Mais do que a guerra na Ucrânia, as divergências sobre o clima serão os grandes fatores de polarização no mundo, alertaram Pascal Lamy e Ángel Gurría, por ocasião de substituição à frente do Fórum de Paris sobre a Paz.

“Existem emergências como o fim do conflito na Ucrânia, a pandemia, a pobreza, a segurança alimentar, mas a maior responsabilidade intergeracional será o clima”, disse Gurría em entrevista à AFP.

Para Lamy, “a verdadeira zona de conflito que avança é o clima e é Norte-Sul”, diz, levantando as discussões sobre a dívida climática e suas possíveis reparações durante a última COP27, no Egito, em novembro de 2022.

Nesta quinta-feira (29), Gurría, que já foi secretário-geral da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) sucedeu Lamy, ex-chefe da Organização Mundial do Comércio (OMC), à frente do Fórum de Paris sobre a Paz.

O evento foi criado em 2018, pelo presidente francês Emmanuel Macron, como forma de repensar a gestão global e o multilateralismo, uma vez que estavam perdendo “em relevância, legitimidade” e “em eficácia”, segundo o ex-dirigente da OMC.

A edição de 2023 do fórum, realizado anualmente, também terá o papel de estabelecer um laço com a “sociedade civil” na cúpula convocada por Macron, em junho, sobre um novo pacto financeiro global, sobretudo com os países do Sul.

Cinco anos depois do primeiro fórum, a invasão russa na Ucrânia confirmou o “diagnóstico inicial”, sendo um duro golpe para o sistema internacional pós Segunda Guerra Mundial, diz Lamy.

No entanto, o francês rejeita a ideia de que no conflito na Ucrânia haveria um “Ocidente contra o resto”, e traça um panorama de um Ocidente que apoia Kiev, um grupo de países que evita se posicionar a favor de um lado e um grupo “microscópico” que apoia a Rússia.

– Contra o isolamento da China –

Neste cenário, China, Índia e Brasil são “países enormes que têm consciência de que devem fazer algo” para achar uma saída, principalmente quando “a ideia de paz” não se projeta na Rússia e os Estados Unidos dizem que “esse não é o momento”, analisa Gurría.

Além de Moscou, Washington transformou Pequim em seu principal rival, mas especialistas alertam contra o eventual isolamento do gigante asiático, sobretudo pelo risco de uma China empurrada para a “autarquia” ser “mais perigosa do que uma China globalizada”, acrescenta o dirigente mexicano.

No âmbito climático, o país mais populoso do mundo também é chamado a ser um ator-chave no fundo de perdas e danos aprovados na última COP27, uma reivindicação feita ao longo três décadas por países pobres e em desenvolvimento para ajudar os mais vulneráveis às mudanças climáticas.

Seu principal argumento era que, ao contrário dos países desenvolvidos, eles pouco contribuíram historicamente para o aquecimento global, mas sofrem mais com suas consequências. Um discurso “simplista”, mas “incontestável” e “muito eficaz” politicamente, segundo Lamy.

O Fórum de Paris será realizado nos dias 10 e 11 de novembro com quatro prioridades em pauta: saúde, tecnologia, espaço e o clima, com foco nos polos e oceanos, além de sua convocatória para projetos.