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Fim da Agonia: Acordo com BNDES e Centrus limpa o nome de Birmann no mercado

O banqueiro Daniel Birmann passou os últimos seis anos no purgatório. Criador de um conglomerado que chegou a ter mais de 20 empresas e faturamento anual de US$ 2 bilhões, Birmann foi à lona em 1995, atingido por uma pane em seu banco e em várias de suas empresas, e não fez outra coisa desde então que não fosse pagar dívidas e tentar limpar sua imagem. Agora o longo calvário do caçador de empresas está para acabar. A última dívida na praça restante da derrocada de seu grupo, o Arbi, vai ser resgatada com uma operação de troca de ações que já está na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para ser aprovada. De um só golpe, Birmann pretende limpar a barra junto às duas instituições em que mais precisa ter a ficha imaculada: o BNDES, o principal financiador de investimentos em empresas no País, e o Banco Central, regulador do sistema financeiro. Crédito resgatado, o empresário, filho de um ex-banqueiro gaúcho, deve deixar Porto Alegre, onde se refugiou no auge da crise, e voltar ao Rio de Janeiro, de onde comandou os bons tempos do Arbi. Volta jovem, aos 50 anos, sonhando reconstruir seu poder. O primeiro passo é uma empresa de tratamento de lixo, a Usinaverde, que vai se juntar a um grupo que, sem alarde, fatura R$ 1 bilhão por ano, segundo ele diz a amigos.

A operação que encerrará a saga de Birmann como devedor levou um ano e meio para ganhar forma. É complexa e cheia de holdings superpostas, como os negócios que fazia em sua época áurea. O banqueiro vai se livrar de uma dívida com o BNDESPar e o fundo de previdência Centrus (dos funcionários do BC), entregando como pagamento 0,33% das ações da BCP, que estão em sua propriedade. Com essa manobra, passará a ser o único dono da SAM Indústrias, companhia cujo ativo é um crédito de R$ 100 milhões junto ao banco de Birmann. A negociação foi sofrida, e só após muita conversa BNDESPar e Centrus concordaram em entregar sua participação na empresa (28,5%). Para fechar o acordo, Birmann teve de entregar três vezes mais ações da BCP do que oferecia em sua proposta inicial.

 

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Nome limpo na praça: “Ele pagou todo mundo sem tomar recursos de terceiros”, diz o sócio Henrique Saraiva

 

?Ele pagou todo mundo, sem tomar recursos de terceiros?, destaca Henrique Saraiva, executivo que atravessou os piores anos de Birmann sem deixar o Arbi e agora é sócio do investimento na Usinaverde. Trata-se do primeiro negócio novo, de R$ 9 milhões, desde o desmonte de seu antigo grupo. O Arbi controla basicamente empresas remanescentes do antigo esplendor: a fabricante de armas CBC, a empresa de equipamentos óticos DF Vasconcelos (transformada em companhia de tecnologia hospitalar), a Arbi Empreendimentos Imobiliários e o banco que batiza o grupo ? agora limitado a administrar recebíveis. Vai conservar em suas mãos uma parcela de 2% das ações da BCP.

Birmann fez o possível para manter sigilo. A reação de seus pares no mercado após a queda, tratando-o como se fosse um pária, deixou marcas em sua personalidade e moldou seu novo estilo. Na virada da década de 90, quando era ainda o voraz devorador de empresas, o ex-banqueiro emendava uma tacada na seguinte, centralizava todas as negociações e dizia com orgulho que ia muito mais longe.

ngariou antipatias que afloraram quando tomou seu tombo nos negócios. Hoje evita aparecer pessoalmente nas negociações em que se envolve. Quando surge, age como o negociador de antes, oscilando entre envolvente e agressivo, mas fala de si mesmo como um grande empreendedor incompreendido. E pede anonimato.

Quando estava no topo, Birmann apreciava o poder que os negócios lhe conferiam. Era temido pelo arrojo com que se lançava à compra de empresas, quase sempre em dificuldades, e pela maneira com que renegociava dívidas e contratos de fornecedores após a aquisição. Em uma tacada, quase assumiu o comando da Atlantic no Brasil após desembolsar apenas US$ 10 milhões. Os sócios roeram a corda e ele perdeu a quantia adiantada, mas não recuou da ofensiva. Ele figurava nessa época entre as estrelas de sua geração de banqueiros de investimento, como Luiz Cezar Fernandes, do Pactual, Jorge Paulo Lemann, do Garantia, e o decano Julio Bozano, do Bozano, Simonsen. Todos se orgulhavam de transformar qualquer fábrica de prejuízos em um negócio rentável e valioso de se revender. Birmann foi o primeiro da turma a cair. Os demais acabaram escorregando pelo menos uma vez ? mas nenhum desceu tão fundo.

 

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Marcopolo: ações vendidas para deter a queda do grupo

 

O banco que dava nome ao grupo foi o primeiro a dar o sinal, em 1995, de que Birmann ia enfrentar tempos difíceis. Com apenas R$ 40 milhões de patrimônio líquido, o Arbi, um banco de crédito, viu-se subitamente atolado em R$ 90 milhões em créditos perdidos. Fechou o ano admitindo um prejuízo de R$ 13 milhões e precisando de capital para sobreviver. Mas dinheiro, a essa altura, era artigo pouco disponível no grupo. Birmann estava habituado a trabalhar altamente alavancado e outras de suas empresas já enfrentavam problemas, como a Moddata, a Caraíba Metais e a chilena Coplasa. A saída foi simplesmente desativar o banco, antecipando-se ao risco de uma liquidação do Banco Central, e passar nos cobres bem mais da metade de seu império empresarial.

Em pouco mais de um ano teve de desfazer-se de várias jóias de sua coroa. De cara, foram-se as participações na lucrativa fabricante de carrocerias Marcopolo, a maior do País, e na empresa de previdência privada BrasilPrev, do Banco do Brasil. Vendeu as seguradoras Santa Cruz e Itatiaia, que mal havia acabado de pôr nos trilhos, a fabricante de cabos e laminados Ficap-Marvin, e as empresas de beneficiamento de cobre Caraíba e Coplasa. Desfez-se ainda dos títulos que a corretora Arbi tinha na Bovespa e na BM&F. Foi a ruptura forçada com o negócio que deu origem a todo o seu grupo: a corretora, batizada com as iniciais do nome e sobrenome do pai, Aron Birmann, deu partida aos negócios de Daniel quando ele decidiu se radicar no Rio. Aron foi o exemplo que norteou a carreira do filho. Ex-controlador do Crefisul, em parceria com a família Sirotsky, hoje dona da rede RBS, o patriarca dizia que gostava de ter sempre o controle dos negócios em suas mãos. Birmann seguiu o mandamento à risca e acabou enfrentando sozinho o seu purgatório. Passado o período de expiação, ele quer agora alcançar novamente o paraíso.