A companhia aérea Azul anunciou nesta quarta-feira, 28, que entrou com pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos, encerrando meses de incerteza durante os quais enfrentou pressão contínua devido ao seu alto endividamento, apesar das tentativas de reestruturação extrajudicial.

O anúncio fazia os ADRs da Azul listados nos EUA despencarem quase 30% antes da abertura dos mercados norte-americanos.

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O pedido, que deve colocar um freio em uma potencial fusão com a Gol, torna a companhia aérea a mais recente de uma série de empresas aéreas latino-americanas a enfrentar o processo de recuperação judicial após a pandemia.

“Tínhamos muitas dívidas no balanço, principalmente devido à Covid. Agora temos a oportunidade de limpar tudo”, disse o presidente-executivo da Azul, John Rodgerson, em entrevista à Reuters.

A Azul citou que firmou acordos com seus principais parceiros financeiros, incluindo os detentores de títulos de dívida existentes, a arrendadora de aeronaves AerCap e os parceiros estratégicos United Airlines e American Airlines, para apoiar a reestruturação.

O acordo inclui um compromisso de US$ 1,6 bilhão em financiamento ao longo do processo, a eliminação de mais de US$ 2 bilhões em dívidas e um adicional de até US$ 950 milhões em financiamento em equity, afirmou a Azul.

“Acreditamos que podemos entrar e sair antes do final do ano”, disse Rodgerson sobre o processo. “A saída às vezes é a parte mais difícil deste processo. Então, já estamos entrando com a saída em mente e com o financiamento garantido.”

A iniciativa da Azul segue os passos da Aeroméxico, da colombiana Avianca e de suas duas maiores rivais, Gol e LATAM Airlines, que buscaram recuperação judicial nos últimos anos devido a endividamentos elevados.

Desde o ano passado, a Azul tentava reestruturar seu balanço, tendo fechado um acordo com arrendadores de aeronaves para eliminar US$ 550 milhões em dívidas em troca de uma participação acionária de cerca de 20%, além de um acordo com os credores financeiros para levantar mais US$500 milhões.

Mas fatores como problemas na cadeia de suprimentos que atrasam entregas de aeronaves e planos de manutenção, e um real mais fraco ante o dólar, mantiveram a empresa sob forte pressão.

“O que eu costumava pagar em juros em 2019 aumentou 10 vezes com uma moeda 50% mais fraca”, disse Rodgerson.

A Azul afirmou ter garantido um compromisso de financiamento do tipo DIP de cerca de US$ 1,6 bilhão junto a certos parceiros financeiros, o que pagará parte da dívida existente e fornecerá cerca de US$ 670 milhões em capital novo para reforçar a liquidez.

Na conclusão da reestruturação, os recursos do empréstimo serão pagos com uma oferta de direitos de ações de até US$ 650 milhões, apoiada pelos parceiros financeiros e com um investimento adicional de até US$300 milhões por United American, acrescentou a companhia.

“A Companhia seguirá voando, operando normalmente e mantendo seus compromissos durante todo o período de restruturação”, afirmou, em nota, a Azul.

Dívida de R$ 35 bi

A Azul reportou ao final do primeiro trimestre uma dívida bruta de R$ 34,66 bilhões, um aumento de 42,2% em relação ao mesmo período do ano anterior, com um índice de alavancagem, medido pela relação dívida líquida/Ebitda, atingindo 5,2 vezes, ante 3,7 no ano anterior.

O impacto mais recente sofrido pela companhia aérea ocorreu no mês passado: um aumento de capital abaixo das expectativas que levantou R$1,66 bilhão ante um valor pretendido pela empresa de até R$4,11 bilhões.

As ações da Azul acumulam desvalorização de 65% até agora neste ano.

Agências como Fitch e S&P cortaram recentemente a classificação de crédito da Azul, com a última citando um elevado risco de inadimplência, já que a liquidez da empresa foi corroída em meio a “saídas de caixa significativas relacionadas a altas despesas financeiras e de arrendamento”.

A Azul afirmou que manterá suas operações e vendas normalmente durante o processo de recuperação judicial.

Fundada em 2008 pelo magnata da aviação David Neeleman, que também fundou a norte-americana JetBlue, a Azul domina o setor aéreo brasileiro juntamente com Gol e LATAM, detendo uma participação de mercado doméstico de cerca de 30%, segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

A Azul opera uma ampla frota que inclui aeronaves Airbus de corredor único e duplo, jatos regionais Embraer e turboélices ATR. A AerCap é sua maior arrendadora.

O pedido de recuperação judicial atinge os planos da Azul para uma potencial combinação de negócios com a rival Gol, que teria criado uma companhia aérea dominante no Brasil e chamada por Rodgerson no passado de “campeã nacional”.

O Grupo Abra, acionista controlador da Gol, e a Azul assinaram em janeiro um memorando de entendimento não vinculante para uma fusão das empresas.

A própria Gol está desde o início de 2024 sob recuperação judicial nos EUA, um processo que espera sair no próximo mês, depois que um tribunal aprovou seu plano de reestruturação na semana passada.