Se o desempenho do Brasil no comércio internacional fosse tema de debate de grupos de amigos no WhatsApp, poderia se dizer que a balança comercial fez o L no primeiro semestre deste ano. Um inusitado alinhamento dos astros econômicos — com alta das exportações e baixa das importações, em um ambiente de dólar em queda — tem favorecido o Brasil no cenário global nos últimos meses, com números recordes.

A queda da moeda americana, acumulada em 9,27% na primeira metade do ano, não impediu que as exportações atingissem US$ 165,7 bilhões de janeiro a junho, variação de 1% sobre o mesmo período do ano passado, segundo a Carta de Conjuntura do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Mas este 1% não é o mais que chama a atenção.

Como as importações somaram US$ 120,6 bilhões (queda de 7,1% em relação ao mesmo período do ano anterior), o saldo da balança comercial ficou em US$ 45,1 bilhões, alta de 31% em relação ao mesmo período do ano anterior. Só em junho, com exportações de US$ 30,1 bilhões e importações de US$ 22 bilhões, o superávit da balança alcançou US$ 10,6 bilhões, valor recorde para o mês em toda a série histórica, iniciada em 1997.

O Brasil tem conseguido melhorar sua performance na corrente internacional de comércio apesar da forte volatilidade do dólar

O principal motor da performance do País mundo afora continua sendo o agro. No primeiro semestre, a soja respondeu por 20% de tudo que o Brasil embarcou para o exterior. Logo em seguida vieram petróleo e seus derivados (11,3%) e minério de ferro (8,2%). Já os principais produtos importados foram óleos combustíveis de petróleo (7,1%) e fertilizantes (5,8%).

Mesmo nos produtos de maior valor agregado, de softwares a aviões, o cenário é positivo. A Embraer é um exemplo. Depois de uma alta de 12,7% no ano passado, a empresa espera aquecimento ainda maior das exportações neste ano. Em seu anúncio de resultados, a companhia afirmou esperar que a receita líquida fique entre US$ 5,2 bilhões e US$ 5,7 bilhões em 2023, o que representaria crescimento de até 27%.

Ao longo de 2023, a Embraer deverá entregar de 65 a 70 jatos, contra 57 no ano passado, enquanto as vendas também devem apresentar forte desempenho, já que a demanda por viagens tem se recuperado da pandemia. A companhia espera restaurar a carteira de pedidos ao nível anterior a 2020.

Empresas exportadoras sentiram menos a volatilidade do dólar pela percepção de menor risco

Na avaliação da pesquisadora Andreza Aparecida Palma, da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas (Dimac), do Ipea, o desempenho das companhias exportadoras não foi prejudicado pela volatilidade do câmbio em função da percepção de menor risco.

O mesmo vale para empresas do agronegócio. O valor máximo do dólar neste ano foi em 4 de janeiro (R$ 5,45) e a cotação mais baixa foi em 26 de junho (R$ 4,77). “Pode parecer uma volatilidade forte, mas a percepção de risco, que exerce influência sobre a taxa de câmbio, também mostra trajetória mais favorável.”

US$ 45,1 bilhões
foi o saldo da balança comercial no primeiro semestre, alta de 31% sobre o mesmo período de 2022

20%
de tudo que o País exportou neste ano foi soja, consolidando o agro como a locomotiva do comércio brasileiro

A sensação de que a maré está mais positiva para o Brasil é o que explica boa parte do fortalecimento do real frente ao dólar, na visão do economista Alexandre Viotto, head de banking da EQI Investimentos.

“Até o gringo que andava sumido resolveu voltar.”
Alexandre Viotto, da EQI Investimentos

Fatores como o Arcabouço Fiscal e o PIB resiliente fazem, segundo ele, com que o País siga como uma das estrelas do mundo emergente em 2023. “Agora temos fatores externos ajudando também nesse processo. Nas cenas dos próximos capítulos, temos boas possibilidades de melhora do rating brasileiro por alguma agência de classificação.”

A força da balança comercial e a trajetória de valorização do real se dão até com o cenário hostil no ambiente internacional. Segundo Marianna Costa, economista-chefe do TC, mesmo com a persistência das incertezas externas atualmente, o horizonte é positivo.

“Arcabouço Fiscal, Reforma Tributária, melhor dinamismo da atividade econômica no início de 2023 e arrefecimento da dinâmica de preços medida pela inflação ao consumidor criam um cenário benigno”, disse.