05/06/2025 - 7:46
Na esteira da guerra em Gaza, entidade registrou 8,2 mil episódios, média de 23 casos por dia – a maioria de viés anti-israelense. Estatísticas abrangem violência física extrema, ataques, ameaças, vandalismo e ofensas.A Alemanha registrou em 2024 aumento de 77% nos casos de antissemitismo em relação ao ano anterior. Com 8.627 registros – média de mais de 23 casos por dia –, trata-se do maior número desde o início da série histórica, em 2020, segundo relatório apresentado nesta quarta-feira (04/06) pela Associação Nacional de Centros de Pesquisa e Informação sobre Antissemitismo (Rias).
O número abarca tanto episódios de violência física extrema (8), ataques (186) e ameaças (300) quanto de vandalismo (443) e “comportamento ofensivo”, esta última com 7.514 registros, sendo 1.802 manifestações com discurso de ódio de motivação antissemita. Dos 8,6 mil casos, 1.309 visavam pessoas específicas judias ou de nacionalidade israelense, outros quase 2 mil ocorreram em ambiente digital.
Segundo a Rias, o aumento vem após uma trajetória de crescimento acentuado dos casos de antissemitismo já em 2023, quando a média foi de 13 episódios por dia. Em outubro daquele ano, um atentado terrorista contra Israel capitaneado pelo grupo palestino Hamas deixou mais de 1,2 mil mortos e resultou no sequestro de outras 250 pessoas. O episódio deflagrou a atual guerra na Faixa de Gaza e uma onda de antissemitismo.
“Com a guerra em Gaza e o sofrimento insuportável da população civil palestina, o apoio à ação do governo israelense também desmoronou aqui [na Alemanha]”, afirmou o presidente da Rias, Benjamin Steinitz, ao apresentar os dados em Berlim. A “triste consequência” disso, acrescentou, é que “judias e judeus são constantemente responsabilizados pela conduta do governo israelense”.
Reflexo disso, aponta a Rias, é que a maior parte dos casos (5.857) foram associados pela entidade ao “ativismo anti-israelense”, e muitos ocorreram em “contextos fortemente politizados”, como em manifestações, escolas (284) e universidades (450).
“Muitos de meus colegas universitários judeus não se sentem mais seguros nas universidades”, disse o presidente da Associação de Estudantes Judeus da Alemanha, Ron Dekel, ao defender que cada universidade no país tenha um encarregado de combate ao antissemitismo.
Mas também os casos atribuídos à extrema direita tiveram crescimento expressivo, com 544 episódios – o maior patamar desde 2020.
“O risco de ser hostilizado como judeu na Alemanha frequentemente aumentou de forma objetiva desde 7 de outubro, e ainda assim parece que damos mais importância a debates sobre o que é uma declaração antissemita do que à empatia com os afetados”, criticou Steinitz.
Segundo Steinitz, a solidariedade com as vítimas do atentado do Hamas e pessoas que sofrem antissemitismo não impede as pessoas de se compadecerem com a situação dos palestinos em Gaza e de criticarem o governo israelense.
Exemplos de casos registrados pela Rias
Um dos casos de violência extrema registrado pela Rias é o de um estudante judeu brutalmente espancado no início de 2024 por um colega de faculdade. Outro é o de um esfaqueamento em massa em Solingen cometido por um apoiador do grupo terrorista “Estado Islâmico” que afirmou ter agido por causa da guerra em Gaza, bem como um atentado contra o Consulado-Geral de Israel em Munique.
Já entre os 186 ataques está o caso de uma jovem judia em Oldenburg detida por dois homens e xingada quando voltava da escola, assim como o de um trio agredido fisicamente num parque de Leipzig por um grupo de extremistas de direita que gritou “judeu de merda”. Outro registro é do uma mulher ofendida e empurrada por um homem na Saxônia porque carregava uma sacola que estampava a frase “sionista feminista”.
Dentre os 443 registros de vandalismo, 50 visaram as casas ou vizinhança imediata de judeus, como um casal em Hamburgo que viu sua porta ser marcada com duas suásticas, e uma terceira pessoa que teve a fachada de casa em Leipzig pichada com uma estrela de Davi.
“Ódio contra judeus foi normalizado”
Encarregado do governo federal alemão para combate ao antissemitismo, Felix Klein destacou que a alta em 2024 é “especialmente surpreendente” porque revela que o ódio contra judeus “foi normalizada a um nível vergonhoso”.
Em entrevista à DW, ele pontuou que, apesar de o antissemitismo anti-israelense estar em alta, outras formas persistem e seguem sendo uma ameaça. “Os extremistas de direita seguem ativos. Há atividades perigosas para o Estado de grupos de direita na Saxônia”, citou. Klein também ressaltou que tentativas de relativizar o nazismo ao compará-lo com a política atual são “inaceitáveis”.
Para o presidente do Conselho Central dos Judeus, Josef Schuster, o relatório da Rias demonstra que o cotidiano de muitos judeus é, “cada vez mais, marcado por ódio e hostilidades”.
Fundada em 2018 e financiada pelo governo alemão, a Rias documenta casos de antissemitismo em toda o país desde 2020. As estatísticas se baseiam em registros apresentados por vítimas ou testemunhas, e a entidade afirma que há subnotificação.
ra/cn (AFP, dpa, DW)