30/03/2005 - 7:00
Os americanos não conhecem Zeca Pagodinho. Os franceses jamais ouviram o bordão Nã-Nã-Nã-Nã. E os ucranianos nem imaginam que há no Brasil uma cerveja que promete refrescar até pensamento. Portanto, a Brahma, ainda uma ilustre desconhecida no hemisfério Norte, terá de partir do zero, com uma campanha milionária de marketing e distribuição precisa, para arrumar espaço nos bares internacionais e conquistar consumidores em 15 países. Na semana passada, a dupla Ambev/Interbrew, unida desde 2004 sob a sigla Inbev, anunciou que a segunda cerveja mais vendida do Brasil ? e a primeira mais lembrada pelos consumidores locais ? acaba de se transformar na terceira grife global da maior companhia de cerveja do mundo, ao lado de Stella Artois e Becks. A partir de junho, a brasileira estará nos bares de Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Rússia, Ucrânia, Bélgica, França, Luxemburgo e Holanda. No final do ano, outras seis nações serão brindadas com a loura nacional. Na Terça-feira 22, enquanto o novo comandante da Ambev, Luiz Fernando Edmond, explicava em São Paulo a estratégia de internacionalização, representantes da Inbev faziam o mesmo em Nova York, Bruxelas e Moscou. A Brahma ganhou roupa nova para a turnê internacional: desembarcará nos 15 mercados em garrafas transparentes de 330 a 500 ml com um novo formato, mais anatômico, curvilíneo e sem o rótulo estampado no vidro ? apenas a marca grafada em alto relevo (lembra muito a garrafa da Skol Beats). A brasileira, ao contrário do que ocorre por aqui, não vai disputar a maior fatia de mercado, mas o segmento premium que, na média, corresponde a cerca de 13% do consumo mundial.
?Se conseguirmos um naco desse segmento nos Estados Unidos, por exemplo, já terá valido a pena?, comenta Victório De Marchi, presidente do Conselho da Ambev. No país de Bush, as cervejas premium correspondem a 12% do setor, algo como 3 bilhões de litros ? mais do que todo o mercado argentino. E o melhor: uma long neck da Brahma na Argentina pode custar até US$ 1,50, enquanto nos Estados Unidos sairá por cerca de US$ 4,50. ?Temos qualidade para brigar com as grandes marcas mundiais?, afirma De Marchi. ?Uma boa referência é a aceitação do produto nos oito países latino-americanos nos quais estamos presentes?, endossa Edmond, o diretor-geral da Ambev. Mas se a qualidade é o ponto de partida, os executivos da cervejaria sabem que distribuição e marketing serão ingredientes fundamentais para a conquista internacional. ?Nesse mercado não há como obter êxito se a distribuição não estiver perfeitamente amarrada. Pelo que ouvi da estratégia da Brahma, eles estão no caminho certo?, avalia Adalberto Viviani, presidente da consultoria Concept.
A arrancada da cerveja no mercado externo partirá de três pontos. O primeiro deles é a fábrica de Jacareí, em São Paulo, que recebeu investimentos de R$ 10 milhões em ampliação. Ela irá abastecer o mercado norte-americano e o canadense. A unidade de Klin, na Rússia, pertencente a Inbev, também sofrerá modificações para atender ao consumo russo e o da Ucrânia. Em Leuven, Bélgica, outra planta da Inbev estará encarregada de suprir os demais países da Europa. A opção de não lançar mão de uma fábrica local na América do Norte se deve às características daquele mercado. Uma Brahma produzida in loco teria preços menores, é verdade, mas poderia perder a imagem de brasilidade e bater de frente com as grandes marcas americanas. Não é bom negócio. Só a Anheuser Bush, dona da Budweiser, tem 60% do mercado local. Ali, a chave é entrar mesmo no varejo especializado em cervejas importadas. E na categoria premium, que apresenta grande potencial de crescimento. ?Ao produzi-la aqui e exportá-la, a Ambev mantém o certificado de origem. E ao eleger o segmento premium, de cervejas importadas, já indica que vai dar grande ênfase aos nichos?, diz Viviani. Em outras palavras, a Brahma fará grandes esforços para que sua brasilidade conquiste a gigantesca comunidade hispânica nos EUA. Nesse ringue, a briga será direta com a mexicana Corona. ?Vamos brigar com ela e com todas as demais?, despista De Marchi. Os primeiros alvos no mercado americano já foram definidos: Flórida, Califórnia e Texas. Na Europa, a produção local obedece duas questões básicas: logística e bom senso. Por que exportar e correr o risco de inviabilizar economicamente a entrada da Brahma por lá se há o braço forte da sócia Inbev, com planta pronta e distribuição garantida? A cerveja custará 3 euros na Europa.
Distribuição azeitada, só falta carregar no marketing. ?Vamos explorar características como a irreverência e a ginga do brasileiro?, avisa Carlos Lisboa, diretor de marketing da Ambev, sem revelar o valor dos investimentos nessa campanha mundial. O que se sabe é que no pacote de divulgação, o pagode de Zeca dá lugar ao rap de Marcelo D2, praia, sol, Cristo Redentor e Gisele Bündchen. As campanhas na Europa e Estados Unidos serão entregues a agência McGarry Bowen, que atende a Inbev. Além da publicidade, ações promocionais darão força ao début da Brahma no exterior. João Marcelo Bôscoli e André Szajman, fundadores da gravadora Trama, entram no circuito organizando shows que levarão o patrocínio Brahma e coleções de Cds que reforçam a brasilidade da marca. ?Também já fechamos um contrato com o Pão de Açúcar que, por meio de seu sócio Casino, vai distribuir vários produtos brasileiros na França. A nova Brahma estará entre eles?, comemora De Marchi. Além dos países já definidos, o pessoal da Brahma deve anunciar em breve a estréia nos mercados peruano e da República Dominicana, com fábricas locais. China e Alemanha também estão nos planos.
De acordo com os executivos da Ambev, ainda não dá para prever os resultados dessa internacionalização. Pelo menos em curto prazo. ?Nos próximos três anos, reinvestiremos toda a receita com exportação e licenciamento de produção externa na própria operação internacional. O balanço só deverá acusar ganhos após esse período?, avisa Edmond. Até 2007 a idéia é vender 150 mil litros de Brahma pelo mundo. A estratégia mundial também poderá render dividendos no mercado interno. De acordo com o consultor Viviani, o sucesso da Brahma no exterior poderá elevar o preço médio da bebida por aqui. ?É o que ocorreu com a Tequila, por exemplo. A demanda internacional pelo produto agregou-lhe valor e fez com que ele fosse vendido a um preço maior também no mercado mexicano?, conta Viviani.
Como a Ambev, dona absoluta do mercado brasileiro de cervejas, não tem muito para onde crescer internamente, a estratégia externa poderá também ampliar receitas por aqui.
R$ 10 milhões É o investimento para ampliação da fábrica de Jacareí, única do País a produzir a nova Brahma
A LOGÍSTICA DA LOURA
Estima-se que, até 2007, a Brahma venda 150 milhões de litros da bebida no mercado mundial. Da fábrica de Jacareí, em São Paulo, partirão as cervejas para Estados Unidos e Canadá. Em Klin, na Rússia, uma unidade da Inbev abastecerá s mercados russo e ucraniano. Outra planta, em Leuven, Bélgica, também da Inbev, venderá para Inglaterra, Holanda, França. Luxemburgo e a própria Bélgica. Peru e República Dominicana são as próximas paradas. China e Alemanha estão nos planos.