Criada com a missão de ser um motor para acelerar serviços financeiros digitais e promover a inclusão financeira de brasileiros à margem do sistema bancário, a Dock hoje opera mais de 65 milhões de contas ativas e mais de 7 bilhões de transações anuais. No final do passado, seu fundador foi anunciado pela EY como o representante Master do Brasil na etapa global do programa EY World Entrepreneur Of The Year™, que acontece em junho deste ano, em Mônaco. Para o CEO da Dock, Antonio Soares, “representar o Brasil nesse programa é uma enorme responsabilidade e, ao mesmo tempo, um reconhecimento para todo o ecossistema de pagamentos do país”. Disposto a mostrar para o mundo que o Brasil é uma potência em pagamentos, ele falou à DINHEIRO sobre o que o país tem feito de diferente nesse campo.

O Brasil tem se destacado globalmente pelo pioneirismo em soluções para a inclusão financeira. Por quê?
O mais importante, na minha visão, tem sido a construção passo a passo de uma infraestrutura de pagamentos. Nosso setor é referência mundial graças a um pacote que inclui inovação, aceleração dos serviços financeiros digitais e dos pagamentos instantâneos e atuação do Banco Central e das empresas de tecnologia, bancos e fintechs. O processo começou quando o Banco Central do Brasil criou regulação que permite abrir uma conta em banco digital de modo simples e rápido. Paralelamente, tivemos um grande avanço na infraestrutura de telecomunicações. Na Dock, convertemos essa oportunidade em soluções que ajudam a democratizar a tecnologia financeira. No meio do caminho, houve ainda a pandemia, (que fez com que as pessoas precisassem se digitalizar), e a implementação do Pix. Demos um salto e, de 2022 a 2023, o Brasil passou do 35º para o 21º lugar no Índice Mundial de Inclusão Financeira.

Qual a sua avaliação sobre o papel do Pix na evolução dos meios de pagamento?
Antes do Pix, o Brasil já era uma economia com bastante penetração em cartões de crédito e débito e alto volume de transação, mas muitas pessoas ainda transacionavam no dinheiro, incluindo empresas. O papel do Pix foi trazer essas pessoas para o sistema financeiro. Hoje, no Brasil, 15 milhões de estabelecimentos aceitam cartão, enquanto 25 milhões (que três anos atrás recebiam somente dinheiro) aceitam papel e Pix. O vendedor de picolé na praia, o pedreiro, o artista de rua são alguns dos profissionais entre os milhões que tiveram suas vidas facilitadas. Com o Pix, houve também uma mudança de mindset: pessoas pagavam parcelado e acreditavam que não tinha juros, até perceberem que, se pagassem no Pix, as empresas lhes ofereciam desconto. Isso fez do Pix um catalisador do debate sobre o parcelado sem juros e aumentou o poder do consumidor.

Como o Pix parcelado impacta o sistema financeiro tradicional?
Ele vem para beneficiar uma parte da população que precisa de crédito e deve disputar espaço com o parcelado sem juros no cartão. Eu acredito que o Pix Parcelado é o próximo movimento da construção dessa infraestrutura de pagamentos. Deve, de fato, impulsionar a inclusão na economia.

O que o Drex mudará na prática?
O DOC deixou de existir agora, e a TED já não é mais usada para transferências tradicionais, mas deve acabar de fato quando o Drex estiver funcionando. Isso porque o Drex vai entrar naquelas transações comerciais que possuem uma condicionante, por exemplo, quando ao transferir um carro, a pessoa só recebe o DUT quando o valor cai na conta. Ou quando uma empresa compra matéria-prima e só vai pagar quando ela desembarcar. O Drex vai atrelar o pagamento e o recebimento, facilitando esse processo e trazendo muito mais segurança e rastreabilidade para a transação. É mais um B2B do que um B2B2C.

Na sua visão, é preciso aumentar o acesso dos brasileiros aos bancos ou as instituições tendem a ser desnecessárias para parte da população?
Na Dock acreditamos que, quando você tem cada vez mais empresas de outros setores servindo seus consumidores com finanças embarcadas, a bancarização vai se tornando automática. Bancarização não vai mais ser simplesmente ter uma conta em banco, mas transacionar com empresas que têm finanças embarcadas. Como fornecedores da infraestrutura que permite embarcar serviços financeiros a negócios de qualquer setor, empoderamos as empresas que atendem ao consumidor final, promovendo inclusão financeira. Não se trata de incluir mais gente no sistema financeiro, mas de fazer com que mais empresas usem serviços financeiros.

Como avalia os quase 5 milhões de CPFs de investidores na B3?
Os números são bons e a gente pode olhar pelo lado positivo, mas, quando você relaciona com a quantidade de pessoas economicamente ativas no País, é um número ainda pequeno, que mostra um caminho a ser percorrido. Da mesma forma como a gente vem falando em bancarização, como levamos investimento para a ponta de uma forma que as pessoas entendam e que não seja uma loteria, uma aposta? Para isso, é necessário um processo de educação financeira que parte de um princípio de bancarização e de uma economia mais digitalizada, temas nos quais já estamos avançando.

A Dock já está presente em 11 países. O que significa a expansão internacional?
Estamos no Brasil, México, Peru, Colômbia, Equador, Argentina, Panamá, Chile, Cayman, El Salvador e Guatemala. No nosso mercado primário de expansão, que é a América Latina, há muita similaridade com o Brasil na realidade de consumo, por isso conseguimos levar para esses países aquilo que sabemos que eles vão precisar. A expansão tem muita relevância na diversificação de receita, porque não somos mais uma empresa somente brasileira. Isso gera internacionalização da companhia no aspecto contábil e regulatório. Temos que lidar com outras regras, e isso faz com que a empresa comece a se tornar uma multinacional.

Quais mercados são estratégicos para a Dock avançar no exterior?
México, Colômbia, Chile e América Central são nossas grandes apostas, porque acreditamos poder construir avanços ainda mais abrangentes do que no Brasil. A América Central está muito atrás da América Latina e há muito a ser feito, então o potencial de ajudarmos a região a dar um salto e impactarmos muita gente é grande.

Que lições você têm aprendido com outros países e que ajudam a melhorar a operação doméstica?
Uma das grandes lições é que os problemas de negócio podem ser parecidos, mas a forma de resolvê-los muitas vezes é diferente. O que acontece na Dock é que a infraestrutura que nós temos para isso é a mesma, mas a abordagem varia porque precisa considerar aspectos culturais e regulatórios. Como o Brasil é um país muito avançado em pagamentos, não vemos referências relevantes de fora para fazer o caminho inverso nesse momento.

Qual o seu papel com o representante Master do Brasil na etapa global do programa EY World Entrepreneur Of The Year™, em Mônaco?
É uma enorme responsabilidade e, ao mesmo tempo, um reconhecimento para todo o ecossistema de pagamentos do país. É também uma oportunidade de ecoar a causa que acreditamos e pela qual trabalhamos: a inclusão financeira na América Latina. Entendo a importância do papel de mostrar para o mundo que o Brasil é, sim, uma potência em pagamentos. O maior banco digital do mundo foi criado aqui. A maior adoção de pagamentos instantâneos aconteceu aqui. As empresas de infraestrutura que se internacionalizaram, como a Dock, nasceram no Brasil. Precisamos mostrar que a gente tem o know-how, a tecnologia, os profissionais e, principalmente, um regulador que está ajudando tudo isso a acontecer. Além disso, temos a chance de mostrar o poder dessa infraestrutura para criar sociedades mais igualitárias, em que as pessoas tenham acesso a serviços financeiros — a porta de entrada para uma vida economicamente ativa. Os programas de geração de renda são muito importantes, mas se as pessoas não tiverem acesso a serviços financeiros e a educação financeira, não estaremos proporcionando tudo o que podemos em termos de oportunidades. Queremos mostrar que é possível, por meio de plataformas de infraestrutura, levar serviços financeiros a todos os cantos.