O governo brasileiro deve conceder R$ 903 bilhões em benefícios fiscais em 2026 a diferentes setores da economia nacional. Mais do que abrir mão dessa receita em nome de outras vantagens, como geração de emprego e desenvolvimento tecnológico, quase R$ 620 bilhões do total dos benefícios fiscais projetados para o próximo ano são considerados privilégios tributários.

As conclusões fazem parte de um diagnóstico feito pela Unafisco Nacional (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil), divulgado nesta sexta-feira, 19. O estudo leva em consideração as regras estabelecidas pela Constituição Federal, incorporando benefícios que sequer aparecem no Demonstrativo de Gastos Tributários (DGT) da Receita Federal, como a isenção de lucros e dividendos distribuídos, a não instituição do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) e os parcelamentos especiais com amplos descontos (Refis e similares).

“Os estudos existentes mostram que o bolo das renúncias fiscais é enorme e crescente. O que o Privilegiômetro faz é mostrar quem está comendo esse bolo, quanto leva e por que parte relevante disso não pode ser chamada de política pública, mas de privilégio tributário”, afirma Mauro Silva, presidente da Unafisco Nacional.

O estudo divide os benefícios fiscais do Brasil em dois grandes grupos. No primeiro, são separados os benefícios fiscais que comprovadamente apresentam uma contrapartida econômica e social como geração de emprego, redução de desigualdade ou atendimento a populações vulneráveis.

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No segundo grupo são enquadrados os benefícios classificados como privilégios tributários, ou seja, as vantagens dadas a certos setores sem uma contrapartida tecnicamente notória ou comprovada. Segundo a Unafisco, mais do que não apresentar contrapartidas, são casos que agravam a concentração de renda e não contribuem para reduzir desigualdades.

Setores com mais benefícios fiscais

Os dez grupos ou setores mais privilegiados com renúncias fiscais concentram 77,5% de todos os privilégios, o que vai somar quase R$ 480 bilhões em 2026. Os principais destaques são:

Benefícios fiscais

O estudo também traz uma análise distributiva de benefícios tradicionalmente vistos como “sociais”, como a desoneração da cesta básica, de medicamentos e o Simples Nacional.

A partir de dados de programas de transferência de renda e do tamanho médio das famílias, apenas 25,22% da renúncia com cesta básica e medicamentos alcança famílias de baixa renda; 74,78% desse gasto beneficiam contribuintes com maior capacidade contributiva, configurando privilégio tributário.

No caso do Simples Nacional, o documento mostra que empresas com faturamento anual de até R$ 1,8 milhão são responsáveis por 75,49% dos empregos nas firmas optantes. Já as faixas superiores concentram parte do benefício sem a mesma contrapartida na geração de postos de trabalho.

“Quando olhamos com lupa, fica claro que uma boa fatia das desonerações de cesta básica, medicamentos e do próprio Simples não chega aos mais pobres nem às microempresas de fato. São recursos públicos que acabam blindando grupos com maior renda e poder econômico”, aponta Mauro Silva.