DINHEIRO ? O Brasil fechará o ano com cerca de 85 milhões de telefones celulares. Qual o limite desse mercado no País?
ENRIQUE USSHER ?
Chegaremos em dezembro com 50% da população brasileira carregando um celular. Esse número deve pular para cerca de 100 milhões no final de 2006. O que mais poderá ser feito nesse mercado é uma resposta que vai depender muito do apetite das operadoras. Temos produtos que chegam ao consumidor a partir de R$ 100, vendidos em até 10 parcelas. Mas os aparelhos de baixo valor e com poucos recursos não dão lucro para as empresas.

DINHEIRO ? E o que dá lucro?
USSHER ?
É preciso investir cada vez mais em novidades tecnológicas e serviços sofisticados de transmissão de imagem, por exemplo, e tentar vender modernidade aos consumidores. Atualmente, cerca de 80% dos aparelhos vendidos são
na faixa de R$ 150.

DINHEIRO ? Foi para isso que a Motorola decidiu lançar um fundo de investimentos no valor de R$ 400 milhões?
USSHER ?
Sim. Esses recursos, lastreados em recebíveis da Motorola, vão ajudar o mercado a absorver produtos com alto valor agregado. Com esse fundo, poderemos ampliar o prazo de financiamento para nossos clientes, no caso as operadoras, facilitando a comercialização dos modelos mais sofisticados e com mais tecnologia.

DINHEIRO ? Esse fundo foi feito sob medida para o Brasil ou repete uma experiência da companhia em outros mercados?
USSHER ?
Trata-se de um produto direcionado especificamente para as necessidades do Brasil, porque atende a questões específicas do País.

DINHEIRO ? O crescimento dessa indústria pode se sustentar apenas com a troca de aparelhos?
USSHER ?
Sem dúvida. O celular se transformou em um acessório como relógio e sapato. Hoje a tecnologia já faz parte do DNA das pessoas. O marketing funciona muito bem e atrai os consumidores para a atualização, para a modernização.

DINHEIRO ? Isso quer dizer que esse é um setor que não tende à saturação?
USSHER ?
Para se ter uma idéia, na Europa, por exemplo, a taxa de penetração dos celulares é de 110%, ou seja, em alguns países já existem mais aparelhos do que habitantes. Para nós, da indústria, o ideal é que as pessoas vejam o celular como um acessório de moda, usando um modelo diferente para cada ocasião.

DINHEIRO ? O ministro das Comunicações, Hélio Costa, acredita que as operadoras não deveriam entrar no mercado de transmissão de imagens para celular. O sr. concorda?
USSHER ?
É muito complicado dizer sim ou não em questões desse tipo. O certo é que a tecnologia vai abrir caminhos e o Brasil não pode ficar de fora. Vivemos em um mundo globalizado e não temos como evitar que as inovações cheguem por aqui. Principalmente quando elas ocorrem em benefício do País.

DINHEIRO ? Mas essa postura do governo, de certa forma, não inibe os investimentos no setor?
USSHER ?
Eu espero que não. Creio que estamos diante de um processo de aprendizado. Mas quem sou eu para dizer que rumo o governo deve tomar.

DINHEIRO ? Apesar dos avanços na telefonia, o acesso à internet ainda caminha lentamente no Brasil, mesmo com o governo dispondo de um fundo, o Fust, com R$ 4 bilhões para investir na inclusão digital…
USSHER ?
Acho que o Brasil está perdendo uma grande oportunidade ao deixar esses recursos parados. Mas a decisão depende apenas do governo. O fato é que as autoridades deveriam acelerar esse processo. Talvez os grandes culpados sejam os fabricantes de equipamentos e os empresários de telecomunicações que não souberam explicar ao governo a importância desse segmento para o crescimento da economia brasileira.

DINHEIRO ? A demora na definição do padrão de TV digital a ser adotado por aqui representa uma espécie de gargalo para o desenvolvimento do setor?
USSHER ?
Creio que sim. O ideal seria que o Brasil tivesse a mesma rapidez dos outros países no campo tecnológico. A escolha traria novos investimentos, permitindo que o País pudesse ser até mesmo uma plataforma de exportação para muitos fabricantes. A Coréia do Sul, por exemplo, tomou a iniciativa de desenvolver a internet em banda larga e hoje é uma das nações mais avançadas no segmento.

DINHEIRO ? Como o sr. classifica de absurda a idéia de criar um padrão brasileiro de TV Digital?
USSHER ?
Não sei se é um absurdo ou uma tentativa de manter uma tecnologia localmente. Acho que esse pensamento é algo do passado. Isso só o tempo dirá.

DINHEIRO ? Quanto o senhor imagina que essas ondas tecnológicas trariam de investimentos para o Brasil?
USSHER ?
É difícil dizer o valor porque depende muito de como seria a regulamentação. De qualquer forma, nós da Motorola vamos continuar investindo. Já gastamos cerca de US$ 200 milhões apenas em pesquisa e desenvolvimento.

DINHEIRO ? E como a Motorola pretende participar desses mercados?
USSHER ?
Estamos sempre dispostos a investir conforme a necessidade e a demanda. Em menos de 10 anos, já aplicamos mais de US$ 500 milhões no Brasil. Nossa fábrica em Jaguariúna (SP) é um campus industrial e tecnológico visto mundialmente como um centro de excelência em pesquisa de telecomunicações.

DINHEIRO ? Faz parte dos planos da companhia desenvolver tecnologias 100% nacionais?
USSHER ?
Nossa plataforma produtiva é reconhecida pelas outras filiais, além da matriz. Qualquer executivo tem a obrigação de utilizar e alavancar os recursos que tem para aumentar a receita e os resultados da empresa. Essa é uma meta a ser atingida a médio e longo prazo.

DINHEIRO ? A filial já exporta tecnologia ou o parque industrial é usado apenas para desenvolver produtos para o mercado brasileiro, além de adaptar modelos criados lá fora?
USSHER ?
Hoje, todos os produtos comercializados no Brasil são produzidos localmente. Além de abastecer o mercado brasileiro, exportamos telefones celulares para os demais países da América Latina, além dos Estados Unidos. Esse ano já exportamos US$ 786 milhões. Também desenvolvemos produtos sob medida para as operadoras.

DINHEIRO ? Que novidades a Motorola pretende mostrar ainda em 2005?
USSHER ?
Lançamos na Futurecom (evento que aconteceu na semana passada, em Florianópolis) os 14 novos aparelhos que chegarão ao mercado até o final do ano. É um número maior do que apresentamos em 2004. Trouxemos, por exemplo, o Rokr, resultado da parceria com a Apple, e modelos de terceira geração, que permitem assistir a programas de televisão em tempo real.

DINHEIRO ? Os celulares com câmera fotográfica fizeram e ainda fazem bastante sucesso, principalmente entre os jovens. Em qual tipo de novidade o sr. apostaria agora?
USSHER ?
Acho que o sistema Push (que permite ao usuário captar uma imagem, por exemplo, e já enviá-la apertando apenas um botão) é uma inovação que virá com tudo.

DINHEIRO ? Há um ano a Motorola assumiu a liderança do mercado de celulares no Brasil, destronando a finlandesa Nokia. Como fazer para manter a posição?
USSHER ?
Precisamos trazer cada vez mais inovações. Para manter a liderança vamos usar as armas que temos. Em especial o conceito de Seamless Mobility que é a convergência total, a conectividade. Isso, claro, de forma que o uso desse aparelhos seja bastante simples para qualquer consumidor.

DINHEIRO ? Recentemente, a Nokia colocou no mercado brasileiro um serviço de automação residencial que tem por base o celular. A Motorola está atrasada nesse setor?
USSHER ?
Temos soluções desse tipo lá fora. São tecnologias novas que estão sendo desenvolvidas praticamente ao mesmo tempo pela maioria dos fabricantes. A Motorola leva algumas vantagens em relação aos concorrentes. Somos, por exemplo, os maiores integradores de Bluetooth e temos muitas outras inovações para apresentar. Mais do que ser o primeiro a lançar determinado produto, o importante é trazer uma tecnologia que caiba no bolso do brasileiro. Gastar um esforço tremendo, como fez a Nokia, para colocar no mercado um produto que custa R$ 20 mil não faz parte dos nossos planos.

DINHEIRO ? O sr. assume a Motorola no melhor momento da empresa no Brasil, o que aumenta a cobrança por resultados. É melhor pegar uma empresa na fase inicial ou em estágio maduro?
USSHER ?
Sem dúvida é mais difícil assumir a companhia nessa posição. O desafio é maior. Para se manter no topo é preciso trabalhar duro e buscar novas oportunidades de negócios. Essa é uma indústria muito dinâmica, que evolui rapidamente e não podemos perder o foco.

DINHEIRO ? E como será a gestão Enrique Ussher?
USSHER

? Vou trazer para a Motorola Brasil uma grande vivência em negócios. Estou na empresa desde 1989, onde convivi, por exemplo, com o início, o apogeu e o fim do segmento de pagers. Isso me deu uma ótima visão de todas as etapas de vida de uma indústria.