O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) decidiu aumentar a taxa básica de juros em 1 ponto percentual (p.p.), o que eleva a Selic a 14,25% ao ano, maior patamar em oito anos. A Selic esteve em 14,25% pela última vez em 2016, quando permaneceu nesse patamar até outubro em meio a uma crise econômica e ao processo de impeachment da então presidente Dilma Rousseff.

A decisão foi unânime entre os membros do Copom e vem em linha com o esperado pelo mercado.

No comunicado, o Copom cita que o ambiente externo “permanece desafiador em função da conjuntura e da política econômica nos Estados Unidos, principalmente pela incerteza acerca de sua política comercial e de seus efeitos”.

Alison Correia, analista de investimentos e co-fundador da Dom Investimentos, avalia que o comunicado veio em tom mais duro e destaca o fato de que o documento já começa destacando a preocupação com o cenário americano. “Talvez, dependendo das medidas do Donald Trump, a possibilidade de lá enfrentar um processo inflacionário e que isso possa se espalhar”.

O Comitê também aponta o cenário doméstico, destacando que o conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho têm apresentado dinamismo. Nesse cenário, cita especialmente a inflação, que se mantém acima da meta “e novamente apresentaram elevação nas divulgações mais recentes”, afirmam.

Na visão do CFO do EntrePay, Márcio Saito, apesar de a decisão pelo aumento já ser aguardada pelo mercado, os juros mais altos “adicionam mais um entrave à atividade econômica”.

“Esse cenário reduzindo o poder de consumo da população e impactando setores como varejo e serviços, que dependem diretamente do crédito para girar suas operações. Para os pequenos empresários, o desafio cresce ainda mais. Com juros mais altos, o custo de linhas de financiamento sobe, reduzindo a margem de manobra dos empreendedores e exigindo uma gestão financeira ainda mais criteriosa”, aponta Saito.

Já Marcelo Bolzan, planejador financeiro e sócio da The Hill Capital, destaca o fato de, além da decisão unânime, da indicação de que na próxima reunião o aumento ser de menor magnitude. “Eles tinham a possibilidade de deixarem em aberto, já que a próxima reunião só vai acontecer em maio. Ainda assim, trouxeram todos os balanços de risco que o Banco Central enxerga. Vejo com bons olhos essa sinalização de que vai, sim, continuar aumentando os juros, mas com uma magnitude menor”.

Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master, também destaca a indicação (ou guidance) do comunicado sobre a próxima reunião.

“Agora, não se comprometem com o ritmo. Pode ser mais alto, mas uma alta de 0,25, 0,50 ou 0,75, são três possíveis altas que estariam de acordo com essa magnitude menor, então certamente não vai ser 1%. Então acho que a porta está aberta para essas três possibilidades na próxima reunião”

Para a diretoria do BC, o cenário mais recente é marcado por desancoragem adicional das expectativas de inflação, projeções elevadas para os preços à frente, resiliência na atividade e pressões no mercado de trabalho, o que exige uma política monetária mais contracionista.

“O conjunto dos indicadores de atividade econômica e do mercado de trabalho tem apresentado dinamismo, ainda que sinais sugiram uma incipiente moderação no crescimento”, apontou o colegiado.

Em elemento considerado determinante para o recuo da inflação, alguns indicadores da economia brasileira deram sinais de arrefecimento, como serviços e indústria, mas o presidente da autarquia, Gabriel Galípolo, tem pregado cautela na análise, pedindo tempo para que haja clareza sobre uma eventual tendência de desaceleração.

No documento, o Copom não fez alterações em seu balanço de riscos para a inflação, mantendo a avaliação de que há uma assimetria altista para o cenário à frente.

BC reduz projeção de inflação

Desde a última reunião do Copom, as expectativas de mercado para os preços à frente seguiram desancoradas, fator tratado com preocupação pela autarquia, com a previsão para o IPCA de 2025 no boletim Focus passando de 5,50% antes do Copom de janeiro para 5,66% nesta semana. Para 2026, foco do horizonte relevante de atuação do BC, as expectativas passaram de 4,22% para 4,48%.

O BC, no entanto, melhorou ligeiramente nesta quarta suas projeções de inflação em relação a janeiro, com estimativas passando de 5,2% para 5,1% em 2025, considerando o cenário de referência, que segue projeções de mercado para os juros. Para o terceiro trimestre de 2026, atual horizonte relevante, a projeção passou de 4,0% para 3,9%.

Para fazer as projeções do cenário de referência divulgadas nesta quarta, o Copom considerou uma taxa de câmbio que parte de 5,80 reais, abaixo dos 6,00 reais usados na reunião de janeiro.

O centro da meta contínua para a inflação neste e nos próximos anos é de 3%, sempre com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos.

A decisão desta quarta veio em linha com a expectativa de mercado captada em pesquisa da Reuters, na qual todos os 37 economistas entrevistados projetavam que o BC elevaria a Selic em 1 ponto.

Mais cedo nesta quarta-feira, o banco central dos Estados Unidos manteve a taxa básica de juros inalterada na faixa de 4,25% a 4,50%, com suas autoridades indicando que ainda preveem uma redução de 0,50 ponto da taxa até o final do ano, embora citem maiores incertezas.

Em meio ao processo de alta em tarifas de importação pelo governo Donald Trump nos Estados Unidos e dúvidas sobre os próximos passos da guerra comercial e seus impactos, o BC afirmou no comunicado que o ambiente externo permanece desafiador, citando incerteza acerca da política comercial dos EUA.

Em relação às contas públicas, o BC disse que segue acompanhando com atenção como os desenvolvimentos da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros.

“A percepção dos agentes econômicos sobre o regime fiscal e a sustentabilidade da dívida segue impactando, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes”, disse.

Medidas de contenção de gastos propostas pelo governo — e consideradas insuficientes por analistas para estabilizar a dívida pública — foram aprovadas parcialmente no fim de 2024 pelo Congresso, que também tem imposto dificuldades para a votação do Orçamento deste ano, até o momento não aprovado.