09/02/2010 - 3:32
Os irmãos gaúchos Luciano, 39 anos, e Fernando Luft, 36, sócios do grupo Luft, um dos maiores do País na área de logística, vivem buscando problemas. E fazem isso com prazer. No ano passado, por exemplo, eles perceberam que poderiam aperfeiçoar o processo de distribuição de um tal de glifosato, um defensivo agrícola produzido por um de seus clientes, a CCAB. Mas, para fazer isso, praticamente mudaram seu campo de atuação. ?Compramos uma participação numa indústria química, a Tagma, para produzir e etiquetar o glifosato?, diz Luciano.
Antes, a Luft buscava a matéria-prima no porto, levava até o armazém e, de lá, enviava para a fábrica da CCAB. Depois, o produto final voltava para o armazém e, por fim, para o centro de distribuição. ?Em breve, os componentes sairão do porto para a linha de produção e, lá mesmo, teremos uma área de estoque e logística para distribuir o produto final no mercado?, explica Luciano. ?Quero que meus clientes se preocupem apenas em desenvolver as fórmulas do produto?, afirma.
Dupla dinâmica: Luciano (à esq.)e Fernando Luft comandaram a virada
da pequena transportadora em uma gigante da logística
A rigor, a Luft já encontrou a sua. ?Cobrir toda a cadeia logística?, diz Luciano. Pode parecer apenas um conceito de negócios, mas, dessa forma, a empresa saltou de um faturamento de R$ 19 milhões, em 1994, para R$ 800 milhões no ano passado. A meta de 2010 é chegar a R$ 1 bilhão. ?Nós não visualizamos curva, só crescimento?, diz Fernando Luft.
A julgar pela trajetória da empresa, não parece exagero. Até o início dos anos 90, a companhia fazia só o transporte de produtos até os sócios perceberem que poderiam faturar mais explorando outros segmentos. Em 1994, a empresa passou a atuar com um modelo de cadeia de abastecimento. Em vez de usar dez caminhões para distribuir produtos de clientes diferentes na mesma loja, o grupo passou a aproveitar o mesmo veículo para dez clientes. Daí em diante, se especializou nas mais diversas cadeias de produção e criou empresas para atuar em cada área.
?Antes a logística era vista como custo. Hoje, é oportunidade de negócios?, diz André Duarte, professor do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. A rede Fnac que o diga. Com um mix de 300 mil produtos, 100 mil deles entrando em suas nove lojas todos os dias, ela possuía um departamento de logística. ?Mas não tínhamos expertise?, diz Marco Aurélio Moschella, diretor da Fnac Brasil.
De olho nisso, a Luft criou uma nova empresa só para atender a Fnac, a Luft Solutions. ?Eles fizeram um projeto sob medida?, diz Moschella. Além de gerenciar todos os estoques, os funcionários da companhia etiquetam os produtos, digitalizam as músicas dos CDs que são tocadas nas lojas e são obrigados a ter um nível de eficácia acima da média. ?Nosso contrato prevê remuneração reduzida para a Luft no caso de atrasos nas entregas?, diz Moschella. ?A porcentagem de acerto deles é de 99,8%.?
Para as redes de fast-food Bob?s, Subway e Pizza Hut, outros clientes da Luft, o serviço é mais sofisticado. A empresa criou um departamento de compras que movimenta cerca de R$ 140 milhões por ano só para essas três marcas. ?Desenvolvemos fornecedores e compramos guardanapo, detergente e outros produtos?, diz Luciano. ?Quando assumimos, o Bob?s tinha 60 dias de estoque para 150 lojas. Atualmente, o estoque é de cinco dias para abastecer 500 lojas.?
O mercado de logística só passou a ser visto como crucial pelas empresas há pouco mais de dez anos. ?Em 1997, apenas 12% das empresas listadas na bolsa tinham diretorias de operação que trabalhavam a logística?, diz Duarte, do Insper. ?Hoje, o índice é de 40%.? O crescimento do setor se deu por dois motivos. O primeiro foi a estabilidade econômica conquistada a partir do Plano Real. ?As empresas começaram a se preocupar mais com eficiência?, diz Paulo Fleury, diretor do Instituto Ilos. O segundo quesito crucial foi o avanço dos sistemas de TI, que proporcionaram maior controle dos estoques. ?O setor de logística explorado por empresas tem crescido a uma média de 40% ao ano?, diz Fleury.
Uma das apostas da Luft para pegar carona nesse crescimento do mercado é o varejo farmacêutico. A empresa, que possui uma joint venture com a italiana Bomi, construiu um armazém de 72 mil metros quadrados em Itapevi (SP), considerado um dos mais modernos do mundo. O local é usado por grandes indústrias do setor como centro de distribuição. Dali, os remédios são levados para caminhões e transportados para os armazéns das redes de drogarias.
A meta da Luft é também trazer os varejistas para a Bomi. ?Aí, é só transportar os medicamentos de uma área do armazém para outra. Queimamos uma etapa e mandamos diretamente para as lojas do cliente?, diz Fernando. ?Assim, integramos indústria, atacado e varejo em um só lugar.? Em março, eles já começam a fazer isso com as farmácias do grupo Pão de Açúcar. ?São menos caminhões nas ruas, mais economia para as redes e menor impacto ambiental?, explica Fernando.
Essa, aliás, é uma preocupação da companhia. A Luft é, atualmente, uma das mais experientes na área de logística reversa, que consiste em trazer embalagens usadas no caminhão que, em tese, voltaria vazio. Um de seus clientes é o Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (Inpev), que coordena um programa para retirar do mercado embalagens de produtos agrícolas. ?Recolhemos 94% das embalagens existentes no campo.
Desde 2002, já são quase 140 mil toneladas?, diz João César Rando, presidente do Inpev. Como funciona? Existem mais 400 unidades de recebimento distribuídas em todo o País, onde os agricultores entregam as embalagens. Lá, elas são retiradas pelos caminhões da Luft e dali vão para a reciclagem. Mais um problema que se transformou em um negócio.