Estudo realizado na universidade de Edimburgo, no Reino Unido, e publicado no periódico Cell Reports Medicine aponta que a bactéria Mycobacterium leprae (ML) – responsável pela hanseníase – curiosamente pode ajudar na regeneração de órgãos, sobretudo no caso do fígado, e que poderia ser eventualmente aplicada em humanos caso sejam feitos maiores avanços.

“Usando o Mycobacterium leprae (ML) com capacidade natural de reprogramação celular parcial e seu animal hospedeiro tatu-galinha, apresentamos um modelo evolutivamente refinado de crescimento e regeneração do fígado adulto”, afirma o estudo, capitaneado por pelo cientista Samuel Hess.

Segundo os pesquisadores, a bactéria é capaz de reprogramar todo o fígado de tatus, aumentando a relação entre fígado e peso corporal, os lóbulos saudáveis e a proliferação de hepatócitos, células do fígado que são capazes de sintetizar proteína.

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“Os fígados infectados por ML são microarquiteturalmente e funcionalmente normais, sem danos, fibrose ou tumorigênese. A reprogramação induzida por bactérias reativa os genes do fígado e regula positivamente os marcadores associados ao crescimento, metabolismo e antienvelhecimento”, diz o estudo.

Para os pesquisadores, essa capacidade pode levar a uma para regeneração do fígado de forma eficaz e segura, o que pode ter amplas implicações terapêuticas, incluindo o possível rejuvenescimento de outros órgãos.

Esquema da atuação da ML no fígado de tatus

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Uso em humanos

Apesar de os testes terem sido realizados em tatus, os cientistas têm esperanças que um tratamento com a ML possa ser desenvolvido para ajudar também humanos. De acordo com dados do estudo, doenças relacionadas ao fígado são responsáveis por 2 milhões de morte por ano globalmente.

Os cientistas, no entanto, permanecem cautelosos, afirmando que são necessários avanços mais significativos para uma eventual terapia em humanos. “Embora seja um candidato principal para terapias regenerativas, nenhum ensaio usando células-tronco cultivadas em laboratório para o tratamento de cirrose rendeu qualquer terapia licenciada. Modelos 2D, 3D e in vitro mostraram avanços, mas sua aplicação clínica em grandes órgãos sólidos é limitada. Além disso, o conhecimento atual da regeneração hepática in vivo é derivado de lesões de roedores de curta duração ou modelos de hepatectomia”, diz o estudo, apontando algumas limitações que os pesquisadores precisam superar.

Apesar disso, a descoberta inesperada pode levar a uma maior compreensão sobre os mecanismos responsáveis pela regeneração de órgãos, tanto em humanos como em nível celular.

“O crescimento induzido por lesão ou hepatectomia cessa quando o tamanho original do fígado é atingido, mas o mecanismo que interrompe a resposta regenerativa é desconhecido. A capacidade de contornar essa restrição de limite superior permitiria que os mecanismos de regeneração fossem estudados sem lesão prévia ou perda celular. Nossas descobertas mostram que a ML envolve vias hepáticas regenerativas endógenas, estimulando o crescimento de órgãos in vivo, mantendo intacta a arquitetura, os sistemas vasculares e a funcionalidade. Embora inesperado e não convencional, este modelo in vivo refinado evolutivamente pode avançar nossa compreensão da maquinaria regenerativa nativa e determinar como ela pode ser ativada de novo para permitir novas estratégias de regeneração de órgãos para uso clínico potencial, um avanço conceitual com implicações mais amplas na medicina regenerativa”, conclui o estudo.