30/12/2010 - 7:50
As principais cidades da Bolívia estavam paralisadas nesta quinta-feira por uma greve dos transportes coletivos e por barricadas, em protesto contra uma alta de até 80% dos combustíveis, num clima de crescente descontentamento que o presidente Evo Morales tentou resolver com aumentos salariais.
El Alto, a cidade-dormitório vizinha a La Paz e principal feudo eleitoral de Evo Morales, liderava os protestos com a mobilização de milhares de pessoas, que montavam barricadas com pneus em chamas e apedrejavam edifícios de organizações relacionadas ao presidente, comprovou um jornalista da AFP.
Em La Paz, onde o Palácio presidencial era protegido por militares, o transporte público havia quase desaparecido desde cedo e a população tinha dificuldades para se deslocar. Nos mercados, eram grandes as filas de cidadãos em busca de alimentos, que começam a ficar escassos.
Na cidade de Cochabamba, a 400 km de La Paz, os grevistas do transporte de carga instalaram veículos pesados nas interseções das ruas de acesso, impedindo a circulação, segundo mostraram imagens de TV.
Santa Cruz de la Sierra, motor do desenvolvimento boliviano, também foi muito afetada pela paralisação do transporte, e organizações civis anunciavam manifestações para esta quinta-feira.
Os protestos são contra um decreto anunciado no domingo pelo governo, que aumentou os preços da gasolina (83%) e do diesel (73%).
Desde então, os transportes estipularam altas de até 100% de suas tarifas.
No início, o governo pretendeu – sem sucesso – reduzir o aumento em 30%, mas nesta quinta-feira Morales permitiu que os transportes decidissem os valores de suas tarifas, convencido de que a lei da oferta e da procura os obrigará a abaixar os preços das passagens.
Entre os transportes “haverá uma concorrência, as tarifas vão diminuir”, disse Morales.
Na quarta-feira, o presidente justificou a alta da gasolina explicando que, por ano, o país perdia 150 milhões de dólares em combustível contrabandeado aos países vizinhos.
A Bolívia tem um consumo de 35 mil de barris diários de petróleo, e em 2010 produziu apenas 4.500 barris diários. O restante é importado, principalmente de Venezuela e Argentina.
Para suavizar a alta, Morales aumentou em 20% o salário das Forças Armadas, da polícia e dos funcionários da saúde e da educação.
O presidente também anunciou outras medidas, como incentivos a agricultores e seguros de colheita.
O líder opositor e ex-aliado do governo Juan del Granado propôs um referendo para resolver os custos dos combustíveis.
“Diante da decepção, diante da desilusão, diante dos protestos das pessoas, diante da improvisação do governo propomos que seja convocado um referendo” para manter ou não a vigência do decreto de aumento de tarifas, afirmou Del Granado.
“Presidente Evo Morales, não tenhamos medo do critério das pessoas, vamos consultar o povo”, disse.
A medida de Morales também foi criticada por ser “neoliberal” pelo ex-vice-presidente indígena Víctor Hugo Cárdenas, um adversário de longa data.
“Com sua mensagem e o ‘gasolinaço’, desapareceu o Evo antineoliberal e antimercado e nasceu o Evo e o governo neoliberais e sujeitos às regras de mercado”, disse à imprensa local.
Em meio à confusão, houve fortes rumores nesta quarta-feira sobre um iminente “corralito” (congelamento de depósitos bancários), uma desvalorização do dólar de quase 30% e inclusive o confisco de poupanças em dólares.
“Garanto a vocês que não haverá nenhum ‘corralito’ bancário, alguns meios de comunicação enganam”, disse o presidente pela televisão.
Por sua vez, o presidente da Associação Nacional de Bancos da Bolívia, Juan Carlos Salaues, garantiu “de uma maneira muito enfática” que “não há nenhuma medida que vá afetar o sistema financeiro do ponto de vista da política monetária”.
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