A volta de uma estratégia de fortalecimento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) pode reduzir a potência da política monetária e ser mais um elemento negativo para o desafio do Banco Central (BC) de atingir seus objetivos para a inflação, dizem ex-diretores de política monetária.

“O impacto de operações com taxa subsidiada vai ser maior ou menor a depender do volume de recursos (que serão oferecidos pelo BNDES)”, disse Aldo Mendes, ex-diretor do BC e hoje membro do conselho de administração da Cielo, da BRF e da Engepar. “Se ampliar muito o volume de crédito subsidiado, haverá redução do poder da política monetária, e isso vai requerer juro real mais alto”, afirmou Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do BC e hoje presidente do conselho de administração da Jive Investimentos.

Nas últimas duas semanas, declarações de integrantes do governo evidenciaram a intenção de expansão das operações no banco de fomento: o novo diretor financeiro do BNDES, Alexandre Abreu, sinalizou a possibilidade de o banco reajustar o volume de desembolsos do atual 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB) para algo perto de 2% do PIB.

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em sua primeira viagem internacional como chefe de Estado, disse que o banco de desenvolvimento voltará a financiar projetos de engenharia para ajudar empresas brasileiras no exterior.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a ideia de financiar a construção de um gasoduto para trazer o gás de xisto da região de Vaca Muerta, na Argentina, para o Brasil. O ministro também disse que o banco está preparando discussão interna para estabelecer política de crédito à reindustrialização.

Taxa

O crédito é um dos principais canais de transmissão pelos quais a política monetária afeta os preços da economia. Uma vez que a mudança na taxa Selic atinge o custo de empréstimos, inibe o consumo e o investimento. Mas o tamanho da parcela de crédito subsidiado, ou seja, emprestado a um custo menor do que os juros praticados no mercado, altera o alcance da política monetária.

Para um outro ex-BC, que preferiu falar sob anonimato, um grande risco seria uma mudança na atual taxa cobrada em financiamentos do BNDES, a Taxa de Longo Prazo (TLP), para a antiga Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que era fixada pelo governo. Se o banco captar recursos a taxas de mercado e emprestar esses recursos a um juro bem mais baixo, como era o caso da TJLP, essa diferença teria de ser suprida pelo Tesouro Nacional. A forma como se dará a transferência de recursos para essa estratégia de fortalecimento do banco de desenvolvimento também importa, disse o ex-BC.

Aloizio Mercadante, que assume oficialmente o comando do banco na segunda-feira, 6, afirmou nesta semana que há espaço para reduzir a taxa de juros cobrada pelo banco e que gostaria de fazer um projeto em conjunto com a Febraban. Segundo ele, o BNDES não precisa e não tem condições de receber subsídios do Tesouro. O petista disse que não há pretensão de voltar com a TJLP.

Abreu, diretor do BNDES, disse que um dos caminhos é combinar captações internacionais, a taxas mais baixas, com captações domésticas, onde os juros são mais altos. A utilização de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) também pode trazer a TLP para mais perto da taxa Selic.

Figueiredo afirmou que, quando o BNDES reduziu muito as atividades de financiamento para grandes empresas com dinheiro subsidiado, houve reflexo positivo sobre a política monetária. “Isso ajudou a ter um período maior com uma taxa de juros muito mais baixa”, disse.

Relatório

Em estudo publicado no Relatório de Inflação, em março de 2020, o BC indicou que a queda da participação dos recursos direcionados no Sistema Financeiro Nacional (SFN) tendia a aumentar a potência da política monetária. “Nos últimos anos, o crédito bancário passou por duas alterações que tendem a aumentar a potência da política monetária: maior participação do crédito com recursos livres no crédito total e mudança na taxa de juros utilizada nas concessões do BNDES. No mesmo sentido, atuou a alteração na forma de remuneração dos depósitos de poupança.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.