A aquisição da cervejaria Schincariol pela japonesa Kirin foi uma das fusões mais comentadas no ano passado. Marcado por disputas entre dois grupos de controladores da família Schincariol, o negócio de US$ 4 bilhões seria uma entre outras grandes transações globais, exceto por uma diferença: a intermediação do banco BTG Pactual. A presença de um banco brasileiro, que desalojou gigantes internacionais como Goldman Sachs e JP Morgan, é uma tendência que aparenta estar se consolidando na América Latina. Uma pesquisa da empresa americana Merrill Corporation, obtida com exclusividade pela DINHEIRO, mostra que, em 2011, três dos quatro principais intermediários das grandes fusões e aquisições foram brasileiros: além do BTG Pactual, Itaú BBA e Bradesco BBI subiram ao pódio, e isso não vai mudar tão já (veja tabela ao final da reportagem). 

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Equipe agressiva – Farkuh (à esq.) e Ejnisman (em pé, à dir.), Rafael Bruno

e Mariana Nishimura, do Bradesco BBI: 17 operações concluídas em 2011.

 

“O conhecimento dos brasileiros está muito consolidado aos olhos dos investidores internacionais”, diz Ana Paula de Castro, diretora da Merrill na América do Sul. A empresa, que não tem relação com o banco de investimentos Merrill Lynch, oferece um ambiente de negócios virtual para os candidatos a fusões e aquisições. Líder na lista, o BTG Pactual exibe a seu favor um processo de tomada de decisão mais ágil do que os concorrentes internacionais. De acordo com Marcos Gonçalves, responsável pela área no banco do empresário André Esteves, conta pontos o fato de os executivos a cargo dos negócios também serem sócios do BTG. 

 

“Quem nos procura para comprar ou vender sua empresa tem relacionamento de longo prazo conosco e sabe que estaremos com ele daqui dois ou três anos, quando a operação for concluída”, diz Gonçalves. O mundo das fusões e aquisições é ultrassigiloso. Gonçalves não diz sequer quantos são os membros de sua equipe, revelando apenas que os profissionais têm de dez a 12 anos de experiência. Engenheiro mecânico de formação, o executivo sempre trabalhou no mercado financeiro e adquiriu experiência em fusões e aquisições no Credit Suisse. Para ele, os brasileiros oferecem mais segurança. “Os bancos internacionais aumentam ou diminuem sua presença na região, conforme os humores da economia global, e isso reduz o contato dos executivos com os clientes”, afirma. 

 

Além disso, diz, as instituições globais são mais burocráticas e uma operação precisa do aval de vários comitês internos. “Comprar ou vender uma empresa é uma decisão estratégica, e quem decide precisa ter na outra ponta um banqueiro de confiança e com poder de decisão,” afirma. Outro brasileiro que brilhou no mercado foi o Bradesco BBI. Criado em 2008 e um recém-chegado ao mercado, o braço de investimentos do banco da Cidade de Deus mostrou-se agressivo logo na chegada. Sua primeira operação foi a fusão da BM&F com a Bovespa. No ano seguinte, o BBI participou da compra da Sadia pela Perdigão. “Aproveitamos que nossos clientes têm relacionamentos de muitas décadas com o Bradesco”, diz Renato Ejnisman, diretor-gerente do banco de investimentos. 

 

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Destaque no mapa: Brasileiros devem continuar liderando os processos

em 2012, diz Ana Paula de Castro, da Merrill Corporation.

 

A equipe emprega 60 profissionais, liderados por Alessandro Farkuh, que trabalhou na área de fusões e aquisições da PricewaterhouseCoopers e na butique de investimentos Cicerone Capital. Em 2011, essa equipe assessorou fusões como a da FolhaPar com o UOL, a das empresas rodoviárias JSL e Schio, associações como a da LAN com a TAM, além da reestruturação societária da Oi. No total, foram anunciadas 21 transações, das quais 17 foram concluídas. “O ano passado foi particularmente interessante para nós, apesar da redução do tíquete médio das transações”, afirma Farkuh. Segundo ele, as fusões e aquisições movimentaram R$ 140 bilhões no Brasil em 2011, queda de 24% ante os R$ 185 bilhões de 2010. “O mercado está mais maduro e há menos chance de ocorrerem megafusões”, diz ele. “Os grandes negócios que tinham de ser fechados já ocorreram, mas o número de oportunidades em empresas de menor porte cresceu.” 

 

Ana Paula, da Merrill, avalia que o total de negócios a ser fechado em 2012 deverá crescer entre 15% e 20% em relação a 2011. “As áreas mais aquecidas serão os setores de infraestrutura, consumo e serviços como educação, que precisam investir e vão necessitar de bastante capital”, diz ela. Os executivos dos bancos são reticentes em revelar suas expectativas para 2012, mas dizem esperar participar de mais operações envolvendo empresas brasileiras e transações entre o Brasil e outros países da América Latina. “Empresas de mercados menores como Colômbia, Argentina e Chile podem ser alvo dos brasileiros”, diz Andrew Janszky, sócio e diretor na América Latina do escritório de advocacia Milbank, que participa da pesquisa da Merrill. “O setor financeiro será o mais suscetível a consolidações”, afirma Luis Miguel Santacreu, analista da Austin Rating. 

 

De olho nesse filão, os executivos têm gasto muitas horas a bordo de aviões atrás de negócios. Quando conversou com a DINHEIRO, Gonçalves, do BTG Pactual, estava em Hong Kong conversando com clientes. Segundo ele, 50% dos negócios vêm dos clientes, mas a outra metade depende da criatividade dos executivos do banco, cujo trabalho é caçar oportunidades. No BTG, alguns executivos acompanham os setores da economia e outros se aproximam dos clientes para negociar preços e opções. No caso da compra da cervejaria Schincariol pela japonesa Kirin, o processo de convencimento dos acionistas levou quase um ano. Muito tempo? Nem tanto. “Foi até rápido mostrar que os sócios brasileiros teriam uma ótima oportunidade vendendo a empresa aos japoneses”, diz Gonçalves. 

 

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