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“Um empresário como Emílio Odebrecht tem perfil para ser dono de cassino”

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“Las Vegas oferece 800 mil empregos, recebe 37 milhões de turistas e aplica bem seus impostos”


 

 

DINHEIRO ? Defender a legalização dos cassinos no Brasil é como pregar no deserto?
CIRO BATELLI ? Se essa luta resultar em algo pelo menos próximo ao que Las Vegas se transformou em pleno deserto, terá valido a pena. Lá, os cassinos criaram 800 mil empregos diretos e indiretos nos últimos 35 anos. A cidade recebeu no ano passado 37 milhões de visitantes, enquanto o Brasil inteiro hospedou não mais do que 4 milhões e meio. As gorjetas que os funcionários recebem dos jogadores chegam a melhorar seus salários em até 300 por cento. Os impostos sobre os lucros são aplicados em Educação e Saúde, o que aponta para um ganho de toda a coletividade.

DINHEIRO ? Mas por aqui a discussão sobre a legalização dos cassinos nunca chega a uma definição.
BATELLI ? O problema é que não temos nenhum bom projeto no Congresso. O Brasil tem de voltar a debater os cassinos porque isso significa divisas, empregos e um super estímulo ao setor de turismo, essa vocação nacional que ainda não se realizou em todo os seu potencial. Há muito apartamento vazio por aí.

DINHEIRO ? Não pode ser, simplesmente, que o Brasil rejeite os cassinos e ponto final?
BATELLI ? Não. O brasileiro adora jogar. A roleta parou de girar legalmente no Brasil em abril de 1946, por ordem do presidente [Eurico Gaspar] Dutra, mas a verdade é que, na prática, ela nunca parou. Calculo que hajam pelo menos uns 40 cassinos clandestinos em operação no País. A rejeição aos cassinos, que eu saiba, está encastelada na Caixa Econômica Federal.

DINHEIRO ? Por que?
BATELLI ? Porque a Caixa extrapolou seus próprios limites, que são os de fornecer serviços bancários aos seus clientes, para administrar todo o jogo legalizado. As loterias federais da Caixa movimentaram no ano passado 4 bilhões e duzentos milhões de reais. Para ela, não há porque tirar uma ficha do lugar. O que posso garantir é que os cassinos dificilmente tirariam clientes das loterias, porque as atividades são muito diferentes. Na loteria, o agente é passivo, enquanto diante de uma roleta ou na mesa de bacará ele interage.

DINHEIRO ? Qual é o seu modelo para a legalização dos cassinos?
BATELLI ? Não defendo salas de jogos, mas hotéis-cassino. O primeiro passo é instituir uma comissão nacional de jogo, com representantes da sociedade, nos moldes da que existe nos Estados Unidos. Essa comissão determinaria um valor mínimo de investimento para quem quisesse fazer um desses empreendimentos. Digamos, um mínimo de 20 milhões de dólares. Outro ponto seria exigir uma ficha limpa pregressa de 20 anos na Justiça de todos os candidatos a implantar ou trabalhar em alguma modalidade de jogo. Essa seleção evitaria escândalos e daria transparência e credibilidade ao negócio desde o primeiro dia.

DINHEIRO ? Mas há muitas histórias, nos Estados Unidos, de ligações da máfia com os cassinos.
BATELLI ? Isso ocorreu até meados dos anos 60. A máfia se aproveitou, desde a década de 1930, da falta de uma legislação rigorosa, agiu e ganhou dinheiro. Com a regulamentação do jogo, e pesadas punições para os que se comportam mal dentro dessa indústria, os investidores dos grandes cassinos passaram a ser instituições financeiras como o Bank of America e fundos de pensão como o dos professores da Califórnia. O jogou ficou limpo e ganhou credibilidade, o maior patrimônio de qualquer cassino.

DINHEIRO ? Totalmente? E as máquinas caça-níqueis, que gostam de tomar as economias das senhoras mais velhas.
BATELLI ? Absolutamente. Nos Estados Unidos, essas máquinas não podem sair de fábrica com retenção superior a 15%. Elas têm de distribuir, no mínimo, pelo menos 85% de tudo o que coletam. Em Las Vegas, o índice de retenção é de apenas 6%.

DINHEIRO ? Assim o lucro fica pequeno.
BATELLI ? Mas há ganho em credibilidade. Em que lugar do mundo um sujeito chega com 5 mil dólares e troca esse dinheiro por uma ficha de plástico que custa um dólar e quarenta? Só mesmo em cassinos, porque ele sabe que aquele plástico vale o dinheiro. Ou alguém já viu algum banqueiro passar cheque sem fundo ou enganar algum jogador?

DINHEIRO ? Há muitas dessas histórias por aí.
BATELLI ? As que eu conheço mostram o jogador querendo enganar a banca. Esse é o tipo de crime que mais ocorre nos cassinos, e não o contrário. O banqueiro de jogo é o melhor banqueiro do mundo, porque não cobra juros, dá crédito e, para receber, procura te agradar com boa música, boa comida e muita diversão. Qual banqueiro de banco faz isso? Que eu conheça, nenhum. O bom banqueiro é o do jogo.

DINHEIRO ? Quem tem cacife para implantar cassinos no Brasil?
BATELLI ? Tenho a sensação de que um empreendedor como Emílio Odebrecht não deixaria passar a oportunidade de construir um hotel maravilhoso e associá-lo a um cassino. Ele tem esse perfil arrojado. Não conheço nenhum pronunciamento da família Diniz a respeito, mas um empresário como Abílio Diniz seria muito bem vindo ao negócio. Ele é trabalhador, inteligente e tem o Midas Touch, o que toca vira ouro. Além disso, as possibilidades de joint ventures seriam muitas. O grupo MGM Mirage comprou a rede Caesar por 5 bilhões de dólares. Será que eles não teriam interesse num negócio nascente aqui no Brasil? Eu acho que sim.

DINHEIRO ? Onde os cassinos deveriam ficar?
BATELLI ? No exato lugar em que o empreendedor desejar. O dinheiro é dele, não deve haver travas. Sou conta limitações de região aos hotéis-cassino. Quem é um funcionário público de 2 mil reais por mês para dizer onde um empreendimento de 20 milhões de dólares deve se localizar? É alguém que quer ser corrompido. Por isso, o mapeamento de onde pode e onde não pode tem de ser deixado de lado.

DINHEIRO ? Como seria a tributação?
BATELLI ? O melhor modelo, outra vez, é o americano. Alguém já ouviu falar de algum cassino francês famoso? Não, porque lá o imposto é de 60% sobre o lucro, o que torna o negócio pouco atraente. Na América, a alíquota máxima é 8%. Em Las Vegas, 6,5%. Isso sobre o lucro, fora o imposto de renda. Com esse estímulo, apenas em Vegas existem 95 cassinos e 25 Estados permitem as suas atividades.

DINHEIRO ? Muita gente acredita que poderia haver uma proliferação de cassinos.
BATELLI ? E qual seria o problema? Quanto mais, mais impostos para o governo investir em Saúde e Educação. Hoje, além dos 5,2 bilhões de reais que os brasileiros jogaram em loterias no ano passado, outros 6 bilhões foram gastos em caça-níqueis e vídeo-bingos e mais 4 bilhões em salas de bingos. Cabe lembrar que essas atividades não são regulamentadas, e nelas o brasileiro jogou 10 bilhões de reais no ano passado. Uma comissão nacional de jogos tem de ser implantada com urgência para que pendências como essas sejam resolvidas.

DINHEIRO ? O sr. é um bom jogador?
BATELLI ? Não sei, porque eu não jogo de jeito nenhum esses jogos bancados, como roleta e bacará. Também não quero obrigar ninguém a jogar. Afinal, o jogo é um vício.

DINHEIRO ? Isso não é contraditório para quem defende a abertura de cassinos no Brasil?
BATELLI ? Não, porque eu não faço propaganda do jogo. O que eu quero é chamar atenção para a importância econômico-financeiro dos cassinos. Ali há shows artísticos, há restaurantes, há hotelaria de alto padrão e inclusive há, sim, o jogo, um elemento a mais, porém importantíssimo. Queiramos ou não, ninguém vai acabar com o jogo. Eu trabalho para que o País pare de perder bilhões em divisas todos os anos. Nós, na prática, sustentamos os cassinos da América Latina. Oitenta por cento dos frequentadores dos cassinos de Punta del Este, no Uruguai, são brasileiros. Só este ano, eles já movimentaram lá 17 milhões de dólares. Por que não queremos esse dinheiro aqui?

DINHEIRO ? Porque muitos acreditam que os cassinos provocam efeitos colaterais como prostituição e crime.
BATELLI ? Isso é coisa de quem não conhece cassino. O mundo lá dentro é de luzes, alegria e emoção. Não tem nada a ver com esses esteriótipos de Holywood. Com investimento correto dos impostos arrecadados com o jogo, o efeito pode ser contrário a esse de aumento de criminalidade e prostituição, por exemplo. Há, dentro de um cassino, entre 80 e 85 atividades profissionais diferentes, o que significa que eles podem oferecer empregos para gente com diferentes qualificações, da mais humilde à capacitada.

DINHEIRO ? Como se reconhece um viciado em jogo?
BATELLI ? É o sujeito que a mulher chama para voltar ao quarto, ele diz que já vai e fica 48 horas na mesa. O viciado é o que dedica tempo demais ao jogo, não aquele que perde muito.

DINHEIRO ? E um bom jogador?
BATELLI ? É o que sabe vencer sem euforia e perder com elegância. Em Las Vegas, um dos jogadores mais famosos é o magnata australiano de mídia Kerry Parker. Ele é conhecido por dar as melhores gorjetas da cidade. O jogo dele é o Black Jack, de cartas. Sempre joga numa sala separada, com sete spots nos quais aposta 50 mil dólares em cada um. Já o vi ganhar 10 milhões de dólares e deixar 625 mil dólares de caixinha. Também estava lá quando ele perdeu dois milhões, duzentos e cincoenta mil dólares e fez um cheque de dois milhões e meio. Deu duzentos e cincoenta mil dólares de gorjeta para mostrar que, assim como na vitória, estava igualmente satisfeito com o tratamento recebido e seu momento de diversão.

DINHEIRO ? Como acreditar nos cassinos se, no final, a banca sempre ganha?
BATELLI ? É verdade, a banca sempre ganha, mas o jogador detém o limite do que pode ou não pode perder. O cassino quer que você caia em tentação, mas a decisão final será sempre sua. É uma disputa justa, na qual o jogador pode sair ganhando se tiver bom senso e equilíbrio.

DINHEIRO ? Qual o seu conselho para quem quer se dar bem num cassino?
BATELLI ? Se a idéia é sair com uma pequena fortuna, basta entrar lá com uma grande fortuna.