Por Marcela Ayres

BRASÍLIA (Reuters) – O Banco Central prevê alívio no mercado de câmbio no ano que vem após o fim da demanda por dólares em função da desmontagem de overhedge pelos bancos e finalização do processo de redução de endividamento externo das empresas, mas está pronto para atuar caso entenda ser necessário, afirmou nesta quinta-feira o diretor de Política Monetária da autarquia, Bruno Serra.

Em evento promovido pelo BTG Pactual nesta quinta-feira, ele reconheceu que os temores fiscais afetam o comportamento do dólar frente ao real, com uma discussão “dura” sobre a necessidade de mais gastos públicos numa realidade de “cobertor curto” após a crise de Covid-19.

“Politicamente não é fácil, as pressões são grandes, então isso também mantém uma incerteza no horizonte e que pressiona o câmbio”, afirmou.

Mas Serra buscou reforçar que tanto o desmonte do overhedge quanto a redução do endividamento externo de algumas empresas de setores específicos –que provoca um descolamento considerado relevante entre contratação de câmbio comercial e o saldo comercial– são fatores que se encaminham para o fim. Por isso, “tendem a aliviar bastante mercado de câmbio” já a partir do ano que vem.

“Quando a gente soma esses montantes, a gente está falando de 70, 80 bilhões de dólares num horizonte de 18 meses”, afirmou.

“É muita coisa, é muito dólar. O Banco Central interveio na outra ponta nos momentos em que o mercado mostrou disfuncionalidade, mas o mercado falou o preço”, completou.

O diretor disse ser natural que, nesse contexto, haja pressão sobre o câmbio. Ele pontuou que, somente pela questão do overhedge, a demanda esperada para o fim deste ano será de 17,6 bilhões de dólares.

“Acho que esses dois fatores a partir de 2022 vão ser mais história do que vão estar presentes no mercado. E eu espero um mercado muito mais líquido, funcionando com fluxos mais equilibrados em 2022”, afirmou. “Sou bastante mais positivo para 2022.”

Ainda assim, ele frisou que se o BC precisar atuar isso será feito. “A gente está pronto”, afirmou ele, mencionando os 370 bilhões de dólares em reservas internacionais detidas pelo país, patamar classificado por ele como “bastante bom” quando olhado como percentual do Produto Interno Bruto (PIB).

Ainda sobre o câmbio, Serra afirmou que o BC não vê evidências de acumulação de caixa pelas empresas no exterior como uma variável impactando a dinâmica do câmbio no país.

“Não identificamos nenhuma sobra relevante que esteja sendo acumulada no exterior”, disse.

Por outro lado, ele reconheceu que a queda pronunciada da Selic em meio à pandemia de coronavírus teve impacto sobre o câmbio, o que disse ser esperado. A taxa básica chegou à mínima histórica de 2% ao ano, nível que vigorou até março, quando o BC iniciou o ciclo de aperto monetário.

Atualmente, a Selic está em 6,25% ao ano e o BC tem comunicado que deverá elevá-la novamente em 1 ponto percentual em sua próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), no fim deste mês.

“Desde o início deste ano tem ocorrido um ajuste muito importante desse diferencial de juros ajustado ao risco” disse Serra.

“O câmbio tem reagido de fato mais devagar do que se imaginava, mas não dá para dizer que quebrou essa relação”, complementou.

HORIZONTE RELEVANTE

Sobre a política monetária, Serra repetiu que o BC está comprometido e tem instrumentos para trazer a inflação para meta ainda em 2022, descartando uma convergência mais demorada para essa ancoragem.

“Todas as decisões que têm pautado o comitê nesses últimos meses, em particular de março para cá, têm sido com essa visão”, disse.

Pelo seu cenário básico, o BC vê a inflação no próximo ano apenas ligeiramente acima da meta: 3,7% contra alvo central de 3,5%. Já o mercado é mais pessimista e projeta IPCA de 4,14% no ano que vem, segundo o boletim Focus mais recente.

Em meio a questionamentos de agentes econômicos sobre o papel da inércia na inflação do ano que vem, Serra disse ser natural que esse componente seja maior para 2022 do que foi para 2021, mas ressaltou que isso já “está na conta da forma como tem que estar”.

“Não compro muito argumento que temos cenário mais difícil para o lado de inércia para 22”, disse.

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