28/05/2020 - 14:27
Cientistas de vários países pediram maior acesso aos dados utilizados por um amplo estudo publicado no periódico “The Lancet” sobre hidroxicloroquina, que destacou o risco dessa molécula para o tratamento do novo coronavírus.
Publicado em 22 de maio no prestigiado periódico médico, o estudo se baseia em dados de cerca de 96.000 pacientes internados entre dezembro e abril em 671 hospitais em todo mundo e compara a evolução daqueles que receberam esse tratamento e dos que não.
Seus autores concluíram que a hidroxicloroquina não apenas não é benéfica, como aumenta o risco de morte entre os pacientes com COVID-19.
À luz desse estudo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decidiu suspender temporariamente os ensaios clínicos com hidroxicloroquina em vários países.
Mas de onde vem essa montanha de informações? É o que perguntam muitos cientistas, que pedem acesso aos dados brutos.
“Podem dar os nomes dos hospitais canadenses que vocês afirmam que contribuíram para que os dados possam ser verificados de forma independente?”, pediu Todd Lee, especialista em doenças infecciosas da Universidade McGill do Canadá, ontem, pelo Twitter.
Em um blog da Columbia University dedicado à modelagem, o estatístico Andrew Gelman cita supostos limites metodológicos do estudo e afirma “ter enviado um e-mail para pedir os dados”, sem sucesso.
Na França, o dr. Didier Raoult, um grande defensor da hidroxicloroquina, criticou o estudo, enquanto outros médicos e pesquisadores expressaram suas dúvidas, como o cardiologista Florian Zores, que apontou no Twitter a “falta” de alguns dados.
Vários pesquisadores australianos expressaram a mesma opinião, principalmente devido às diferenças entre os dados oficiais do país e os do estudo, segundo o jornal britânico “The Guardian”.
Os dados são da Surgisphere, que se apresenta como uma empresa de análise de dados de saúde sediada nos EUA. Seu presidente, o médico Sapan Desai, é um dos autores do estudo.
Em um comunicado, a Surgisphere defendeu a veracidade de seus dados e afirmou que eles vêm de hospitais que colaboram com sua empresa.
Mas “nossos acordos de uso de dados não nos permitem publicá-los”, acrescenta a empresa, que destaca já ter indicado claramente que o estudo tem “limites”.
Segundo o “Guardian”, Desai reconheceu ter classificado erroneamente 73 mortes na Austrália, quando elas deveriam ter sido contadas na Ásia.
Como muitos de seus colegas, o médico francês Gilbert Deray, do hospital parisiense Pitié-Salpêtrière, considerou no Twitter, nesta quinta-feira, que “isso não muda em nada a ausência de dados sérios sobre a eficácia da hidroxicloroquina” e pediu que se dê continuidade aos “testes clínicos aleatórios”.