28/06/2000 - 7:00
DINHEIRO ? Há duas semanas, a Igreja Universal e a direção da Vasp admitiram que estavam em negociação para venda da companhia. O negócio não foi formalmente confirmado, mas surpreendeu porque setores do Ministério do Desenvolvimento avaliavam que a Vasp não tinha condições de ser vendida. A companhia está tão mal assim?
ALCIDES TÁPIAS ? Nós não emitimos opinião sobre nenhuma das empresas, até porque não as conhecemos bem. Pedimos uma série de informações aos consultores de todas as companhias, não só da Vasp. A partir desta semana, vamos ter um mapa do setor aéreo, companhia a companhia. Nesse meio tempo, o ministro da Defesa, Geraldo Quintão, já terá definido o texto da agência reguladora. Vamos discutir com as empresas para estabelecer que tipo de alterações se pode fazer na aviação comercial que facilite o atendimento das companhias e dos usuários.
DINHEIRO ? O senhor está pensando em liberar as tarifas?
TÁPIAS ? No momento, não. Este é um processo que depende de uma série de decisões. Do contrário não se consegue um processo equilibrado. Hoje, as companhias não podem decidir as freqüências dos vôos, dos horários. Temos que olhar este conjunto de regras, onde a tarifa é um dos componentes, para olhar o que pode ser feito no conjunto. O importante é que as companhias estejam saudáveis, que exista a possibilidade de concorrência efetiva e que apresente preços adequados para os usuários.
DINHEIRO ? O setor não está praticamente quebrado, com as empresas pedindo socorro ao governo?
TÁPIAS ? No passado, essas companhias já estiveram melhor. Aqui, como em outros países, o usuário é muito sensível ao preço. Hoje, o passageiro não escolhe horário, escolhe preço. Temos quatro companhias. É só ajustar a gestão delas, para que sejam administradas de maneira racional e econômica. Não se trata de proteger os empresários de menor competência, mas oferecer uma oportunidade para prestarem bons serviços, preço adequado da passagem e rentabilidade na empresa.
DINHEIRO ? As empresas querem ajuda financeira?
TÁPIAS ? Para dizer com sinceridade nenhuma delas pediu dinheiro, nem foi ao BNDES. É natural que se alguém desejar fazer alguma operação um pouco mais substancial, seja de fusão ou de compra, provavelmente precisará de ajuda financeira que não será negada. Mas ela tem que estar calçada num plano de negócio que indique que é uma cooperação viável economicamente.
DINHEIRO ? Qual o teto para ajuda a estas empresas?
TÁPIAS ? O máximo é 20% do patrimônio do BNDES. É um teto muito alto. Isto dificilmente seria atingido por alguém. Se vier alguma coisa, tipo fundo perdido, esqueçam. Alguma coisa fantasiosa, visionária, também esqueçam.
DINHEIRO ? O que o senhor chama de coisa fantasiosa e visionária?
TÁPIAS ? É ter um fluxo de caixa calculado em cima de uma possibilidade de mercado que qualquer pessoa razoável conhecimento considere difícil de atender. Isso nós não aprovaríamos. Só aprovaremos proposta prudente que reflita o mercado como nós vemos hoje.
DINHEIRO ? O senhor considera o setor de aviação estratégico, onde o capital estrangeiro não pode entrar?
TÁPIAS ? Existe uma questão de integração nacional. A aviação é um dos pontos mais importantes neste aspecto. Na Amazônia, por exemplo, só se chega de avião ou de barco. Então, veja como isso é importante. As pessoas que moram lá precisam se integrar com o resto do País e nós precisamos ter presença nessa região. Esse mercado não é aberto em todos os países. Eu não sei por que teremos de abrir para o capital estrangeiro. Eu não vejo necessidade.
DINHEIRO ? O senhor, então, é contra a entrada do capital estrangeiro?
TÁPIAS ? Essa é uma discussão que não considero relevante. Passamos por momentos históricos dos mais variados, que elegeram prioridades diferentes. Havia proteção legal na área de petróleo. Hoje em dia já se flexibilizou e outras empresas podem fazer a exploração. O serviço bancário era prerrogativa de capitais brasileiros. Hoje muitos bancos estrangeiros vieram para cá. Se uma empresa vem para cá, cria riqueza, gera empregos, paga impostos… Por que perguntar o endereço do dono dessas empresas? Na questão da aviação, acho que, com o tempo, alguns anos mais tarde, pode ficar diferente. Hoje, a legislação não permite que uma empresa estrangeira tenha mais de 20% de uma companhia aérea brasileira.
DINHEIRO ? O senhor considera necessário uma mudança no modelo de privatização?
TÁPIAS ? A privatização de Furnas (a venda será pulverizada e os recursos resultantes serão usados na infra-estrutura) servirá de modelo. Ainda precisamos arrecadar. Mas, acima de tudo, precisamos gerar outros produtos que nos permitam crescer de maneira ordenada. Precisamos desenvolver o mercado de capitais. Essa é a maior contribuição que a privatização pode dar ao País. Ela tem de ser indutora do mercado de capitais no Brasil. Temos que colocar as ações de uma grande companhia estatal nas mãos do maior número possível de brasileiros. Esses brasileiros poderão usar o Fundo de Garantia e ter facilidades para comprar de forma financiada, com juros simbólicos. Esperamos criar no brasileiro o hábito de investir em ações.
DINHEIRO ? A Petroquímica é outro setor estratégico. De que forma o governo está redesenhando o setor?
TÁPIAS ? A Petroquímica nós já definimos. O grupo Odebrecht recuou da idéia de participar da compra da Copene, no pólo petroquímico de Camaçari, na Bahia. Provavelmente se concentrará no Sul, na Copesul, em sociedade com o grupo Ipiranga. É possível que eles fiquem ou não com a participação da petroquímica em sociedade com Emílio (Emílio Odebrecht) lá no Sul. Isto é o que eu imagino.
DINHEIRO ? Mas o favorito é o grupo Ultra. Até o PFL, do senador Antônio Carlos Magalhães, já deu o sinal verde…
TÁPIAS ? É. Na verdade, diria que esse é um processo que não tem um envolvimento político. O envolvimento é mais técnico. O grupo Ultra, inclusive, quando apresentou seus projetos para Camaçari ao BNDES, se comprometeu a fazer novos investimentos. Pode ser que apareça outro na hora do leilão. Nada contra.
DINHEIRO ? O setor não corre o risco de acabar cartelizado?
TÁPIAS ? Não. O setor fica com um desenho interessante para o País. Vamos ter vários grupos interessados, num processo de concorrência, para que você não tenha nenhum cartel. Teremos investimento nacional, feito aqui, para que se evite no futuro a importação de produtos petroquímicos. A idéia é ter uma central grande em Camaçari, uma outra grande em Porto Alegre, e uma central grande em Cubatão.
DINHEIRO ? Quais os outros setores produtivos que o Ministério do Desenvolvimento está modificando?
TÁPIAS ? Estamos trabalhando na separação da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) da Vale do Rio Doce. Temos a nossa atenção voltada para a questão da exportação. O papel e celulose é um deles. A questão dos minérios, outra. Estamos também de olho no suco. Estamos olhando de perto o setor de açúcar e álcool com o ministro da Agricultura, Pratini de Moraes. O nosso ministério é de coordenação. Fizemos adaptações no Brasil empreendedor que é um sucesso. Outro programa é do fórum de competitividade. Estamos observando cada cadeia produtiva, avaliando os pontos bons e ruins. Os ruins serão eliminados. Os bons potencializados. Já avaliamos a cadeia produtiva da construção civil e do setor têxtil.
DINHEIRO ? O que de prático avaliou-se nesses dois setores industriais?
TÁPIAS ? Na construção civil, por exemplo, constatamos que um dos fatores que oneram muito o custo de um apartamento é o desperdício de material. Ele onera em cerca de 25% o preço final. É um problema de metodologia construtiva, de treinar o pessoal e desenvolver produtos para uma velocidade de construção maior. Na parte têxtil, verificou-se que é preciso colocar a área plantada de algodão próxima a fiação, para evitar o transporte do algodão bruto.
DINHEIRO ? Por que o governo patina tanto na reforma tributária? Qual o peso do Ministério do Desenvolvimento nessa discussão interna?
TÁPIAS ? A discussão, na verdade, acaba não existindo. Não se pode prescindir da arrecadação. Como se faz a reforma tributária, se ela vem para desonerar a produção da cobrança de impostos cumulativos? Cada empresário, atualmente, precisa ter dois ou três empregados com a preocupação única e exclusiva de calcular e recolher os impostos. A reforma não anda porque você tem que fazer a transição da cumulatividade para impostos cobrados de maneira mais simples. Durante almoço no Palácio do Alvorada, decidimos escrever a disposição transitória da Constituição, para garantir num prazo de até cinco anos, a eliminação da cumulatividade dos impostos.
DINHEIRO ? O senhor concorda que se tivéssemos feito a reforma tributária já estaríamos em um patamar de desenvolvimento mais sólido?
TÁPIAS ? Sem dúvida nenhuma que estaríamos em outro patamar. Estamos pagando caro pelo descalabro das contas públicas no passado. Por isso, essa volúpia de arrecadação.