08/06/2004 - 7:00
O café de Armínio Fraga nem bem foi inaugurado e já caiu na boca (debochada) do mercado. Dizem que ali não se toma café expresso, bebe-se café spread. Pedido em dois tamanhos: na xicrinha ou no Copon. Armínio e seu sócio, Oswaldo Aranha, um empresário com 35 anos de experiência no comércio de café, divertem-se com a piada enquanto bebericam o saboroso cafezinho da casa numa mesa de canto do Rubro Café, a cafeteria gourmet aberta pela dupla na semana passada. A empreitada é séria, mas dispensa a sisudez
que se associava a Armínio em seus dias de presidente do Banco Central e, em menor grau, na pele de administrador de fundos da Gávea Investimentos. De sisudo realmente não há nada neste belo café na degradada Rua da Quitanda, uma viela estreita do centro velho carioca. O espaço é pequeno, mas bem aproveitado. Um balcão sem bancos, com a cafeteira, os salgados e os doces; mesas de madeira
clara e cadeiras cor de laranja. Na parede do fundo, o bonito painel modernista O Café, de Luiz Ventura, ?o pintor da gente?. Completa o ambiente, um jogo de
sofás de couro preto e mesinhas com os jornais do dia. O som é jazz, e o cheiro, claro, de expresso bem tirado.
O Rubro Café é um projeto antigo de Fragas e Aranhas, famílias amigas de longuíssima data. ?O Vado me conheceu de calça curta?, conta Armínio, apontando para o companheiro mais velho, que passou a vida negociando café em praças como Rio, São Paulo e Londres. Nas últimas décadas, porém, as calças de Armínio cresceram, acompanhadas por seu lustroso currículo, seu prestígio no mercado e seu talento para fazer dinheiro. Daí que seu recém-revelado interesse por café tem razões palpáveis. Os países produtores dos grãos vermelhos que servem de matéria-prima para este pequeno ouro negro exportam apenas US$ 5 bilhões por ano. Já o produto torrado, moído, embalado e vendido nas mesas do mundo todo gira US$ 80 bilhões anualmente. ?É uma margem (de 16 vezes o valor do insumo) que vale a pena explorar?, avalia Armínio.
A loja da Rua da Quitanda é a base inicial para essa exploração. Seu papel é o de piloto do que deverá ser uma rede de cafés, possivelmente em sistema de franquias. ?A Starbucks faz uma coisa similar e tem 7 mil lojas no mundo?, sugere Armínio, um velho apreciador de café, que reduziu seu consumo diário de oito ansiosas xícaras nos tempos do BC para duas (bebidas com prazer) agora. Mais do que isso, a cafeteria no centro do Rio é só a ponta visível do iceberg. Abaixo da superfície, há uma torrefação cuja produção já pode ser encontrada, com o rótulo Rubro Café, em supermercados (rede Zona Sul), restaurantes e hotéis do Rio ? um mercado praticamente virgem quando se trata de café de qualidade. A lógica, a partir daí, seria atacar São Paulo e os demais mercados nobres brasileiros, enfrentando rivais como Illy e Lavazza antes de iniciar um projeto de exportação. Armínio sugere, porém, que é possível queimar etapas e partir antes para a internacionalização.
Fera do mercado financeiro, o ex-garoto-prodígio de George Soros é quase um neófito na economia real. Seu único investimento no chamado setor produtivo foi a compra de uma participação na editora Nova Fronteira, há quase seis anos. Agora, com o café, seu envolvimento com o negócio (cujos números os sócios mantêm em segredo) será maior. Mas Armínio seguirá sendo, fundamentalmente, um financista. A Gávea vai muito bem com seus dois fundos de investimento e, desde a semana passada, é objeto de comentários sobre a possível criação de um private bank. Armínio admite que já foi abordado por pessoas interessadas nesse tipo de serviço, mas diz que este não é um projeto de curto prazo. Além de vender café, seu outro plano longe das mesas de operação é voltar a dar aulas, talvez já em 2005, na
PUC do Rio. Desta vez, porém, ele quer lecionar macroeconomia para a graduação. Chega de matemática e estatística.