O nome do banqueiro Ageo Silva nunca apareceu numa coluna social. Ele não compra ternos Ermenegildo Zegna e jamais será visto tomando champanhe no Jockey Clube. Seu estilo é o da discrição máxima. Em vez de se dirigir ao interlocutor com a empolgação ensaiada dos homens de negócios ? que descrevem sua barraca de cachorro quente como se fosse a semente de um novo McDonald?s ? ele fala mansamente, como quem toma um cafezinho no final da tarde. Vice-presidente do Bradesco, vice-presidente da Febraban e membro do conselho da Cetip (Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos), ele tem uma carga de trabalho suficiente para alegar que não tem tempo para um hobby. Mas, depois de seu triplo expediente, Silva pode ser visto num ambiente que poucos de seus pares do mundo financeiro freqüentam. Toda quinta-feira à noite, quando a cidade de São Paulo dá início ao turno oficial da badalação, ele pode ser encontrado com a Bíblia debaixo do braço, pregando a palavra de Deus. Sua audiência, os 900 fiéis da Igreja Evangélica da Vila Yara, em Osasco, região metropolitana da capital paulista. Formado em direito e contabilidade, Silva também é pastor evangélico e lidera um rebanho de 8 mil pessoas em vários países.

?Desde muito jovem senti minha vocação para ser pastor?, conta o banqueiro. Antes de abraçar a carreira religiosa, porém, ele começou a trabalhar no banco ? como contínuo, aos 14 anos. Quem lhe abriu as portas foi o presidente, Amador Aguiar, também um evangélico fervoroso. O chamado definitivo veio em 1972, quando Silva era ainda gerente de área. Um grupo de quarenta dissidentes da Igreja Presbiteriana Independente reuniu-se para fundar uma nova denominação, batizada simplesmente de ?Igreja Evangélica?. Silva não diz qual o motivo do desentendimento, mas pessoas que acompanharam o processo, na época, lembram que a corrente original parecia mais preocupada com política do que com assuntos espirituais. Os dissidentes construíram a nova sede apenas com o dinheiro do dízimo e muita boa vontade. ?Eu ajudei a rebocar aquelas paredes?, recorda o pastor, apontando para a estrutura que sustenta o anfiteatro. Aos poucos, o grupo fez uma ampliação aqui, outra ali. Hoje a obra inclui um templo com 900 lugares e um prédio de 10 andares ? os 15 anos de construção consumiram algo como US$ 2,8 milhões. A Igreja Evangélica, embora relativamente jovem, conta com 35 templos no Brasil e no exterior. Somente em Moçambique a igreja sustenta 13 unidades, com 1.500 fiéis. Em Portugal são duas sedes.

Batismo coletivo. A sede da igreja em Osasco vive permanentemente cheia. Além dos fiéis, há um movimento incessante de moradores da região, que freqüentam o prédio em busca de auxílio. Há ali desde uma creche e uma escola de ensino fundamental até uma central de empregos e dentistas que atendem moradores carentes. Psicólogos, fonoaudiólogos e um especialista em dependência química completam a lista de serviços. Para sustentar toda essa estrutura, Silva é obrigado a maximizar suas habilidades administrativas. Para comprar os equipamentos dos dentistas, por exemplo, ele não se acanhou de pedir contribuições a seus colegas do banco. Silva, que nasceu e foi criado em Vila Yara, acha que auxiliar o ?rebanho? na vida cotidiana é uma função tão importante quanto a espiritual. ?Eu já vi como uma boa orientação pode tirar crianças da marginalidade?, diz. Uma vez por mês, Silva reúne a comunidade para batismos coletivos, realizados num tanque com água aquecida (?para não assustar os fiéis?). Ele já perdeu a conta dos casamentos e batismos que celebrou. Cultos, ele comanda ao menos dois por semana. Chega ao templo carregando uma das Bíblias de sua coleção ? que conta com dezenas de exemplares, adquiridos ou dados pelos amigos ? e sobe ao púlpito. De microfone em punho, ele se transfigura. Fala com uma veemência que em nada lembra o executivo de fala mansa, e canta os hinos com fervor, acompanhado por uma banda, como nas igrejas americanas. Ao final da cerimônia, com a Bíblia debaixo do braço, vai à porta cumprimentar os fiéis. ?Eu adoro o que eu faço. Sou um servo de Deus?, resume. Dentro de seis anos, Silva
deverá servir em tempo integral. Ao completar 65 anos, ele terá aposentadoria compulsória no banco ? e poderá passar o tempo livre com seu rebanho.