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“Nossas empresas são exemplo para o mundo. Então, a propaganda também tem de ser” Fábrica da Embraer, em São José dos Campos

 

DINHEIRO – Não é a primeira vez que a DM9DDB ganha o prêmio de Agência do Ano em Cannes. A sensação é diferente este ano?
SERGIO VALENTE –
Estamos radiantes. Qualquer agência que tenha voltado com um leão este ano deve se sentir duplamente feliz, pois foi um ano muito difícil. Em 2001, o regulamento do festival foi alterado e tudo se tornou mais complicado, mais criterioso. Além disso, com a queda do número de inscrições, a qualidade exigida pelo júri aumentou bastante. Os jurados estavam muito exigentes. É a quarta vez que ganhamos nessa categoria, sendo que uma delas foi o prêmio de Agência do Ano em Internet, o que é extremamente gratificante também.

DINHEIRO – A agência ganhou um prêmio em Cyber, uma categoria hegemônica para o País, mas que em 2009 só rendeu dois leões ao Brasil. O que aconteceu?
VALENTE –
Há cerca de dois anos, a comunicação online ganhou uma notoriedade muito maior dentro dos grandes anunciantes. Eles passaram a anunciar mais nesses meios. E, mesmo que isso corresponda a 2% da verba de marketing, trata-se de verbas enormes e isso eleva a qualidade dos trabalhos e a dificuldade de se ganhar um leão. O Brasil ainda lida com verbas muito menores. Nós ganhamos com um banner muito legal para a Cia Athletica, mas a agência que levou o Grand Prix concorreu com um filme para internet que deve ter custado em torno de US$ 2 milhões.

 

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“O Nizan nunca diz quando, apenas diz que as coisas acontecerão” Nizan Guanaes, presidente do Grupo ABC

 


DINHEIRO – O padrão de investimento dos anunciantes em internet lá fora é ainda muito superior ao dos brasileiros?
VALENTE –
O padrão de investimento lá fora é superior ao do Brasil como um todo, quando se trata de comunicação. Em internet, mais ainda. Nós também não estamos no mesmo padrão que eles de uso da internet. A penetração da rede, apesar de grande, é muito maior nos EUA, na Inglaterra, no Japão, e isso faz os investimentos serem superiores também. Mas tenho fé que chegaremos lá.

DINHEIRO – Em 2008, vocês não ganharam nenhum prêmio em Cannes. O que aconteceu?
VALENTE –
O foco fez toda a diferença. Quando voltei de Cannes no ano passado, passei o trajeto todo com o laptop aberto estruturando um plano de trabalho. Não acreditava no que tinha acontecido e decidi que tudo iria mudar. Cannes não é a coisa mais importante do mundo, mas é a mais difícil. E, quando se almeja a coisa mais difícil, se consegue tudo o que está ao redor dela. Na entrada da DM9, há cinco totens para os cinco prêmios mais importantes que já recebemos. Três de agência do ano e dois Grand Prix. Mandei construir um totem vazio ao lado deles e disse que colocaria ali mais um prêmio como aqueles. Todos diziam que eu estava maluco. Como eu poderia almejar um prêmio tão alto depois de um ano tão ruim? Mas isso acabou sendo desafiador para todo mundo e a agência inteira começou a melhorar seu trabalho. E, com isso, o resultado para os clientes melhorou e eles ficaram mais satisfeitos. Clientes satisfeitos aprovam coisas mais ousadas. Assim, tivemos a oportunidade de aprovar coisas mais relevantes para o festival. E, mesmo que eu tenha almejado Cannes, uma das coisas que mais me deixaram feliz foi quando, em janeiro deste ano, ganhamos uma medalha no The One Show, o prêmio mais difícil que existe, com um filme que fizemos para o Terra. Coloquei na cabeça que teria que trabalhar como atleta de Olimpíada. Quando um atleta treina, ele não sabe se vai ganhar, mas treina para isso. E no caminho até a Olimpíada começa a ganhar um monte de outras competições e bater recordes. E é mais ou menos isso que eu tinha em mente.

DINHEIRO – E o que o sr. fez para inserir esse pensamento na agência?
VALENTE
– Sabia que tínhamos talento, mas estava faltando foco, liderança, coordenação. Então me aproximei mais dos projetos, dos profissionais e acompanhei de perto a evolução disso. Quando cheguei de Cannes, fui durante a noite na agência, coloquei o leão no totem, filmei e mandei para o email de todos. No dia seguinte, toda a equipe viu e ficou muito emocionada. E agora esse modelo está instaurado. O sentimento de continuidade está implementado e é só continuarmos alimentando isso, dando foco e ferramentas para todos poderem trabalhar. Recentemente criamos o Fini 9, um programa de financiamento com juros subsidiados para que os profissionais possam pagar cursos, MBAs, enfim, o que eles quiserem. Das 16 pessoas da agência que foram para Cannes, nenhuma foi com verba da agência. Todas usaram o Fini 9. Virou uma coisa orgânica.

DINHEIRO – A DM9 que ganhou o prêmio de agência do ano pela primeira vez em 1998 é a mesma de hoje?
VALENTE –
É o mesmo espírito, mas obviamente é uma outra realidade. O mercado mudou, os profissionais mudaram, a economia está em constante mutação. Mas, apesar de a mudança ser iminente, preservamos nossos valores: a criatividade, a agressividade, a ousadia. O lema da agência é encantar o mundo com o valor e o poder das nossas ideias. E é isso que perseguimos.

DINHEIRO – O modelo de negócio das agências brasileiras terá que mudar?
VALENTE
– O modelo de negócio das empresas muda, então é normal que o das agências também. Mas no Brasil já temos um modelo vitorioso, com profissionais capacitados, uma indústria de propaganda relevante e alavancadora da economia. Como se diz na Bahia, quem fica parado é poste. Então é preciso estar ligado às mudanças de mercado para continuar com esse modelo vitorioso. Acredito em um modelo onde tudo está dentro da agência, onde digital trabalha junto com impresso. Recentemente, quebramos o modelo de duplas de criação e criamos trios que trabalham em conjunto com um profissional de convergência (internet). Assim, os projetos já nascem integrados, vitoriosos.

DINHEIRO – A propaganda brasileira é exemplo para o resto do mundo?
VALENTE
– O Brasil é exemplo para o resto do mundo, não só a propaganda. O sistema bancário brasileiro, o projeto de combate à Aids, os projetos de inclusão social nos quais se trazem consumidores para o mercado, como o Bolsa Escola e o Bolsa Família, tudo isso é exemplo para o resto do mundo. A moeda estável, empresas como a Embraer, o Itaú Unibanco, a AmBev, a Sadia- Perdigão são grandes exemplos de empresas e nós anunciamos para elas, então não tem como não sermos exemplos também. Claro que existem problemas, mas o foco deste país é a construção do presente, e isso está sendo feito muito bem.

DINHEIRO – Arriscaria prever o futuro da propaganda impressa?
VALENTE –
A única coisa que prevejo é que ela existirá. Tenho uma visão muito clara no que diz respeito às mídias. Elas não morrem, apenas se reposicionam. Veio o jornal, depois o rádio, as revistas, a tevê. E, conforme novas mídias foram surgindo, as existentes sempre se reposicionaram. Nesse contexto, cada uma terá que encontrar seu novo papel e o anunciante terá que se ajustar a isso. E o dever do publicitário é estar atento a esse reposicionamento para encontrar novas formas de utilizar os meios e propagar os valores de uma marca.

DINHEIRO – Conar é controle ou censura?
VALENTE
– Autocontrole, autolegislação, uma forma de regular. Controle é uma palavra muito forte, pois dá a impressão de que não se tem liberdade, e censura é aquilo que oprime. O Conar nos entrega uma regulamentação, um modus operandi, uma forma de agir e pensar. É uma enorme prova de maturidade do mercado brasileiro de publicidade. Significa que temos capacidade e integridade de fiscalizar nossa indústria.

DINHEIRO – É verdade que o Nizan (Guanaes, presidente do grupo ABC) irá para Nova York e o sr. comandará o grupo no Brasil, ao lado do Guga Valente?
VALENTE
– Todos esses são projetos que, à medida que vão se tornando possíveis, vão se tornando reais. O que o Nizan sinaliza são os rumos para onde as coisas irão. Qualquer empresa tem planos para o futuro. Só que o estilo do Nizan é declarar seus planos. O ABC é o 20º maior grupo de comunicação mundial (segundo o levantamento da Advertising Age), então o mundo é um caminho de crescimento natural. Alguma liderança forte precisa desbravá-lo e o Nizan é o cara próprio para isso. Ele está pronto para esse papel. Ainda não sei quando. Ele nunca diz quando, apenas diz que as coisas acontecerão.

DINHEIRO – E o sr. está pronto para quando acontecerem?
VALENTE
– Estou pronto para me preparar para assumir esse desafio. No dia em que assumi a presidência da DM9, em 2004, não sei se estava pronto. Mas tinha fé que poderia estar. Quando coloquei o totem na entrada da agência, não sei se estava preparado para ser agência do ano. Mas é como eu sempre digo: coloque o chapéu onde o braço não alcança e você se sentirá obrigado a fazer seu braço crescer.