É como procurar uma agulha no palheiro – uma cápsula de prata de 8 mm por 6 mm, não maior que uma moeda, que se acredita estar perdida em algum lugar ao longo de uma vasta rodovia deserta no maior estado da Austrália.

A mineradora Rio Tinto emitiu um pedido de desculpas na segunda-feira dizendo que estava apoiando os esforços do governo estadual para encontrar a cápsula, que contém Césio-137, uma substância altamente radioativa usada em equipamentos de mineração.

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A Rio Tinto disse que verificou todas as estradas de entrada e saída da mina de Gudai-Darri, no remoto norte da Austrália Ocidental, onde o dispositivo foi localizado antes de um empreiteiro recolhê-lo para a viagem ao sul até a capital do estado, Perth.

As autoridades acreditam que a cápsula, que emite raios gama e beta, caiu da traseira de um caminhão que percorreu uma seção de 1.400 quilômetros da Great Northern Highway – uma distância maior que a costa da Califórnia.

Devido ao tamanho minúsculo da cápsula e às enormes distâncias envolvidas, as autoridades alertam que as chances de encontrá-la são pequenas.

E há temores de que ele já tenha sido levado para longe da zona de busca, criando um risco radioativo para a saúde de qualquer um que o encontre nos próximos 300 anos.

Como sumiu
As autoridades estaduais deram o alarme na sexta-feira, alertando os moradores sobre a presença de um derramamento radioativo em uma faixa do sul do estado, inclusive nos subúrbios do nordeste de Perth, capital do estado, lar de cerca de 2 milhões de pessoas.

Segundo as autoridades, a cápsula foi colocada dentro de um pacote em 10 de janeiro e recolhida da mina Gudai-Darri da Rio Tinto por um empreiteiro em 12 de janeiro.

O veículo passou quatro dias na estrada e chegou a Perth no dia 16 de janeiro, mas só foi descarregado para inspeção no dia 25 de janeiro – quando foi dado como desaparecido.

“Ao abrir a embalagem, constatou-se que o medidor estava quebrado, faltando um dos quatro parafusos de fixação e faltando também a própria fonte e todos os parafusos do medidor”, informou o Departamento de Bombeiros e Serviços de Emergência (DFES).

Eles acreditam que fortes vibrações causadas por estradas esburacadas danificaram o pacote – desalojando um parafuso de montagem que o mantinha no lugar.

Quão perigoso é?
Especialistas alertaram que o césio-137 pode criar sérios problemas de saúde para os seres humanos que entram em contato com ele: queimaduras na pele por exposição próxima, doenças causadas pela radiação e riscos potencialmente fatais de câncer, especialmente para aqueles expostos inconscientemente por longos períodos de tempo.

A Radiation Services WA, uma empresa que fornece conselhos sobre proteção contra radiação, diz que ficar a menos de um metro da cápsula por uma hora forneceria cerca de 1,6 milisieverts (mSv), tanto quanto cerca de 17 radiografias de tórax padrão.

Pegar a cápsula causaria “danos graves” aos dedos e tecidos circundantes, disse a empresa em comunicado.

Ivan Kempson, professor associado de Biofísica da University of Southern Australia, disse que o pior cenário seria uma criança curiosa pegar a cápsula e colocá-la no bolso.

“Isso é raro, mas pode acontecer e já aconteceu antes”, disse Kempson. “Houve alguns exemplos anteriores de pessoas que encontraram coisas semelhantes e sofreram envenenamento por radiação, mas eram muito mais fortes do que a cápsula atual que está faltando”.

“Estamos todos expostos a um nível constante de radiação das coisas ao nosso redor e dos alimentos que comemos, mas a principal preocupação agora é o impacto potencial na saúde da pessoa que encontrar a cápsula”.

Quão raro é perder um dispositivo radioativo?
O incidente foi um choque para os especialistas, que disseram que o manuseio de materiais radioativos como o Césio-137 é altamente regulamentado com protocolos rígidos para seu transporte, armazenamento e descarte.

A Rio Tinto disse que transporta e armazena produtos perigosos regularmente como parte de seus negócios e contrata empreiteiros especializados para lidar com materiais radioativos. A minúscula cápsula fazia parte de um medidor de densidade usado na mina Gudai-Darri para medir a densidade do minério de ferro alimentado no circuito de britagem, informou a empresa em comunicado.

Radiation Services WA diz que substâncias radioativas são transportadas por toda a Austrália Ocidental diariamente sem problemas. “Neste caso, parece haver uma falha das medidas de controle normalmente implementadas”, disse, acrescentando que nada teve a ver com a perda da cápsula.

Pradip Deb, professor e oficial de segurança contra radiação da RMIT University em Melbourne, disse que a perda da cápsula foi “muito incomum”, pois as regras de segurança australianas exigem que sejam transportadas em caixas altamente protetoras.

O nome da empresa de logística usada para transportar o dispositivo não foi divulgado, disse a Rio Tinto.

O que acontece se não for encontrado?
O césio-137 tem uma meia-vida de cerca de 30 anos, o que significa que, após três décadas, a radioatividade da cápsula cairá pela metade e, após 60 anos, cairá pela metade novamente.

Nesse ritmo, a cápsula pode ser radioativa pelos próximos 300 anos, disse Deb, da RMIT University.

“O césio-137 é normalmente uma fonte selada – ou seja, se não for quebrada, não contaminará o solo ou o meio ambiente… Se a cápsula nunca for encontrada, não contaminará ou transferirá radioatividade para o solo circundante”, acrescentou Deb.

Kempson, da University of Southern Australia, disse que, se permanecer perdido em uma área isolada, “será muito improvável que tenha muito impacto”.

A Rio Tinto, uma das maiores gigantes da mineração do mundo, tem enfrentado controvérsias nos últimos anos por alegações de abuso no local de trabalho, bem como pela destruição de cavernas indígenas sagradas em 2020 – o que levou à renúncia do então CEO Jean-Sébastien Jacques.

A destruição das cavernas de Juukan Gorge na Austrália Ocidental continuou, apesar de uma batalha dos guardiões locais da terra.