Embora os juros estejam em patamares historicamente altos e afetem as condições de financiamento, o CEO da Cogna, Roberto Valério, frisa que o indicador não é uma pedra no sapato tão grande e a empresa é mais dependente do nível de empregabilidade.

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Ao Dinheiro Entrevista, o executivo da Cogna conta, também, que alguns braços do negócio – mais voltados para públicos de renda mais alta – possuem maior resiliência em períodos de juros ou inflação altos.

“Olhando para alunos de Classe C, por exemplo, que estão no ensino superior. Eles estão sendo muito mais impactados pelo aumento de renda familiar e pelo baixo desemprego. Isso tem uma lógica. Um potencial aluno, se ele tem segurança de que terá emprego pelos próximos 2 ou 3 anos, tomará um projeto de longo prazo que é estudar em uma faculdade por 3 ou 4 anos”, afirma Roberto Valério, em entrevista concedida no dia 20 de outubro, antes da divulgação do resultado trimestral da companhia.

“Historicamente existe [correlação com Selic], só que eu entendo que o momento que a economia brasileira vive, de uma taxa de desemprego muito baixa e uma renda das famílias muito alta, isso tem ajudado muito os nossos negócios”, completa.

A fala está em linha com declarações de executivos de outros setores que, em tese, são afetas pela Selic mais alta. O CEO da maior incorporadora do Nordeste, a Moura Dubeux, também declarou que o emprego e a renda em alta são catalisadores de alta nos negócios, a despeito de uma taxa de juros de dois dígitos.

Sobre a resiliência de negócios de alta renda, Valério conta que os sistemas de ensino que são vendidos para escolas particulares possuem uma resiliência acima da média.

“São as famílias que pagam, basicamente, para que os filhos estudem em escolas particulares. Então essa parte do nosso negócio que representa cerca de 30% do total, é muito resiliente, sofre muito menos em períodos de alta taxa de juros”.

Alavancagem seguirá sendo cortada

O que indiscutivelmente sofre impacto de juros mais altos é o nível de endividamento das companhias – fator que inclusive tem sido decisivo para que o sell side recomende ou não algumas ações.

Todavia, a educacional reduziu drasticamente seu patamar de alavancagem em meio ao seu processo de turnaround.

A empresa saiu de uma dívida líquida que representava 3,2x seu Ebitda para atuais 1,2x Ebitda, em um processo de desalavancagem que durou cerca de quatro anos. A gestão deve manter a filosofia de disciplina financeira e mira cortar esse indicador para 1x Ebitda no curto ou médio prazo.

Inadimplência deixou de ser um problema

Juntamente com a queda na alavancagem, a companhia empreendeu um corte severo em um indicador atrelado à inadimplência. Em meados de 2020, na média, um aluno levava 142 dias para pagar a mensalidade da faculdade após estudar um mês cheio. Esse número caiu para 42 dias neste ano.

Valério aponta que foi um trabalho de ajustar várias políticas em diferentes frentes, indo desde garantir uma experiência de usuário melhor – com o boleto chegando em dia – até ser mais punitivo com alunos maus pagadores enquanto estende o braço aos bons pagadores.

“Temos uma inadimplência bem estável nos últimos 3 ou 4 anos, apesar dos balanços da economia. Nossa inadimplência é muito um ‘reloginho’, mas em função das práticas que adotamos. Muito uso de dados, muito modelo preditivo.”

A empresa adotou práticas como o que chama de desconto de pontualidade: na prática, o aluno que costuma pagar em dia tem um desconto maior, ao passo que o mau pagador, que só pagava a primeira a mensalidade da renegociação, começou a sofrer aumento de valores nos pagamentos à visa e ter uma quantia de parcelas disponíveis reduzida.

M&A é questão estratégica

Em agosto deste ano a empresa adquiriu a Faculdade de Medicina de Dourados (FMD), uma instituição de ensino superior localizada no estado de Mato Grosso do Sul (MS).

A transação foi pela cifra de R$ 54 milhões – cerca de R$ 900 mil por cadeira do curso de Medicina, preço considerado muito barato pelo sell side, embora seja um ativo em estágio relativamente embrionário.

A unidade possui 60 vagas no curso de medicina, autorizadas pelo MEC em junho de 2025. A operação deve iniciar ainda nos próximos meses.

Valério frisa que eventuais novos M&As – e não há nenhum no pipeline, no momento – devem ser parecidos com esse, mais estratégicos e que balizados por um preço visto como atrativo.

Ou seja, ainda que com o balanço limpo, a empresa não vislumbra colocar o pé no acelerador em termos de fusões e aquisições.

Desempenho das ações

Os papéis COGN3 sobem cerca de 15% no acumulado dos últimos 30 dias, negociados na casa dos R$ 3,70.

No acumulado do ano de 2025, as ações da Cogna saltam 243% – dado que começaram o ano cotadas perto de R$ 1 por papel.