26/06/2015 - 9:52
Na porta do luxuoso hotel Manchester Gran Hyatt, frequentado por homens de negócios de San Diego, na Califórnia, um carro se destacava na fila formada por reluzentes Ferraris, Porsches e Lamborghinis no guichê do vallet. Um simples Fusca, da Volkswagen, modelo 1963, vermelho, era assediado por manobristas e curiosos. O fusquinha, ou “bug”, como se referem a ele os americanos, chamou atenção até do proprietário de um Tesla, o carro elétrico desenvolvido pelo visionário sul-africano Elon Musk, considerado, atualmente, como o veículo oficial dos bilionários.
Não se tratava de um fusca qualquer, é verdade. Produzido pela Zelectric, empresa criada pelo designer americano David Benardo, que largou uma carreira de sucesso no Vale do Silício para se dedicar integralmente ao projeto, o carrinho conta com um motor elétrico capaz de impulsioná-lo a velocidades superiores a 150 km/h. O veículo está se tornando um “must” entre os descolados endinheirados do opulento Estado americano. “Cada carro que fazemos é único”, afirma Benardo. “Ele vai além de um simples meio de transporte e é, antes de tudo, uma compra sentimental.”
Seu preço, de fato, é uma mostra do quanto de sentimento é preciso colocar na decisão de adquirir um Zelectric. Uma versão básica não sai por menos de US$ 68 mil. Mesmo assim, a demanda, apesar do preço elevado, tem sido grande. A maioria dos seus clientes, diz Benardo, é composta de gente bem sucedida e descolada, que deseja ter na garagem um veículo que remete a bons momentos de sua juventude, sem, no entanto, perder contato com a tecnologia e o conforto dos carros modernos. Assim como a Zelectric, outras empresas americanas têm apostado nessa tendência automobilística.
É o caso da Renovo, também da Califórnia, que fabrica uma versão reestilizada do cultuado Shelby Daytona, de 1964, com um motor elétrico que gera 500 cavalos de potência e leva o carro de zero a 100 km/h em 3,4 segundos. O preço: US$ 500 mil. O surgimento dessa leva de montadoras retrô está em linha com uma tendência global no mercado de luxo. A busca incessante das marcas por lucros, a todo custo, em especial nos mercados emergentes, tem afetado a imagem de produtos outrora cultuados e aumentado a procura por itens artesanais, exclusivos ou os chamados “vintage”, que mesclam antiguidade com modernidade.
No ano passado, o CEO da grife italiana Gucci, Patrizio de Marco, afirmou que a ganância dos controladores da empresa provocou na marca o chamado “trading down”. Em outras palavras, estava deixando de ser considerada de luxo, a meio caminho da breguice. “Os consumidores estão trocando o excesso pela excelência e buscando mais discrição e individualidade”, disse Marco. A saída encontrada foi promover uma volta às origens, apostando em produtos artesanais e sob medida. A questão é que, para ser considerado “premium”, um produto deve seguir a trinca de características formada por qualidade, exclusividade e estilo.
Uma Ferrari, por exemplo, tem qualidade e estilo, mas há algum tempo, vem deixando de ser exclusividade de alguns poucos abonados. Em meio a essa mudança de atitude em relação ao que é considerado luxo, estão surgindo empresas que navegam melhor nessa tendência de aumentar a exclusividade. Em São Paulo, o empresário Rodrigo Vilas, que também trocou a carreira de designer para apostar em um projeto “vintage”, criou o Studio Vila, especializado em bicicletas antigas. O negócio segue o mesmo princípio da Zelectric.
Nas suas oficinas, antigas Cecis ou Caloi 10, ícones ciclísticos da década de 1980, se transformam em bikes modernas, com bancos em couro feitos a mão, pintura eletrostática, câmbio interno de três marchas e prontas para encarar as novas ciclovias da metrópole. “Meus clientes buscam um produto sentimental, que remeta às memórias de infância, e também algo que dialoga com a cultura da sustentabilidade e do reuso”, afirma Vilas. “Além disso, eu ofereço um serviço customizado, único.” Uma Ceci básica, com um número maior de peças originais, não sai por menos de R$ 1,7 mil. Os modelos mais caros, com itens importados, chegam a custar mais de R$ 2,6 mil.