Pensar grande foi uma lição ensinada desde cedo no ambiente da família Maggi. No final dos anos 60, o patriarca André poderia ter-se fixado com a mulher Lucia e os três filhos menores em São Miguel do Iguaçu, no oeste do Paraná, em sua pequena propriedade rural. Havia pés de milho, horta, junta de bois, galinheiro e pocilga. A renda advinha da madeireira que ele começava a desenvolver. Ao único filho homem, no entanto, o pai contava seus sonhos de acelerar os negócios, aproveitar a riqueza da terra, desbravar o País e até construir uma cidade inteira. ?Ele era um visionário?, definiu à DINHEIRO Blairo Maggi, o Empreendedor do Ano no setor de Agronegócio. Logo aos 12 anos, graças a um desconcertante golpe do destino, foi Blairo quem encontrou o caminho para concretizar os planos paternos. Alérgico a pó de serragem, viu-se sem chances de apoiá-lo na madeireira. Pediu e obteve licença para plantar alguns hectares de uma semente cujo grão, naqueles idos de 1969, se tornava invariavelmente ração para porcos. Nascia ali o maior produtor individual de soja do mundo.

Trinta e quatro anos depois de lançar sua primeira semente de soja à terra, Blairo coloca-se à frente de 162 mil hectares de área plantada, cuja colheita de 550 mil toneladas de grãos, nada menos que 40% maior do que no ano passado, proporciona neste 2003 a base de um faturamento de US$ 550 milhões ao grupo André Maggi. Com 1,8 mil funcionários que recebem participação nos lucros e 14o salário, a companhia distribui sementes e fertilizantes para cerca de 2 mil produtores rurais em Mato Grosso, dos quais compra a produção e a revende diretamente para indústrias de alimentos da Europa e do Japão ? um processo que resulta este ano em US$ 400 milhões em exportações. ?Num hectare de soja investe-se 100 dólares no plantio para retirar 800 dólares na safra?, calcula Blairo. ?Não há melhor negócio para fortalecer as divisas do País.? A colheita do grão e seu processamento em duas fábricas com capacidade para tratar 3 mil toneladas por dia de soja são apenas duas etapas da escala produtiva do grupo. O armazenamento é feito em silos próprios com capacidade para comportar 1,9 milhão de toneladas e também o transporte rodoviário e fluvial do Mato Grosso até os portos de Porto Velho, em Rondônia, e Itacoatiara, no Amazonas, onde o Maggi possui terminais, é feito por meios próprios. Para levar seus grãos de soja, milho e arroz, e ainda algodão, aos porões dos grandes cargueiros transatlânticos, o grupo Maggi fabrica barcaças, capazes de carregar 10 mil toneladas por viagem.

Pela história, porte e resultado, a empresa o resumo mais bem acabado do setor que tornou-se líder mundial de produtividade e é o carro-chefe da economia brasileira. Tal como os Maggi, em diferentes graus de sucesso centenas de milhares de famílias vão encontrando no campo, dentro de suas propriedades de pequeno, médio e grande portes, a riqueza que alimenta a economia dos centros urbanos. Dos US$ 75 bilhões que estão sendo exportados pelo País este ano, 31% foram extraídos do agronegócio. No ano passado, o PIB do setor agrícola aumentou 9%, tornando-se o grande responsável pelo crescimento econômico total de 2,75%. Sem o campo, o Brasil teria andado para trás. A safra de grãos estabeleceu o recorde de 120 milhões de toneladas ? o dobro em relação a dez anos atrás ? e as primeiras projeções dão conta de 10% a 20% de crescimento para 2004. ?Pela visão pioneira do agronegócio, Blairo e seu grupo são um exemplo para todo o setor agroindustrial?, diz Antônio Ernesto de Salvo, presidente da Confederação Nacional da Agricultura. ?Tiro o chapéu para a inteligência do Blairo?, afirma o produtor Rui Carlos Ottoni Prado, um dos maiores do País. ?É um craque no qual nos espelhamos.?

Pulo do gato. Mas como Blairo Maggi, hoje com 46 anos, fez a primeira semente de soja germinar até o atual meio bilhão de dólares de faturamento? ?Demos uns dois ou três pulos-do-gato certeiros?, diverte-se ele. Sua primeira produção virou mesmo ração suína, mas parte foi vendida à vizinhança. O fruto do trabalho certificou no menino a certeza da vocação na lida da terra. O patriarca André tocava a madeireira enquanto ele ia descobrindo a agricultura. Simultaneamente, a soja ia adquirindo mais importância econômica, graças a um crescente aproveitamento na indústria alimentícia. Em 1981, engenheiro agrônomo formado, Blairo deixou a faculdade com uma imensa vontade de aplicar seus conhecimentos em áreas maiores. Atravessar nessa hora a divisa do Paraná para as savanas do Mato Grosso foi um movimento natural. Fiel a seus sonhos de crescimento, André levou a família para Rondonópolis e, com o dinheiro economizado na madeireira, comprou 2,4 mil hectares ali perto. Em cima da terra colocou gado e plantou arroz. Os negócios iam bem, mas os Maggi queriam mais . Autorizado pelo pai, Blairo saiu à compra de uma área que fosse plana, contínua e vasta o suficiente para produzir grãos em larga escala. Num sobrevôo de avião, avistou uma fazenda nos arrabaldes do povoado de Sapezal. Voltou dias depois e fechou negócio com sinal no ato e dois anos de prestações. ?Não tínhamos todo o dinheiro?, explica o empreendedor. ?Mas sabíamos que a demanda pela soja no mundo crescia rapidamente. Era pegar ou pegar.? Pela ação do filho precoce, os Maggi passaram a ter 12 mil hectares de terra continuada. Anos depois, fortuna consolidada, os Maggi fizeram nascer ali uma cidade planejada, traçada na ponta do lápis de urbanistas especialmente contratados para realizar o velho sonho de André.

Na década de 80, a exemplo de dez entre dez produtores rurais, os Maggi vendiam sua produção para comercializadoras como a Sambra e a Sampleito. Mas André mantinha a aposta no talento do filho. Mandou Blairo aos Estados Unidos fazer cursos de extensão em agronomia e descobrir os segredos dos maiores produtores de soja do mundo. ?Vi grãos sendo transportados pelo Mississipi e imaginei que poderíamos fazer o mesmo na Amazônia?, recorda. André também o fez se movimentar pela Europa no circuito dos grandes compradores de países distantes (porém ricos) como a Noruega e a Finlândia ? e facilmente Blairo concluiu que o segredo estava em atalhar os intermediários no Brasil e vender seu grão diretamente à indústria alimentícia. Era o pensar grande em plena erupção.