30/06/2021 - 13:00
Como chefe de mercados emergentes do banco de investimentos Morgan Stanley, o trabalho do indiano Ruchir Sharma, do seu posto em Nova York, é descobrir para onde o dinheiro vai. Em 2012, quando a moda dos mercados emergentes estava no auge, Sharma nadou contra a corrente ao publicar o livro Os Rumos da Prosperidade: Em Busca dos Próximos Milagres Econômicos, em tradução do inglês.
No livro, ele dizia que era um erro tratar o Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) como um bloco só, em vez de analisar individualmente cada país, e era pessimista em relação ao Brasil. Sharma antecipou que o rebuliço dos investidores internacionais em relação ao País iria desaparecer à medida que os preços das commodities caíssem e ficasse clara a precariedade nacional em áreas como educação, pesquisa e infraestrutura.
Agora, Sharma mudou de tom e acredita que o dinheiro estrangeiro pode voltar ao Brasil. O otimismo está relacionado ao que ele acredita ser um novo ciclo de alta dos preços das commodities, que pode abrir uma nova via de crescimento. Em entrevista ao Estadão, Sharma diz que o País deve agarrar a oportunidade para acelerar a revolução digital e dar um salto.
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista.
Apesar de o Brasil ter sido duramente atingido pela pandemia, o sr. está otimista em relação às perspectivas do País. Por quê?
É verdade que a pandemia atingiu duramente o Brasil e que a incerteza em relação à situação política contribui para segurar investimentos no País, por causa do receio do que pode acontecer mais à frente. Em geral, a maioria dos investidores está muito pessimista em relação ao Brasil – muitos passaram a achar que o País virou causa perdida. Obviamente, a política é relevante. Acompanhamos com atenção o andamento das reformas econômicas no Brasil, onde as notícias variam a cada semana: ora são boas, ora ruins. Provavelmente, a situação política está mais confusa agora. Mas já era confusa uma década atrás, quando havia uma grande excitação em relação ao Brasil e a The Economist publicara a capa em que o Cristo Redentor decolava. Na época, publiquei o livro Breakout Nations, em que mostrei como o “hype” em torno do Brasil escondia fragilidades, como a dependência dos preços das commodities. Naquela ocasião, estava pessimista. Agora, vejo razões para ser otimista – e uma delas é a alta dos preços das commodities.
A dependência em relação às commodities não representa uma espécie de maldição?
Os dados mostram que a renda per capita do Brasil, na comparação com a dos EUA, está na mesma posição relativa que ocupava em 1.850. No longo prazo, os preços das commodities não aumentam mais rápido do que a inflação. Mas, a curto prazo, toda vez que há um aumento nos preços das commodities, a tendência é que as economias dos países exportadores tenham também um boom de crescimento. O importante para o Brasil é aproveitar essa janela e abrir um novo caminho de crescimento, menos dependente dos ciclos das commodities.
Quanto vai durar a alta nos preços das commodities? Qual é a sua visão a respeito?
É difícil prever, mas há várias razões para acreditar que estamos diante de um ciclo que pode durar. Uma é o enfraquecimento global do dólar, por causa da política monetária que vem sendo seguida pelo Fed. Os programas de estímulo à economia também estão aumentando investimentos em infraestrutura, o que provoca uma alta na demanda por insumos necessários à construção civil. Há também impulso político, relacionado às políticas para enfrentar as mudanças climáticas. Isso está aumentando, por exemplo, a demanda por metais para carros elétricos e edifícios mais verdes.
Como o Brasil pode aproveitar essa alta das commodities para dar um salto?
O modelo antigo de crescimento era o da industrialização para exportação. Foi o caminho seguido no passado com sucesso pelas nações asiáticas, que conseguiram milagres econômicos. Mas esse caminho se estreitou, a robotização está crescendo. As exportações industriais também tendem a perder peso na economia. A pandemia, porém, contribuiu para deslanchar uma revolução digital. A digitalização dos serviços é uma nova via para que as nações emergentes possam vir a crescer mais rapidamente.
O Brasil deveria investir em digitalização?
Sim. É um caminho que me parece mais fácil para um novo modelo de desenvolvimento. Em muitas nações emergentes, essa revolução digital está se espalhando mais do que em nações desenvolvidas, porque as pessoas são menos apegadas a velhos hábitos de consumo. Segundo o Banco Mundial, o custo médio de abertura de empresa não mudou desde 2003 nas economias desenvolvidas, mas nas economias em desenvolvimento o custo caiu de 50% a mais do que a renda média anual para 60% a menos. Grande parte dessa melhoria decorre do fato de que empreendedores podem agora lançar um negócio com um smartphone.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.