No relatório divulgado na semana passada sobre as compras para a realização dos Jogos PanAmericanos Rio 2007, o ministro Marcos Vilaça, do Tribunal de Contas da União (TCU), ressaltou sua preocupação em duas áreas específicas: saúde e segurança. Na primeira, a dengue era um dos focos principais. Já na segunda, que abriga as áreas de tecnologia da informação, telecomunicações e inteligência, além dos receios do ministro, denúncias têm aparecido de vários lados. Envolvem desde licitações que teriam sido dirigidas para que determinada empresa vencesse até a suspeita de que a dispensa de licitação num dos pregões seria desnecessária. ?Causa preocupação a notícia de que o Ministério da Justiça contava com um pregoeiro para dar prosseguimento a processos licitatórios?, escreveu o ministro Os erros que podem ser cometidos nesse processo podem levar o País a perder milhões de dólares de escasso dinheiro público?, afirma José Roberto Melo da Silva, presidente da Unicel, uma das empresas desqualificadas na licitação dos sistemas de comunicação. Pode parecer exagero, mas o problema é que as concorrências públicas nessa área envolvem muito mais do que os Jogos do Pan. Adquiridos com recursos do Ministério da Justiça, todo o sistema de comunicação, segurança e inteligência será repassado depois dos jogos para a polícia do Rio de Janeiro. Estima-se que a empresa que colocar o pé ? ou sua tecnologia ? na digitalização das comunicações das forças de segurança pública daquele estado terá grande vantagem frente às concorrentes para explorar um mercado de US$ 500 milhões.

A denúncia que criou mais barulho foi a que envolveu os sistemas de inteligência. Com a licitação dispensada por motivo de segurança nacional, o consórcio Integração Pan, liderado pela Motorola e com a participação de outras 11 empresas como GE, Embratel e ISTF, obteve um contrato de R$ 161 milhões para o fornecimento de tecnologia e equipamentos de segurança. ?Para formatar e formar o preço do sistema de inteligência, as empresas precisariam saber especificamente onde cada atleta está hospedado, quais lugares eles passariam, os lugares onde teriam acesso?, diz Odécio Rodrigues Carneiro, coordenador-geral de Tecnologia da Informação para Segurança Pública dos Jogos Panamericanos. ?Tais detalhes não podem ser revelados publicamente por questão de segurança nacional. Seria como dar o mapa da mina a quem quisesse praticar um atentado?. As empresas que ficaram de fora, evidentemente, discordam. ?Já houve muitas concorrências por sistemas de segurança e inteligência no mundo que foram públicas e os detalhes de segurança eram passados apenas após anunciado o vencedor, em confidencialidade?, afirma o executivo de uma empresa de sistemas de inteligência, que não quer ser identificado. ?O argumento da Secretaria Nacional de Segurança é pífio?.

Outro item questionado foi a licitação dos sistemas de comunicação, usados na segurança durante os jogos e que serão adotados futuramente pela polícia do Rio de Janeiro. ?Essa licitação foi direcionada para que a Teltronics vencesse?, diz Melo da Silva, da Unicel. Ele não é o único. Outra concorrente, a Unicall, entrou com um processo no Tribunal de Contas da União (TCU) contra ?ilegalidades perpetradas pelo Ministério da Justiça? na concorrência. Carneiro defende o governo, dizendo que houve cinco empresas participantes e que a espanhola Teltronic levou a concorrência de R$ 48 milhões por uma pequena diferença de preços. ?Era impossível que o processo fosse dirigido porque os critérios de seleção foram organizados por uma comissão que envolveu Polícia Federal, estadual e a Secretaria Nacional de Segurança?, diz ele. Outra crítica dizia que o sistema escolhido não se comunica com os adotados pela Polícia Federal e polícias de outros estados. ?Estamos saindo de uma babel analógica para uma babel digital porque continuará não havendo comunicação e inteligência entre as polícias?, diz Melo da Silva. A Teltronic defende-se, dizendo que intercomunicação não era uma exigência do edital. ?Nosso sistema é aberto e é simples interligá-lo a outros sistemas abertos?, diz Paulo Ferrão, diretor comercial da Teltronic. ?Essa licitação durou um ano e meio, todas as críticas foram incorporadas, vencemos e vamos entregar tudo, no prazo?.

398 milhões serão gastos com segurança nos jogos Rio 2007