Três milhões de caminhoneiros estão sob controle absoluto das autoridades americanas: não podem transportar produtos químicos sem antes passar por uma rigorosa fiscalização. As máscaras de gás também já se esgotaram no mercado de Nova York. Vôos que borrifam pesticidas sobre as plantações estão proibidos desde segunda-feira 24. Nove mil policiais guardam a fronteira com o México e outros 6 mil vigiam a divisa com o Canadá. Centros médicos foram convocados para tentar, a toque de caixa, produzir vacinas contra doenças que há anos estão erradicadas nos EUA, mas que representam séria ameaça. Laboratórios foram obrigados a realizar experiências diárias com a água dos reservatórios. Às portas da primeira guerra do século 21, autoridades científicas e governamentais se apressam em construir antídotos contra a guerra química ou biológica, o chamado bioterrorismo. Tentam com investimentos milionários, alta tecnologia e muito treinamento evitar um ataque infinitamente mais cruel do que o que colocou abaixo o World Trade Center, destruiu parte do Pentágono e ceifou milhares de vidas. A ameaça é real, faz parte das cartilhas terroristas e o pior: na região mirada pelas forças armadas americanas há pelo menos uma dúzia de países com estoque suficiente de substâncias químicas capazes de fazer um estrago mundial.

Na terça-feira 25, a Organização Mundial da Saúde pediu aos países que fortalecessem suas defesas contra o mal que se anuncia. As armas da guerra do novo século podem variar de vírus hemorrágicos ao Antrax ? praga infecciosa que ataca os pulmões e pode matar em 24 horas. Na lista das substâncias químicas estão gases venenosos como o Tabun, VX e Sarin. Este último foi usado no atentado ao metrô de Tóquio, em 1995.

Em 1999, Bill Clinton, preocupado com as ameaças bioterroristas, ordenou que os laboratórios identificassem agentes biológicos e criassem drogas capazes de aplacar qualquer epidemia. Recentemente, o governo americano assinou um contrato de US$ 343 milhões com a empresa Acambis para que fossem produzidos 40 milhões de doses contra o vírus da catapora. Ao mesmo tempo, os EUA vêm desenvolvendo um programa de treinamento que prevê a coordenação de hospitais, equipes de resgate e de grupos especializados em agir rapidamente, isolando aeroportos, metrô, estações ferroviárias e fechando fronteiras. Na Europa, países como Itália e França criaram, na semana passada, uma força-tarefa para combater o bioterrorismo. No Brasil, funciona há um ano o Nurep, núcleo de respostas rápidas para emergências epidemiológicas. O grupo é ligado à Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e formado por 21 profissionais treinados em Atlanta.

Em caso de emergência, o Nurep tem o poder de requisitar todo o orçamento destinado à Funasa, que é de R$ 3,5 bilhões ao ano. Também poderá convocar os 26 mil servidores da entidade. ?O Brasil está preparado?, diz Fábio Pimenta Júnior, técnico do Nurep. Segundo ele, os cuidados devem ser maiores em locais de grande densidade demográfica. ?Vírus ou bactérias poderiam ser colocados em sistemas de ventilação, reservatórios de água ou jogado na atmosfera por aviões?, diz Pimenta.

Não são poucas as nações que detêm depósitos de armas químicas. ?No Oriente Médio, há exemplos de países preparados para este conflito silencioso e mortal?, diz Maria Regina Alcântara, professora doutora do Instituto de Química da USP. Segundo ela, após 1970 o Afeganistão passou a usar os gases de guerra e o Iraque possui um complexo em Bassra (ao sul do país), adaptado para a produção de bombas químicas. O governo americano suspeita que Saddam Hussein também tenha usado curdos como cobaias para testes químicos e biológicos. Apesar disso, os maiores depósitos de armas desta natureza estão localizados na Rússia e EUA. O presidente George W. Bush disse que esta será uma guerra suja. É um sinal de que seu país poderá usar o mesmo veneno para contra-atacar ofensivas químicas ou biológicas.