20/12/2018 - 17:54
Era uma segunda-feira ordinária e de sol abundante no Rio de Janeiro e Paulo Guedes protagonizava mais um de muitos e triviais almoços com empresários e políticos, desta vez na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro. Foi entäo que Guedes, com enorme sinceridade, expôs um de seus planos futuros: “meter a faca no Sistema S”, conjunto de instituições voltadas ao treinamento profissional, pesquisa e assistência técnica e social. Ao todo, o Sistema S reúne nove instituições (ver quadro abaixo) previstas pela Constituição Federal. O corte proposto por ele pode variar de 30% a 50%. De imediato, a afirmação causou burburinho na plateia. No dia seguinte, as instituições divulgaram notas afirmando que os serviços oferecidos serão prejudicados com a redução dos repasses e ressaltaram que haverá demissão de funcionários e fechamento de unidades. Seria esse um remédio amargo e necessário?
De acordo com a Confederação Nacional das Indústrias (CNI), no Serviço Social da Indústria (SESI), no último ano, 1,18 milhão de matrículas em educação básica foram feitas pelo sistema. Em nota conjunta com o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), o SESI afirmou que a redução no repasse deixaria “mais de 1 milhão de estudantes sem opção de cursos de formação profissional e 18,4 mil funcionários das entidades perderiam o emprego”. O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), que atende 2,3 milhões de alunos, prevê que 162 escolas, de um total de 541, fechariam as portas.
Ligados ao setor de transportes, o Serviço Social do Transporte (SEST) e o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (SENAT) realizaram este anos 8,6 milhões de atendimentos em todo o país e que o corte afetararia diretamente esses serviços. São 148 unidades operacionais que atendem a mais de 2 milhões de caminhoneiros e taxistas e cerca de 200 mil empresas transportadoras.
Repasses Consideradas paraestatais, as instituições são sustentadas com dinheiro arrecadado pelo governo por meio de contribuições que as empresas são obrigadas a pagar sobre o valor de sua folha de pagamento. As alíquotas são variáveis, podendo chegar a 2,5% e o corte proposto por Guedes seria aplicado nesta quantia. Em 2017, as instituições receberam R$ 16,5 bilhões e, este ano, R$ 17,1 bilhões. Cabe observar que elas têm ainda receitas adicionais com contribuições diretas e cobrança fazendo com que movimentem até R$ 30 bilhões por ano.
A despeito de todos os benefícios sociais, o próprio Guedes acredita que este é um remédio amargo, mas necessário. Segundo ele, todos da sociedade devem dar sua parcela de contribuição para que o País alcance o equilíbrio fiscal. Ainda no encontro, ao ouvir a reação dos presentes, emendou: “Vocês acham que a CUT (Central Única dos Trabalhadores) perde sindicatos, e aqui continua tudo igual, com almoço bom?”. Era uma clara referência ao fim da obrigatoriedade da taxa sindical, aprovada na Reforma Trabalhista, e um recado de que todos precisam se sacrificar. “A gente tem que cortar pouco, para não doer muito. Se tivermos interlocutores inteligentes e preparados, a gente corta 30%. Se não tivermos, é 50%”, explicou Guedes.
Na avaliação de Helio Carlos Bonito Junior, economista da Ethimos Investimentos, a declaração do futuro ministro está em linha com a proposta de deixar as empresas mais leves a partir de uma desoneração das folhas de pagamento. É preciso apenas, segundo ele, “analisar a fundo o benefício gerado por estas entidades de forma a não correr o risco de sucatear tudo que já foi estruturado bem como não desprezar as contribuições efetivas geradas pelo Sistema S”.
E estudos estão sendo mapeados pela futura equipe de Guedes justamente para considerar todos os impactos. Economista que vai comandar a secretaria especial da Receita Federal, Marcos Cintra está estruturando uma forma de baratear a folha de salários que não envolva apenas a redução da alíquota do Sistema S, mas também a contribuição patronal ao INSS. Hoje, o custo da folha de salário é onerado em 20% de contribuição patronal ao INSS e mais 6,5% aproximadamente do Sistema S. “O principal objetivo é gerar empregos, fazer com que a folha de salário seja menos onerada”, garante o futuro secretário.
A intenção de reduzir os repasses do governo no Sistema S não é novidade. Há dois anos tramitou no Senado uma proposta para reduzir os repasses em 30%.
O objetivo era aliviar a carga tributária sobre as empresas. A proposta encontrou resistência e não foi adiante. Resta agora saber, se o inédito remédio de Guedes terá efeito.