09/11/2025 - 9:00
A pesquisadora Braulina Baniwa tem uma forte atuação na divulgação científica. Mas como indígena, ela destaca que a ciência já faz parte do cotidiano dos povos originários, ainda que de forma diferente do que se entende por ciência e tecnologia hoje na sociedade ocidental. “Temos que colocar esse conhecimento para disputar espaço científico. Uma tecnologia baseada na natureza, nas florestas”, disse ela, ao participar na quinta-feira, 6, em São Paulo do Nature and Climate Festival.
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Baniwa também destaca a importância da questão de gênero nesse processo científico. “As mulheres indígenas são guardiãs da nossa tecnologia a partir da nossa alimentação e da nossa arte. A palavra bioeconomia, traz a força das mulheres que me antecederam”.
Ela conta que ‘bioeconomia’ é uma palavra que não tem tradução para nenhuma língua indígena, mas ao explicar a um indígena o que ela significa, seu conceito é logo associado a práticas conhecidas e utilizadas há gerações. “Temos uma ciência milenar”.
COP na Amazônia é oportunidade de integração
Em relação à COP30, que ocorre neste ano em Belém (PA), região da Amazônia, Baniwa diz ver como uma oportunidade para que a narrativa indígena sobre ciência e tecnologia seja conhecida. “Esse encontro [COP] só fortalece as ciências, mas elas precisam de diálogo, sempre, para que se respeite esses dois lugares, porque a aceleração do desenvolvimento do nosso país nunca respeitou a nossa forma de cuidar e proteger”.
Um dos apontamentos de Baniwa é que as “pessoas externas” [à cultura indígena] nunca consideraram a ‘ciência indígena’ como uma ciência, e se referem a esse conhecimento como “a sabedoria”, a “tradição”. “Elas não valorizam a diversidade de ciência”.
“Eu falo no lugar de cientista, que no Brasil existe muita ciência nos territórios. Ela precisa dialogar com a tecnologia avançada, do mundo externo, para manutenção dela, mas com uma forma de proteger e resguardar essa tecnologia que sempre esteve conosco, e que permanece para outas gerações”.
Para além de conhecer “outras ciências”, a Conferência na Amazônia, acredita, Baniwa, mostrará que a floresta está passando por um processo de degradação e violência do ponto de vista como local sagrado e como local de mulheres. “Falar em COP na Amazônia traz esperança de falar que é uma mulher que precisa ser respeitada e que hoje passa por um processo de violação”.
Mulheres na ciência
Se na “sociedade externa” a ciência ainda é um campo bastante masculino, nas comunidades indígenas costuma ser um conhecimento representado por mulheres, já que são elas as “guardiãs” dessa ciência e essas tecnologias, que estão presentes de diferentes formas nos territórios de mais de 305 povos indígenas, diz.
“A nossa ciência indígena, enquanto mulheres, a gente manteve isso, nós somos as guardiãs. Nos meus estudos e pesquisas eu tenho sempre tentado viabilizar as mulheres. Falar desse protagonismo. Eu trago minha vó, minha mãe, eu quero que isso permaneça na minha filha e na minha neta. De poder dizer para o mundo, que as mulheres indígenas não são só guardiãs, mas grandes cientistas, assim como outras mulheres das periferias e quilombolas que estão formando pessoas”
Quem é Braulina Baniwa
Braulina Baniwa é formada em Ciências Sociais, com mestrado em Antropologia Social e atualmente segue no doutorado em Antropologia, sempre na Universidade de Brasília (UnB).
Atua em debates sobre sociobioeconomia, bioeconomia indígena da Amazônia, ciência das mulheres indígenas, tecnologias sociais e enfrentamento à violência política de gênero, a partir do processo de cuidado do corpo-território, no campo da produção de conhecimento, dentro e fora da academia.
Coautora do texto “Bioeconomia Indígena: Saberes Ancestrais e Tecnologias Sociais”. Foi a primeira diretora-executiva e é cofundadora da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA), além de cofundadora da Articulação Brasileira de Indígenas Antropóloges (ABIA).
Atualmente, atua na Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), no projeto de Justiça de Transição e Reparação Integral para os povos indígenas.
