24/07/2015 - 19:00
Pense em uma família numerosa morando em uma casa. Alguns moradores são muito jovens e não trabalham nem estudam. Alguns estudam, outros estudam e trabalham. Os adultos só trabalham e os mais velhos não trabalham nem estudam. A família vive harmoniosamente, mas há uma ameaça financeira no horizonte. Nos últimos anos, nasceram menos jovens, os idosos passaram a viver mais tempo e, por isso está sobrando cada vez menos dinheiro no fim do mês. Para cobrir as despesas, quem trabalha precisa contribuir com uma parcela maior dos salários, provocando uma pressão crescente sobre as contas da casa.
Em algum momento, no futuro distante (ou nem tanto) será necessário fazer um ajuste e alguns dos benefícios – como os gastos escolares e os planos de saúde – terão de ser repensados. Essa é a uma imagem adequada para se entender o problema das contas públicas no Brasil. Em um artigo publicado no início de julho, três dos mais respeitados economistas do País dissecam a questão. “O Ajuste Inevitável”, assinado por Mansueto Almeida Jr., Marcos Lisboa e Samuel Pessoa, traça de maneira clara o beco sem saída para o qual se dirige a economia brasileira.
O cálculo é simples. Entre 1991 e 2014, a renda real do Brasil mais que dobrou, crescendo 104%, um desempenho excelente para qualquer economia. No entanto, nesse período, a receita de impostos aumentou 184%. O setor público se apropriou de 45% do aumento da renda nacional para pagar as despesas com previdência, políticas públicas e programas de transferência de renda, como o Bolsa Família – estes últimos, frisam os autores, não são um problema. O maior problema está, na verdade, no INSS. Em 1991, a Previdência consumia anualmente 3,4% do Produto Interno Bruto (PIB). Em 2014, mais que dobrou, para 7,7%.
Voltando ao exemplo da família: os gastos com os mais velhos representavam R$ 1 de cada R$ 29 ganhos pelo pessoal da ativa, no começo dos anos 1990, passando para R$ 1 a cada R$ 13, quadro agravado porque os brasileiros se aposentam relativamente cedo. O crescimento acelerado dos gastos foi mascarado pela transformação da economia, na década passada. O ganho de produtividade do agronegócio, o ciclo de alta das commodities, o crescimento da renda e do crédito e a formalização de muitos trabalhadores facilitaram o trabalho do Leão, e o desequilíbrio não ficou tão evidente. No entanto, esse período de fartura se esgotou. Segundo os autores, não há boas notícias no horizonte, apesar do esforço recente do governo para apertar o cinto e equilibrar as contas.
O desequilíbrio, afirmam eles, é estrutural. Pelas estimativas oficiais, em 2030, essa fatura passará para 8,67% do PIB. Em 2050, a situação ficará muito pior para quem estiver entrando no mercado de trabalho e fizer as contas para se aposentar. Em 35 anos, se nada mudar, as despesas vão atingir 12,63% do PIB. Um de cada R$ 8 faturados será dedicado às aposentadorias. E a conclusão do trabalho não deixa dúvidas. “As aposentadorias precoces são apenas o sintoma mais visível de um País que escolheu conceder o que não possui, um País que se tornou velho antes de se tornar desenvolvido e que desperdiçou seu bônus demográfico.”