheiro que deixaram os controles em posição de segundo plano. Hoje, ao contrário, a controladoria é talvez a seção mais importante. Quem realiza uma entrevista de emprego para esta área falando em economizar no fluxo de papéis, nos gastos com combustíveis e na importância de aumentar a produtividade geral sai, sem dúvida, na frente. Os gerentes financeiros têm de se capacitar mais para fazer economias internas do que saber investir lucros no mercado. Na área comercial, o foco se volta cada vez mais para o mercado externo. Conhecer exportação é importante. Antes se falava em aumentar o market share, o que queria dizer tirar mercado dos concorrentes. Hoje o que se fala é aumentar o mercado, e não apenas a sua fatia no mercado. Quem tem conhecimento sobre como criar novos públicos para uma companhia igualmente leva vantagem.
DINHEIRO ? O que mais está mudando?
WONG ? O papel clássico do Relações Humanas está completamente mudado. Antes da crise, os papéis básicos desses profissionais eram os de recrutar, selecionar e treinar. Hoje eles estão acrescidos das obrigações de desenvolver novas habilidades nos profissionais de uma companhia, motivá-los e retê-los no emprego, para evitar gastos com cortes e novas contratações. O detalhe importante é que, com as limitações de custos, não existem mais as tradicionais ferramentas de aumentar os rendimentos indiretos e os benefícios. É preciso saber motivar sem criar novos custos.
DINHEIRO ? Quais as diferenças entre empresas nacionais e de capital estrangeiro na hora de contratar?
WONG ? Até dez anos atrás, nosso portfólio de clientes era composto em 85% por empresas multinacionais e apenas 15% de companhias nacionais. Hoje, essa carteira está dividida meio a meio. Isso é saudável e significa que as empresas brasileiras acordaram para a realidade de que seu sucesso depende diretamente da qualidade de seus recursos humanos. É preciso ter recursos financeiros e materiais, mas é no pessoal que a empresa tem o seu maior patrimônio. As empresas brasileiras passaram a entender que só tem excelência quem tem pessoas excelentes. Não adianta ter pessoas medíocres. O máximo que se consegue nesse caso é uma excelente mediocridade. Os americanos sempre entenderam a idéia do dream team. Está sendo muito legal trabalhar para empresas nacionais. Elas também entenderam.
DINHEIRO ? Qual foi o fator principal para esta mudança?
WONG ? As empresas brasileiras fizeram corretamente a passagem da situação de controle familiar para a de executivos. Os movimentos agora são mais rápidos, inclusive em relação às multinacionais. Estas, a qualquer decisão mais importante, precisam consultar suas sedes e tratar com vários níveis de comando. Isso, invariavelmente, demora. Outro aspecto de diferenciação é que as múltis estão amarradas a estratégias globais. Se o Brasil ou a América Latina são prioridades, não lhes faltam recursos. Se não forem, arquive seus planos e ponto final. Com a empresa nacional, não há alternativa. A prioridade é aqui.
DINHEIRO ? No início da entrevista o sr. falou da necessidade de se buscar equilíbrio interior. É a melhor hora para isso?
WONG ? As pessoas só mudam de verdade em duas ocasiões. Ou em momentos de grande alegria e euforia, como o nascimento de um filho, ou de grande sofrimento, como doença em família, divórcio, seqüestro ou a perda do emprego. Entre esperar que fatos como esses aconteçam e buscar o equilíbrio de moto próprio, a segunda alternativa, em qualquer tempo, é melhor.