31/08/2001 - 7:00
Os grandes bancos de varejo não precisam mais tomar o caminho da roça para levar os serviços financeiros ao interior do País. Uma onda de instituições caipiras, nascidas nos pólos de desenvolvimento fora das capitais, surgiu na metade da década de 90 e ganha força para entrar no século 21 como dona dos mercados regionais. Onde há uma economia forte, há um banquinho ? geralmente pequeno, mas invariavelmente mais lucrativo que os gigantes. O grupo dos caipiras teve no ano passado uma rentabilidade acima dos 20% em relação ao patrimônio, segundo a ABM Consultoria, enquanto os grandes ficaram na faixa dos 17%. As razões para o sucesso dessas instituições, como o BRP, de Ribeirão Preto, ou o Tribanco, de Uberlândia, vem de características que só as casas do Interior podem ter. Com raízes fincadas em sua região de nascença, elas conhecem de perto seus clientes e sabem fazer negócio com eles.
O alvo, em todos os casos, é o mesmo: as pequenas e médias empresas das cidades do Interior, sedentas por crédito para expandir suas operações, mas esquecidas pelos bancos de rede e de investimento. Esse nicho, conhecido como middle market (mercado do meio), tem custos altos e muita burocracia para operações proporcionalmente pequenas, e os riscos de calote são difíceis de se avaliar. ?Nós temos segurança para emprestar R$ 500 mil a gente que não consegue levantar R$ 100 mil em bancos grandes. Conhecemos as pessoas há anos?, explica Paulo Renato Costa e Silva, gerente financeiro do banco Porto Real, de Resende, base do mais recente surto de industrialização no Vale do Paraíba, no Estado do Rio. Nos Estados Unidos, bancos assim crescem como mato. São mais de 9 mil. Na Itália são 700, em Portugal, 200. Tanto aqui como no exterior são instituições que vivem de crédito, diferentes dos gigantes das metrópoles, que tiram seus lucros de tarifas de serviço e da venda cruzada de outros produtos. O BNDES descobriu essa vocação dos pequeninos e adotou sua rede como caminho de distribuição. O repasse de linhas para a compra de máquinas e equipamentos agrícolas disparou.
A mais bem-sucedida instituição do Interior é o Tribanco, de Uberlândia, Minas Gerais, que herdou a clientela do grupo que integra, o atacadista Martins. Ele tem 185 mil fregueses entre os varejistas de todo o Brasil, e abriu as portas deles para seu banco. Ele possui 100 mil operações em carteira e um ativo total de R$ 330 milhões. Sua estrutura é pequena para uma operação tão vasta, com apenas 200 pessoas, mas a força do grupo Martins, com 4.200 vendedores, vira o jogo a seu favor. ?Vivemos dentro do negócio de nossos clientes. Sabemos o que eles precisam?, diz Kimitaka Iwamoto, diretor de planejamento do Tribanco, que atingiu uma rentabilidade de altíssimos 22,5% em 2000.
?Esses bancos localizados são leves porque dispõem da estrutura dos grupos acionistas?, resume o economista Alberto Borges Matias, da ABM. ?E os controladores abrem as portas para o crédito aos pequenos comerciantes, que formam a clientela mais rentável?. É também o nicho onde o risco de crédito é maior. Mas nenhum desses bancos sofre com ele, porque jamais se aventura além da área que conhece como a palma da mão. O Banco Ribeirão Preto (BRP), do grupo atacadista Coselli, fez questão de reforçar até no nome a ligação com a sua área de atuação. Ele tem 40% dos ativos em empréstimos para empresas do setor agroindustrial, num raio de 500 quilômetros em torno de sua sede. ?Só nós sabemos lidar com esse público. Os grandes bancos investem sobre ele, mas depois desistem?, diz o diretor-executivo do banco, Nelson Rocha.
A fraqueza dos regionais está no varejo, onde é necessário investir pesadamente em estrutura. O BRP, nessa área, ousa apenas a emissão de um cartão de crédito com bandeira local, que distribui fundos para atividades culturais na região. Idéia semelhante à do Tribanco, que tem um cartão para seus varejistas credenciados, o Super Compras. Os que se arriscaram no varejo não gostaram da experiência. O Banco Interior, de São José do Rio Preto, quebrou por falta de fôlego para competir com os grandes. O Porto Real, de Resende, chegou a ter 18 agências, mas abandonou o projeto quando descobriu, há dois anos, que os lucros obtidos com o crédito estavam subsidiando as perdas no varejo. O banco, pertencente ao grupo que engarrafa e distribui Coca-Cola na região do Vale do Paraíba, preferiu ficar atendendo apenas os supermercadistas e donos de mercearias da região. Essa clientela deu suporte para o banco no início, em 1992, e ganhou a companhia de fornecedores das grandes indústrias da região, como CSN, Volkswagen e Peugeot. É para eles que o banco vai se voltar. ?Devolvemos a carta de
banco comercial. Seremos agora um banco de investimento?, sintetiza Costa e Silva.
Regras, porém, existem para ser quebradas. Uma exceção à lei de que varejo é para os grandes é o Finansinos, de Novo Hamburgo, no pólo calçadista do Rio Grande do Sul, que existe há 35 anos. ?A concorrência pode dar taxa melhor, mas sempre empurra outros produtos para o cliente, aumentando o preço total. Nós não?, argumenta o diretor de relações com investidores, Roberto Cardoso. A burocracia na aprovação de crédito é pouquíssima, graças à estrutura pequena, de 32 funcionários, e os clientes podem entrar sede adentro e discutir o processo diretamente com os diretores. Esses estilo interiorano leva à instituição mais de R$ 100 mil em contratos por dia, uma média que garantiu um lucro de R$ 1,15 milhão no primeiro semestre. Pouco? ?Esse é o nosso tamanho. Fica difícil manter uma estrutura acima disso?, diz Cardoso.